Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
Fortaleza tem pressa e gosto por destruir. É fascinada por novidade. Não gosta da própria imagem. Quer ser outra coisa. Nessa ansiedade de renovação, vai deixando de ser o que era antes de se tornar algo novo. A ruína de uma cidade em construção. O edifício São Pedro é, ou era, talvez o principal marco arquitetônico da orla. Resta esperar o superprédio a surgir ali, expressão arquitetônica de exorbitância e mau gosto.
O São Pedro começou a ser derrubado porque deixaram se estragar tanto até cair de podre e negligenciado. A paisagem de Fortaleza é transformada com velocidade até se tornar irreconhecível a quem passou alguns poucos anos fora. A reformada Beira Mar ficou bonita, mas é ousada a cidade turística que se permite, no corredor de maior visibilidade, ficar irreconhecível ao visitante que veio a não mais de cinco anos. Até quem vive em Fortaleza se sente num lugar diferente.
O São Pedro caiu de desprezo. Se a cidade não se importa, não está disposta a fazer esforços e sacrifícios para mantê-lo de pé, se assiste inerte à decomposição, por que não colocá-lo abaixo? Se a sociedade não liga, não faz sentido. Afinal, o que tem valor, de fato, para o fortalezense?
Tudo parece que era ainda construção e já é ruína
Um dos símbolos de Fortaleza é o Farol Velho do Mucuripe, construído na década de 1840. Você sabe as condições em que está? A antiga Escola Jesus Maria José, no Centro, está aos destroços. A mesma coisa com a Casa de Câmara e Cadeia da Villa de Arronches, ao lado da Igreja da Parangaba.
A Ponte dos Ingleses foi destruída e, depois de briga política, passa por reforma após anos largada. A Praça Portugal escapou por pouco de virar cruzamento. Os mercados gêmeos de ferro, dos Pinhões e da Aerolândia, estão fechados e à espera de reparos. Assim como segue há anos fechado e sem perspectiva o Museu do Ceará, parte mais destacada do precioso conjunto arquitetônico da Praça dos Leões. A Casa do Português é candidata a sofrer "efeito Orloff" do São Pedro: "Eu sou você amanhã". Se a cidade não conhece a própria história, se não dá valor, se as pessoas preferem viver num lugar que mal se consegue reconhecer, porque é o tempo todo transformado, então a ideia de preservar a memória perde sentido. É começar a construir um edifício pelo topo, na esperança de que fique em pé. A memória, inclusive arquitetônica, deve ser preservada porque existe um alicerce, que é a valorização, o reconhecimento e a identidade com a história ali materializada.
Se não há nada disso, o prédio ir abaixo é o menor problema.
O que escapa
Nem todas as notícias são ruins. Fortaleza tem espaços relevantes de memória que se conseguiu resgatar. O Passeio Público, a Cidade da Criança e o Teatro São José, por exemplo. O Estoril também, embora não siga a vocação e esteja entregue a atividades burocráticas. Pelo menos é uma destinação, embora não a que merecesse. A Estação Ferroviária da Parangaba estava na rota de destruição e foi preservada por pouco, rebaixada para o metrô passar por cima.
Velocidade
Parece-me que não tinha jeito para o São Pedro. Mas a situação não é nova. É debatida há coisa de 20 anos. Obviamente houve inércia de proprietários e faltou ação do poder público. A demolição interessa aos donos. Houve alguns projetos nesse sentido. Por não ser uma situação de agora, entendo não se justificar demolir tão desembestadamente, tão sem debate. Parece uma corrida para criar o fato consumado. Como há interesses graúdos envolvidos, menos açodamento evitaria desconfianças no processo.
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