
O que O POVO pensa sobre os principais assuntos da agenda pública
O que O POVO pensa sobre os principais assuntos da agenda pública
Após oito anos do assassinato da travesti Dandara dos Santos, a Justiça sentenciou que houve omissão do policiamento do Estado do Ceará e condenou-o, em primeira instância, a indenizar em R$ 50 mil a família de Dandara. Vítima de transfobia e assassinada em 15 de fevereiro de 2017 no bairro Bom Jardim, em Fortaleza, o caso de Dandara estremeceu o Brasil e o mundo e escancarou, mais uma vez, os horrores que a comunidade LGBTQIA enfrenta no cotidiano.
Coincidência que a decisão "simbólica" — como definida pela advogada da família de Dandara, Christiane Leitão — tenha ocorrido na semana do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA , celebrado neste sábado, 28 de junho.
Por outro lado, o direito de viver não se limita ao de estar vivo, mas principalmente ao entendimento básico de existir por completo, gozando da tranquilidade para estudar, amar, divertir-se, passear, expressar-se e envelhecer publicamente. O fato da comunidade LGBTQIA seguir lutando por direitos tão simplórios — para quem sempre pode exercê-los plenamente — é mais um alerta para a crueldade à qual ela ainda é submetida.
Recentemente, os brasileiros se mobilizaram para assistir ao filme biografia do icônico Ney Matogrosso, Homem com H (Esmir Filho), a partir do qual tiveram contato com a materialização da bravura cotidiana de existir: na trajetória de Ney Matogrosso, nem a ditadura militar era tão amedrontadora quanto a impossibilidade de ser. E essa é a história de toda a comunidade, ontem e hoje.
Há, com certeza, avanços. No entanto, são passos infantes: foi somente há 12 anos, em 2013, que o casamento homoafetivo foi legalizado. Em 2015, puderam adotar. Apenas há sete anos, em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu o direito das pessoas trans de mudar nome e gênero nos documentos sem necessidade de comprovar cirurgia de redefinição sexual ou tratamentos para mudança de gênero.
O problema dos direitos recentes é que eles são especialmente vulneráveis. Dependem do tempo de consolidação e implementação de políticas públicas efetivas. Mais ainda, dependem da transformação de uma sociedade adepta ao conservadorismo, acostumada à manutenção de lógicas antiquadas.
Não à toa, ainda há quem pregue que ser LGBTQIA é uma opção, ou, pior, uma doença. O Brasil, pelo Conselho Federal de Medicina, antecipou-se cinco anos à Organização Mundial da Saúde (OMS) ao retirar, em 1985, a homossexualidade do rol de patologias. Este é apenas um exemplo de como a sociedade tarda a acompanhar conquistas jurídicas.
O desfecho do caso Dandara simboliza a urgência de pessoas dessa comunidade enxergarem-se fora de contextos de violência. Neste ano, o tema da Parada da Diversidade é justamente o envelhecimento: no País que mais mata, projetar o futuro segue difícil. Para além de estar vivo, que a luta siga pelo direito de viver.
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