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O que este julgamento tem de diferente de todos os outros
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

O que este julgamento tem de diferente de todos os outros

Mas talvez nada seja tão sem precedentes quanto o fato de que a disputa não se restringe, dessa vez, ao Judiciário. Pela primeira vez, há ações externas e ostensivas contra o tribunal. O STF é juiz e alvo
Tipo Opinião
ESTÁTUA da Justiça e o Congresso Nacional ao fundo, na Praça dos Três Poderes (Foto: Dorivan Marinho/SCO/STF)
Foto: Dorivan Marinho/SCO/STF ESTÁTUA da Justiça e o Congresso Nacional ao fundo, na Praça dos Três Poderes

A política brasileira, desde a década passada, foi redefinida a partir do Poder Judiciário. O julgamento do mensalão, as condenações da Lava Jato e a prisão de Lula e agora o de Jair Bolsonaro (PL) e outros réus por tentativa de golpe são marcos para entender o País. Os três primeiros demarcaram a crise do PT — a Lava Jato e os desdobramentos levaram junto o PSDB, que sofreu ainda mais, a ponto de quase deixar de existir. A decisão que o Supremo Tribunal Federal (STF) toma a partir desta terça-feira definirá o futuro do bolsonarismo, mas também o de toda a direita. Se seguirá abraçada ao ex-presidente e aos rumos que ele indicar ou se haverá dissidências. Também será determinante para o centrão e o caminho que escolherá. E para a própria esquerda, que se organiza a partir dos movimentos de oposição, que têm sido capazes de paralisar o governo em vários momentos.

Este processo tem muitas particularidades. Nunca houve possibilidade de responsabilização neste nível por tentativa de ruptura institucional no Brasil. Não por falta de golpes ou tentativas. A forma como atinge os altos escalões das Forças Armadas é outro acontecimento. Só nesta primeira fase, são três generais e um almirante como acusados.

Mas talvez nada seja tão sem precedentes quanto o fato de que a disputa não se restringe, dessa vez, ao Judiciário. Pela primeira vez, há ações externas e ostensivas contra o tribunal. O STF é juiz e alvo.

Uma das trincheiras é o Legislativo. Tramita um projeto de anistia de uma condenação que nem houve ainda, mas também propostas de até mudar a Constituição para retirar poderes do Supremo, além de pedidos de impeachment de ministros da Corte. É o tipo de coação inaceitável no curso de um processo judicial, ilegal e indecoroso. Mas não é só isso.

Há o assédio internacional. As relações políticas e ideológicas da família Bolsonaro com a extrema direita internacional fazem com que, de forma sem precedentes, um Estado estrangeiro tenha desavergonhadamente passado a usar a intimidação econômica como forma de influenciar um julgamento no Brasil, de modo a favorecer um réu por conspirar contra a democracia. Além disso, sanções são aplicadas contra autoridades brasileiras e outras tantas são ameaçadas, na tentativa de coagir não só um, como dois poderes. Nada disso é opinião, são fatos escancarados, feitos e publicados. Tudo isso é criminoso e lesa-pátria.

O caso do mensalão foi sem precedentes na dimensão e nos referenciais que estabeleceu no Judiciário e na política. A Lava Jato foi única na responsabilização de empreiteiras, além das engrenagens da corrupção estatal expostas e confessas. A condenação de Lula foi pioneira ao enviar para a prisão um ex-presidente por crime comum. Em todos os casos, em meio a críticas e questionamentos políticos, os casos se resolviam no tribunal. Estavam lá Ministério Público e advogados diante de magistrados. Agora é diferente.

As pressões a que o STF está submetido são um acontecimento novo na Justiça, na política e na diplomacia no Brasil. O processo não se encerra na sentença e nos recursos. Isso é ruim e perigoso.

Para além da corrupção

De oito presidentes da República pós-redemocratização, quatro foram presos. Dois, aliás, estão presos agora: Fernando Collor e Jair Bolsonaro. Michel Temer (MDB) ficou quatro dias preso. O outro foi Lula. O fato de metade dos ex-presidentes terem sido presos em 40 anos mostra o quanto a política brasileira segue instável.

Apoiadores de Bolsonaro gostam de repetir que ele não foi preso por corrupção. Curiosa a escala de valores. Como se ação golpista fosse menos grave. Como se atentar contra a democracia não fosse uma violência contra os direitos de todo. Como se a apropriação do poder, se bem sucedida, não abrisse as portas para todo tipo de favorecimento, com cargos, contratos e ações de governo.

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