Professor da Universidade Regional do Cariri (Urca) e advogado. Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia
Professor da Universidade Regional do Cariri (Urca) e advogado. Membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia
A condenação dos militares envolvidos na trama golpista de 2022/23 abriu a etapa inevitável e constitucional: o julgamento, pela Justiça Militar, sobre a perda de seus postos e patentes. A Constituição e o Estatuto dos Militares são taxativos: oficiais condenados a mais de dois anos de prisão, com sentença definitiva, devem ser submetidos ao Superior Tribunal Militar (STM) para avaliação de indignidade.
E, diante dos fatos, não há espaço para dúvidas. Militares que conspiram contra a democracia violam o juramento que prestaram e assumem postura frontalmente incompatível com a carreira das armas.
É essencial reafirmar o óbvio: o STM não pode revisar a condenação do STF. Não pode rediscutir provas, minimizar a gravidade dos atos ou reinterpretar os crimes cometidos.
A função da Justiça Militar é exclusivamente aplicar a consequência disciplinar decorrente da condenação já estabelecida pela instância máxima do Judiciário. Negar isso seria transformar o STM em uma instância recursal inconstitucional e, pior, em arena de proteção corporativa para quem atentou contra o Estado Democrático de Direito.
A eventual decisão de manter o posto e a patente desses condenados seria mais do que um absurdo lógico. Seria dizer que um militar pode tentar destruir a Constituição e, mesmo condenado, permanecer como oficial do Estado.
Seria negar a obviedade de que um militar que se engaja em projeto golpista assume, por definição, conduta indigna. É inadmissível que alguém que atentou contra o Estado de Direito continue a ser sustentado pelos cofres públicos, recebendo soldo e benefícios, como se sua farda fosse um direito natural e não uma responsabilidade funcional.
O problema é que a Justiça Militar carrega um passado que ainda a aprisiona e envergonha a nação. Enquanto a presidente do STM, ministra Maria Elizabeth Rocha, recentemente pediu perdão por crimes cometidos por militares durante a ditadura (1964-85), há, dentro do próprio tribunal, resistências em caracterizar a deposição de Goulart como golpe e aquele período como ditadura. Se uma instituição hesita em qualificar corretamente o passado, é previsível, ainda que inaceitável, que vacile diante da necessidade de responsabilizar militares no presente.
Este momento expõe, de forma crua, a anacrônica existência de uma Justiça Militar em tempo de paz. Uma justiça que, ao hesitar em cumprir seu dever mais básico diante de um atentado à democracia, questiona sua própria razão de ser.
A institucionalidade democrática não pode aceitar a manutenção em seus quadros daqueles que a traíram. A perda do posto e da patente não é uma opção; é um imperativo ético, jurídico e democrático. A decisão do STM sobre os golpistas não dirá apenas quem pode ostentar uma farda. Dirá, também, se a Justiça Militar serve ao país ou apenas a si mesma.
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