Professor da Universidade Regional do Cariri (Urca) e advogado. Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia
Professor da Universidade Regional do Cariri (Urca) e advogado. Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia
A operação policial no Rio de Janeiro, que no dia 28/10 deixou mais de 120 mortos, reacende um debate urgente sobre o sentido e os limites do uso da força pelo Estado. É compreensível, e justo, que a sociedade clame por segurança. Ninguém deve se resignar à tirania das facções que controlam territórios, impõem toques de recolher, extorquem comerciantes, expulsam moradores de suas casas, determinam quem pode e quem não pode usar o posto de saúde, a escola e a areninha do bairro.
Por sua infiltração no poder político, pela corrupção de agentes públicos, pela lavagem de dinheiro que promovem através da participação em licitações e processos eleitorais, e sobretudo, por transformar os mais pobres em reféns; as facções e o crime organizado são uma ameaça grave ao regime democrático e a implementação de políticas públicas de inclusão e redução de desigualdades.
Mas o que se viu na terça feira passada no Rio de Janeiro não foi uma ação de política de segurança pública, foi um espetáculo de guerra. Tanques, helicópteros, munições de grosso calibre e corpos estendidos nas vielas não produzem justiça, apenas multiplicam o luto. As facções criminosas não se desarticulam com operações pontuais, por mais impactantes que sejam.
Em quantas semanas, o Comando Vermelho substituirá as lideranças abatidas? Quanto tempo levará para que o arsenal apreendido seja recomposto? Nada na logística do crime, nem no fluxo de seus capitais foi afetado. A engrenagem do tráfico, sustentada por dinheiro, poder e desigualdade, segue intacta.
Não é difícil compreender o apelo dessas ações para a opinião pública: elas produzem a sensação de que o Estado finalmente reagiu, de que "algo está sendo feito". Mas essa é uma ilusão cuidadosamente construída. Diante da completa ineficácia de seus resultados no enfrentamento real da criminalidade, não se pode chamar o que ocorreu de política de segurança pública.
Trata-se, antes, de uma ação de natureza populista, com finalidade eleitoral, planejada para gerar impacto midiático e colher dividendos políticos. As imagens de confronto transformam a tragédia em propaganda, enquanto as comunidades continuam subjugadas tanto pelo crime quanto pela violência estatal.
Cada vida perdida, seja de um policial, de um morador, de um suspeito, ou de um criminoso, representa o fracasso coletivo de uma sociedade que ainda confunde vingança com justiça. Enquanto operações como a do dia 28 forem tratadas como vitórias políticas, e não como sinais de que algo está profundamente errado, continuaremos a assistir ao mesmo ciclo de sangue, manchetes, silêncio e omissão.
A verdadeira vitória contra o crime não se mede em corpos, mas na capacidade do Estado de reconstruir a esperança onde hoje só há medo. n
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