Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
De forma constrangedora têm sido evidenciadas as tentativas do governo de interferir na CPI. Todo mundo sabe disso, mas não precisa escancarar desse jeito
Foto: EVARISTO SA / AFP
Mandetta: munição para a CPI
Claro que todo governo opera pesado quando ocorrem CPIs e procedimentos do tipo que podem causar embaraços. No governo Dilma Rousseff (PT), por exemplo, o balcão de negócios correu solto com cargos e emendas. O governo Dilma não era propriamente competente nem na gestão nem na política, mas não era tão atrapalhado quanto o de Jair Bolsonaro a ponto de escancarar a tal ponto suas interferências.
Ontem, na CPI da Covid, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) perguntou ao ex-ministro Luiz Henrique Mandetta a respeito da orientação inicial de não procurar os hospitais nos primeiros sintomas e sobre a recomendação de "chá, canja de galinha e reza" contra a Covid-19. Mandetta relatou, então, que recebeu a mesma mensagem na véspera do ministro Fábio Faria, das Comunicações, encaminhada por engano. Fábio, conforme o ex-ministro, apagou a mensagem, mas não antes de Mandetta ter lido.
Que papelão, que constrangimento. Não surpreende que áulicos produzam subsídios para aliados no Congresso. Isso é a história da política. Mas, dessa forma estabanada, deixando tão evidentes as digitais, é a primeira vez que vejo.
Não é a primeira vez. E houve coisa pior. Requerimentos apresentados à CPI por senadores foram produzidos no Palácio do Planalto, conforme revelou o jornal O Globo. Nos metadados dos arquivos eletrônicos enviados à comissão, aparece a assinatura da assessora especial da Secretaria de Assuntos Parlamentares da Secretaria de Governo, Thaís Amaral Moura. Metadados são a identificação digital gerada automaticamente nos arquivos, com informações sobre a origem. A identificação de Thaís Moura aparece em 11 requerimentos, cinco deles protocolados por Ciro Nogueira, que tem feito o Planalto trabalhar.
Qual problema de o governo fazer isso? Simples: é a interferência de um poder em outro. Pior: é a interferência em uma investigação da qual o governo é alvo.
Vale lembrar: quando Dilma usou o peso do Planalto para tentar evitar o impeachment não deu nada certo.
CPI obra milagres
O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello não irá depor hoje na CPI da Covid. Ele argumenta que teve contato com dois assessores diagnosticados com Covid-19. Tem total razão. Não pode mesmo ir. É uma das atitudes mais responsáveis que Pazuello tomou para conter a Covid-19. Pena não ter sido o padrão dele no ministério — e de resto de todo o governo.
Basta lembrar que, em 7 de julho passado, o presidente recebeu equipes de televisão para, perto dos repórteres, anunciar que havia sido diagnosticado com Covid-19. Falou para os microfones que os profissionais portavam. Ao final, deu alguns passos para trás e tirou a máscara. Pena que não tinha CPI para ele evitar.
Pazuello deixará de ir por menos que isso. Não há informação de que tenha contraído a doença. É pelo contato com assessores. Por precaução. Está certo. Que bom que aprendeu. pena que tão tarde.
Mas passa rápido
Mais impressionante ainda foi a transformação operada no senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Na semana passada, o Zero Um nem parecia filho de quem é. Mostrou-se preocupado com medidas de contenção da Covid-19 e, vejam só, cobrou medidas de isolamento social. Disse que atividade presencial coloca vidas em risco e não deveria ocorrer em momento de pandemia. “Está sendo irresponsável porque está assumindo a possibilidade de, durante os trabalhos desta CPI acontecerem mortes de senadores, mortes de assessores, morte de funcionários desta casa em função da covid porque em algum momento as audiências e as sessões terão que ser presenciais”, disse o senador.
Pena que, quatro dias depois, a preocupação com as aglomerações já havia desaparecido. “Ruas lotadas em todo o Brasil”, postou Flávio no Facebook sobre as manifestações de apoio ao pai dele. Parece que o senador acredita que aglomeração só é prejudicial se ocorre durante investigação incômoda para ele e a família presidencial.
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