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Fausto vendeu sua alma ao bolsonarismo: uma tragédia brasileira
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Professor da Universidade Regional do Cariri (Urca) e advogado. Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia

Fausto vendeu sua alma ao bolsonarismo: uma tragédia brasileira

Em crise existencial profunda, tédio mortal e orgulho desmedido, vai até a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e faz um pacto com Mefistófeles, o diabo de Goethe, "o espírito que sempre nega". Que negou a pandemia, o distanciamento social, a vacina, que tentando um golpe de estado negou a própria democracia
Tipo Opinião
Mefistófeles é o anfitrião dos eventos do Auerbachs Keller relacionados ao 'Fausto' de Goethe (Foto: Ralf Seegers/ DW)
Foto: Ralf Seegers/ DW Mefistófeles é o anfitrião dos eventos do Auerbachs Keller relacionados ao 'Fausto' de Goethe

Fausto, personagem de Goethe, é um homem sábio, "estudei filosofia, direito, medicina e, infelizmente, também teologia", aos 15 anos até venceu um prêmio literário em um concurso de redação sobre a vida e obra de Luís de Camões, e deixou a pequena Sobral para conhecer Lisboa às expensas do governo português. Um prodígio!

Fausto é não apenas um homem erudito, doutor em várias ciências, visiting scholar na Harvard Law School, é também o servo preferido de Deus, homem em quem se deposita a fé na humanidade. Confiante em sua tenacidade, Deus aceita o desafio, e permite que Fausto seja tentado pelo Diabo. "Enquanto ele viver na Terra, / Não te proíbo que o tentes. / O homem erra enquanto busca". E como erra, esse homem que busca.

Mas Fausto é também um homem decepcionado. Cedo percebe que o saber acadêmico não é o bastante. Cedo compreende que tem o melhor projeto para o país, um projeto nacional de desenvolvimento com começo, meio e fim, mas que a mediocridade humana e essa polarização odienta e irracional, não o permitem realizar. Até os artistas e intelectuais lhe são inimigos, oportunistas, hipócritas, todos fascistas. De direita e de esquerda, todos fascistas. Fausto amargura a profunda solidão de seu brilhantismo e de seu amor não correspondido por Helena de Tróia e pelo povo brasileiro.

É por isso que Fausto, em crise existencial profunda, tédio mortal e orgulho desmedido, vai até a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e faz um pacto com Mefistófeles, o diabo de Goethe, "o espírito que sempre nega". Que negou a pandemia, o distanciamento social, a vacina, que tentando um golpe de estado negou a própria democracia.

Mefistófeles, Silvana, Alcides, André, Carmelo e Wagner prometem tirar Fausto da inércia. O acordo com o demônio é coisa simples: se Mefistófeles der a Fausto uma experiência de transcendência na Terra, um momento de plena realização e fim de toda busca, tão feliz que ele deseje permanecer nele para sempre, a derrota eleitoral do PT no Ceará; então, Fausto, feliz, entregará sua alma à Silvana, Alcides, André, Carmelo, Wagner, e ao bolsonarismo mais vulgar.

O final, todos conhecemos: Fausto está cego. Não enxerga a realidade do pântano à sua volta. Tornou-se incapaz de distinguir o real da utopia. Fausto, plenamente realizado na mentira que vive, profere, então, as palavras de selam seu pacto com Mefistófeles: "Para este instante, eu diria: Fica, és tão belo!", "Alcides tem todos os dotes, como possível candidato ao Senado. (...) Alcides salta longe pelas suas qualidades e por ser uma pessoa nova na política, apesar dos seus 57 anos. Alcides é homem de fé, homem de testemunho".

E depois dessa, ainda há quem diga que a vida não imita a arte.

 

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