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Tempo, este compositor de destinos
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Professor da Universidade Regional do Cariri (Urca) e advogado. Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia

Tempo, este compositor de destinos

Tenho fascínio, deslumbramento, curiosidade pela Teoria da Relatividade; e como seria bom saber mais, saber melhor, e escrever sobre ela. Mas não consigo. Aqui é só mais uma crônica cansativa sobre a mediocridade da política cearense das últimas semanas
Tipo Opinião
Reprodução das fotos do eclipse total do Sol que comprovou a Teoria Geral da Relatividade, em Sobral no ano de 1919 (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS Reprodução das fotos do eclipse total do Sol que comprovou a Teoria Geral da Relatividade, em Sobral no ano de 1919

O tempo é relativo. Ele está interligado com o espaço e é diferente, dependendo do referencial de velocidade do observador. A passagem do tempo tem um contexto, só é possível de medir dentro de um sistema de referências que inclui, claro, o observador.

Assim, se o observador está em movimento, em movimento acelerado, se viaja cada vez mais próximo à velocidade da luz, o tempo, para ele, passará mais devagar em relação a um observador que não viajou, não estava em movimento, que ficou em repouso. Deixem-me recorrer a um exemplo, na tentativa de ser mais didático.

Imaginem que estamos todos em um mesmo espaço que vou chamar, aqui neste artigo, de campo da racionalidade democrática. Aqui, temos todos um sistema de referências comum: a dignidade da pessoa humana, a ética da igualdade na diversidade, da liberdade com responsabilidade, do compromisso da comunidade com o indivíduo e do indivíduo com a comunidade, um processo decisório fundado na discussão e choque de argumentos racionais, verídicos e de boa fé.

De repente, alguém sai deste campo e ocupa outro espaço. Dá um passo, atravessa a plataforma, e embarca num trem cuja velocidade é alimentada pela distopia, pelo exercício arbitrário das próprias razões, pelo preconceito, pela opressão misógina e racista, pelo culto à morte, à tortura, pela falta de empatia com a dor alheia, pela negação da ciência, pelo desprezo às regras elementares da democracia, e pelo oportunismo carreirista mais vil.

Para nós, que do campo da racionalidade democrática observamos aquele outro que embarcou no trem, o tempo passou acelerado. O movimento do viajante foi brusco, e as coisas aconteceram rápido demais. Já para o viajante, não. Para ele o movimento foi natural, ele nos olha pela janela do trem e nos vê envelhecidos, não tem mais irmandade nenhuma conosco, está em outra dimensão, inserido num contexto com outros referenciais.

É possível ao viajante abandonar o trem? Sim. Não sem consequências, é claro, mas sim. É preciso apenas saber se nosso viajante já não cruzou o horizonte de eventos, o ponto de não retorno, aquele limite tal onde a curvatura do espaço-tempo é tão extrema, que todos as trajetórias e eventos futuros conduzem ao centro de um buraco do qual nenhuma informação ou matéria pode escapar. Nem mesmo a luz.

Tenho fascínio, deslumbramento, curiosidade pela Teoria da Relatividade; e como seria bom saber mais, saber melhor, e escrever sobre ela. Mas não consigo. Aqui é só mais uma crônica cansativa sobre a mediocridade da política cearense das últimas semanas.

 

Foto do Fernando Castelo Branco

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