Suspeita contra Polícia Federal favorece corruptos
Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
Suspeitas fundamentadas de corrupção devem ser investigadas sejam de quem for. O que for comprovado deve ser exemplarmente punido ocorra onde for. Desviar recursos públicos é criminoso, fazer isso se aproveitando de uma pandemia com dezenas de milhares de mortes no País é abjeto.
Raras instituições de segurança pública tem a reputação da Polícia Federal. Isso não quer dizer que não caibam questionamentos. Sempre houve, com mais ou menos razão. Mas, não me recordo de críticas tão duras a operações da PF quanto as que têm sido feitas nesta semana. Os alvos costumam se intimidar, mas eles estão, pelo contrário, apontando o dedo.
Lupa sobre o gasto público precisa sempre haver. É interesse da população. Períodos excepcionais, como é uma pandemia, com decretos de calamidade, criam ambiente favorável para o tipo de crápula que vê oportunidade de se favorecer. Licitações são dispensadas, facilidades são oferecidas. Então, a vigilância precisa ser redobrada, sim.
Ocorre que a Polícia Federal também está sob lupa. O controle da atividade policial é uma garantia democrática no mundo todo, mas a situação do Brasil é diferente. A lupa foi colocada por uma conjuntura política. Caiu um diretor-geral cuja exoneração foi publicada como pedido dele. Ele não pediu. Caiu um ministro dizendo que o presidente planejava interferência política. Inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) investiga o próprio presidente. A PF ter instrumentos de controle é ruim. Que se torne alvo de suspeitas é uma lástima que favorece quem eventualmente tenha cometido crime.
A PF foi exposta de tal forma - e, se houve motivo ou não, espera-se que o inquérito no Supremo esclareça - que é óbvio que todos os alvos têm resposta pronta. Com razão ou não, todo mundo que for alvo da PF usará a carta da perseguição política.
"Covidão" começa por adversários emblemáticos de Bolsonaro
Ninguém fica isento de investigação por ser opositor do presidente Jair Bolsonaro. Mas, nesse contexto, deixa pulgas atrás da orelha quando a operação que a deputada Carla Zambelli batizou de "Covidão" começa por adversários emblemáticos do presidente: o prefeito Roberto Cláudio, aliado de Ciro Gomes (PDT), e o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).
São investigações do nada? Não, não são. Há coisas estranhas. Relações da empresa com a mulher de Witzel no Rio. Em Fortaleza, tanto tinha problema que o contrato foi rescindido e o dinheiro começou a ser devolvido - espera-se que volte todo. Fica a evidência de que foi contratada empresa sem condição de prestar o serviço. Embora seja o caso de indagar se vale uma operação sobre contratos rescindidos e dinheiro já voltando.
O fato é que, diante tudo que tem sido dito sobre as mudanças da PF, duas operações na mesma semana contra adversários de Bolsonaro justificam dúvidas. Se fosse a Polícia do Rio agir contra a família do presidente, ou a Polícia do Ceará investigar a base de Bolsonaro no Estado, os alvos achariam a mesma coisa. Um fato: a base bolsonarista comemora politicamente as operações.
Para além da Polícia Federal
Um aspecto há de se salientar: a Polícia Federal e o Governo Federal não realizam as operações sozinhos. Entrou Ministério Público. Teve aval do Judiciário. No caso de Witzel, envolveu Superior Tribunal de Justiça (STJ). Então, a alegação de manipulação da PF vai até determinado ponto.
Claro, existe uma iniciativa. Pode ser dela, pode ser do MPF. Pode ser da Controladoria Geral da União (CGU), também Governo Federal, como ocorreu na Dispneia, em Fortaleza. Porém, se houve manobra, Judiciário e MPF se deixaram manobrar também.
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