Logo O POVO+
Da vida a para o palco, Snart MC conta sua história
Comentar
Foto de Marcos Sampaio
clique para exibir bio do colunista

Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM

Marcos Sampaio arte e cultura

Da vida a para o palco, Snart MC conta sua história

Snart MC está se preparando para representar o Ceará na principal batalha de rimas do País. E ele está certo de que pode ganhar
Comentar
FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 11-11-2025: Na foto, o rapper Snartt, de 21 anos, que irá competir como representante nacional no Duelo de MC's Nacional, em Belo Horizonte. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo) (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS FORTALEZA, CEARÁ, BRASIL, 11-11-2025: Na foto, o rapper Snartt, de 21 anos, que irá competir como representante nacional no Duelo de MC's Nacional, em Belo Horizonte. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo)

Cauã Ribeiro tem 21 anos e há 8 se prepara para o maior desafio de sua vida. Na sexta-feira, 21, ele vai para Belo Horizonte para competir com 32 MCs no Duelo Nacional de MCs, que acontece durante o fim de semana no Viaduto Santa Tereza. Nessa batalha, o que levam como arma são rimas improvisadas. Uma palavra mal colocada ou verso fora do ritmo são sinais de ponto perdido. Os temas vão surgindo na hora, de acordo com o que vem na mente de cada competidor, desde o ônibus lotado até o trabalho que, não necessariamente, dignifica o homem.

Cauã conhece bem as duas realidades. Pendendo de um lado para o outro da Cidade, de ônibus ou mototaxi, ele já trabalhou em obra como assistente de pedreiro e pintor, garçom e como entregador de uma lavanderia. Nesta última experiência, a primeira com carteira assinada, ele saiu depois de um tempo, pegou o dinheiro que tinha por direito e se mandou para São Paulo. "Lá é o mercado onde todos os MC's querem estar. Só que é nisso também que muita gente se perde, vai para lá e acaba esquecendo de nós. Acaba que, quando volta, não é abraçado", comenta apontando que, no rap, a qualidade das atitudes se reflete diretamente na qualidade das rimas.

Filho da recepcionista Ana Célia com o estoquista Cristiano Barroso, ele sempre gostou de música e ouve funk desde criança. As primeiras rimas nasceram pela internet, até que, na sétima série, um amigo avisou de uma roda de freestyle (versos de improviso) que estava acontecendo no recreio. Ele foi lá e improvisou também, seguindo o ritmo marcado por uma caixinha de som. “Comecei com uma brincadeira de escola e fui me formando, fui vendo pessoas antes de mim que deram certo”, comemora. De rima em rima, Cauã deu lugar ao Snart MC. O nome artístico veio de um personagem da série "The Flash". "Eu fui na internet pesquisar nomes de vilões do Flash. Comecei a ler e tudo era nome difícil. O nome mais fácil era Snart", relembra rindo, mas orgulhoso por que o nome pegou e é como ele é conhecido no meio das batalhas. "Já está enraizado", reafirma. Com esse "vulgo", ele tornou-se campeão regional por Fortaleza e estadual pelo Ceará, ambos os títulos ainda este ano.

Já reconhecido no meio, Snart participou de muitas batalhas em diferentes bairros de Fortaleza. Às vezes nas praças, às vezes em shoppings, quando ganha, ele volta para casa, onde mora com a mãe e três irmãs, com prêmios em dinheiro, o que ajuda a explicar em casa o que são as tais batalhas. "Essa semana mesmo teve uma valendo R$ 2 mil. Então, hoje em dia você consegue ter um retorno, virou um trabalho também", reflete o MC que teve como primeiro prêmio da carreira uma bicicleta. Ganhar na competição não é uma certeza, mas a qualidade do que ele faz também rende convites de marcas e eventos. E foi assim que ele já abriu shows de Djonga, Veigh e Matuê.

A postura agressiva de Snart no palco é o oposto de Cauã, sujeito de fala veloz, afetuoso e sorriso fácil. Mas ele deixa claro que os dois são um só. "A partir do momento que você é verdadeiro com você mesmo, rimar é só ter a prática. É estudar, pesquisar palavras novas, observar, ter palavra na mente. E isso ajuda tanto na batalha quanto conversando com uma pessoa", explica, dando pistas de onde vem seu repertório. Com segundo grau completo, ele acompanha notícias, gosta de mitologia, não tem religião definida (embora tenha fé) e, além do rap, ouve Belchior e outros compositores que falam "sobre a vida, sobre o momento que a pessoa viveu. Gente que você escuta e começa a se colocar no lugar do artista, a tentar pensar como ele".

Ser verdadeiro com a própria história é outro fator que ajuda Snart e Cauã a andarem adiante. Em casa, ele tem o apoio da família. Trabalhando atualmente como operador de telemarketing, ele também recebe incentivo de colegas e gestores. Quando viu que não tinha dinheiro para voltar de São Paulo, foi um seguidor - CEO de supermercado de Fortaleza - que mandou mensagem pedindo seu pix e enviou R$ 500. Essas e outras pessoas ajudaram a construir um artista, batalhador, dono de uma autoestima invejável. "Eu acho que foi minha mãe", sugere antes de uma risada envergonhada. "Mas eu acho também que foi tudo que eu passei, né, mano? Porque eu só me vejo com autoestima grande no que eu faço. Na minha batalha de rima, eu me vejo como melhor, o mais brabo. Mas fora disso, não. Fora disso, eu me vejo uma pessoa normal".

Ainda assim, ele está bem confiante na batalha que vai travar no próximo final de semana. Serão dois dias de competição e os 32 melhores rimadores do Brasil. E rimar, para ele, é botar para fora um universo de sentimentos e vivências que ficam represados, mas que podem encontrar eco no público quando ditos sobre o palco. "Eu não vou com a rima pronta, eu vou com improviso. Eles botam lá a batida e eu começo. Tem pessoas que vão ver mais por quem você é. A galera já sabe do que eu vou tratar. Sabe que não vai ser uma coisa fútil. Quem é trabalhador, assim como eu, escuta e se identifica. Eu vou rimar sobre a nossa realidade, sobre o atraso do ônibus, sobre a tristeza que é acordar e não ter nada para comer", explica ele, que tem um objetivo bem claro que vai além da vaidade da vitória no Duelo Nacional. "O meu sonho é conseguir dar o melhor para minha família. A batalha de rima construiu minha imagem, fez eu ser visto pelo que eu faço. Meu sonho é chegar além disso. Quero chegar num ponto em que eu consiga sentir que eu alcancei o que eu tinha para alcançar. No momento, sinto que ainda estou começando. Então, se no começo está sendo de coisas boas, acredito que quando eu realizar mesmo meu sonho vai ser uma coisa, assim, excelente", aspira.

Foto do Marcos Sampaio

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?