Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
Donald Trump não apenas foi eleito como obteve um resultado avassalador, muito além do que as pesquisas sugeriam. Terá o controle do Senado e provavelmente, da Câmara. Provavelmente vencerá no total de votos no País, algo que ele não conseguiu ao ser eleito.
O presidente Lula (PT) cumprimentou o eleito, depois de inconveniente manifestação contra ele, que não ajudou Kamala Harris e colocou um asterisco no nome do Brasil, pela forma como o futuro ocupante da Casa Branca faz política.
Já o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se empolgou, talvez além da conta. Publicou um delírio piegas no Xuiter. Na eleição de Trump viu o presságio de um retorno dele próprio ao poder. Na coluna de ontem, comentei as conexões que já ouve, de fato, mas o misticismo político dos conservadores brasileiros está indo um pouco longe.
Os bacorejos de Bolsonaro
Bolsonaro viu na eleição de Trump uma “vitória épica” obtida “contra tudo e contra todos”. Esse discurso coitadista e vitimista do “contra tudo e contra todos” é usual da política ao futebol. Costuma ser usado por gente graúda. Trump é um magnata, apoiado pelo homem mais rico do planeta — Elon Musk, a quem o presidente eleito chamou de gênio. Trump tem maioria dos membros da Suprema Corte. E muito apoio de poderosos. Contra tudo e contra todos?
Bolsonaro ainda saudou a eleição como triunfo contra “os desígnios arrogantes de alguns poucos”, que, segundo ele, “desprezam nossos valores, nossas crenças e nossas tradições”. Nossas quem? Bolsonaro já se julga cidadão dos Estados Unidos? E uma hora era “contra tudo e contra todos”, em outra já era contra “alguns poucos”. O texto não mantém num parágrafo o que disse no anterior.
Mas, a melhor parte é quando Bolsonaro extrai da eleição dos Estados Unidos o prenúncio do que deseja para si próprio. Podia ter sido sutil, mas ele se empolgou a valer. Primeiro, fala que a vitória eleitoral impulsionará a “direita e dos conservadores em muitos outros países”. Então, deseja: “Que a vitória de Trump inspire o Brasil a seguir o mesmo caminho”. E reforça: “Que nossa nação retome o seu destino de grandeza”.
No fim, ele já não fala em Brasil ou nação, e deixa claro que espera ele mesmo se beneficiar. “Talvez em breve Deus também nos conceda a chance de concluir nossa missão com dignidade e nos devolva tudo o que foi tirado de nós. Talvez tenhamos uma nova oportunidade de restaurar o Brasil como uma terra de liberdade (...)".
Os recados do norte
Escrevi ontem das convergências entre a eleição e a derrota de Trump e Bolsonaro, mas isso nem de longe significa que uma coisa seja decorrência da outra. Obviamente, a eleição de Trump é boa para Bolsonaro. É um aliado poderosíssimo.
Mas, a principal sinalização para o Brasil é demonstrar que um presidente que saiu desgastado pela gestão incompetente e malfazeja da pandemia, que foi derrotado na tentativa de reeleição, é capaz de retornar ao poder pouco tempo depois e com ainda mais força.
Quanta diferença
Impossível não notar a diferença da postura, ao telefonar para o vitorioso, e do discurso de Kamala Harris em relação ao que haveria se fosse Trump o derrotado. Ela não fez nada demais, apenas o protocolar. Mas, ele já apregoava mentiras e alimentava teorias conspiratórias para o caso de perder. Dizia que reconheceria a derrota, se a eleição fosse justa. Mas, só considera haver justiça quando vence. Bolsonaro é mostra disso. Basta ver Fortaleza. André Fernandes (PL) teve comportamento muito correto na derrota, mas estava cheio de apoiadores com postura que não condiz com a que o candidato sustentou, espalhando mentiras sobre troca de urnas. O ridículo se dá de forma que o PT perdeu em quase todas as capitais e, na que ganhou — por muito pouco —, opositores não aceitam e ficam com conversa.
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