Coronavírus mata mais que violência no pior ano da história
Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
O Ceará teve, até ontem, 5.728 mortes pelo novo coronavírus. As primeiras foram em 24 de março e tornadas públicas dois dias depois. Hoje faz três meses. Neste período, mortes por Covid-19 superam os homicídios em qualquer ano da história do Ceará, na soma dos 12 meses. Isso mesmo que você está lendo. Em apenas três meses, a pandemia matou mais gente no Ceará do que a violência em qualquer ano da nossa história. Considerando os homicídios dos 12 meses, comparados com três meses do novo coronavírus.
Por que essa comparação? Porque, no começo da pandemia, o discurso era de que não era nada demais. Morreria pouca gente. E que a violência mata muito mais. Nada disso é verdade.
O ano com maior número de homicídios na história do Ceará foi 2017. Somando homicídios, roubos seguidos de morte e lesões corporais seguidas de morte, morreram 5.133 pessoas assassinadas naquele ano. Repito, nos 12 meses. Em um trimestre, o coronavírus matou 595 pessoas a mais: 5.728 no total, segundo o IntegraSUS. O número de homicídios é da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social.
Homicídios também em alta
O que é mais trágico: não há substituição de umas mortes por outras. As pessoas seguem morrendo de outras causas. A violência, por exemplo, não caiu na quarentena. Pelo contrário, aumentou. De janeiro a maio deste ano, o Ceará teve 1.887 homicídios. Isso é mais que a quantidade de homicídio no mesmo período de 2017 que, repito, foi o ano mais violento da história do Ceará. De janeiro a maio daquele ano, foram 1.825 pessoas assassinadas. O Estado vive o pior dos mundos: pode caminhar para recorde de homicídios no meio de uma pandemia.
Os argumentos que restam
Os argumentos de que seriam poucas mortes desmoronaram. Osmar Terra, ex-ministro da Cidadania, chegou a dizer que seriam menos de mil. O empresário Junior Durski, do ramo de hambúrgueres falava em cinco mil a sete mil. O País chegou ontem a 52.645.
O discurso da gripezinha foi substituído por outros. Osmar Terra agora diz que a quarentena não serviu de nada. O jogo argumentativo é ótimo: ele disse que morreria pouca gente. Se acertasse, diria que foi muita coisa por nada. Como são muitas mortes, diz que a estratégia não deu certo. Morreria o mesmo número de pessoas sem medidas de isolamento social? Osmar diz que sim, mas é impossível saber com certeza. A única forma de averiguar quantos morreriam sem isolamento seria não fazer nada. Deixar cada um tomar "seus cuidados individuais", como apregoa o doutor Terra. Pagar para ver quantas mortes haveria. Quem assumiria esse fardo? Você assumiria? Deixaria cada um por si para ver quantos pessoas morreriam sem seguir recomendações de nove entre dez médicos?
Outro discurso é de que os números são mentirosos. A pessoa morreria do coração, de tiro, de susto e colocariam no atestado: Covid-19. Bem, no Ceará é difícil que isso ocorra. Pois está morrendo mais gente assassinada que em qualquer outro ano.
Nos óbitos por causas naturais, também não parece haver migração. Conforme o Portal da Transparência - Registro Civil, no período de 16 de março a 9 de junho, o Ceará teve 15.261 mortes. No mesmo período do ano passado, foram 10.062. Em 2020, são 5.199 mortes a mais. A contabilidade inclui todos os óbitos excluídas mortes violentas. Pega o período da quarentena e vai até 9 de junho porque os dados têm defasagem de até 14 dias. Os números mostram que, independentemente da causa, há mais mortos que no ano passado: 5 mil a mais em menos de três meses. É mais que a população inteira de Guaramiranga. O que acontece nesses três meses para morrerem só no Ceará cinco mil pessoas a mais que em 2019? Sem incluir homicídios. Será a pandemia de que tanto falam?
Denúncia de fraudar atestado de óbito é muito séria. Coloca sob suspeita profissionais de saúde. Você acha isso? Pode achar. Mas, para dizer isso, só faça se tiver prova. Se não, respeite as pessoas, não seja leviano e fique com seu achismo para você.
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