Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros
Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros
Dezenas de organizações, projetos, coletivos, grupos e pessoas dedicadas às causas sociais, culturais e educacionais atuam ou iniciaram suas atuações no Pici, em Fortaleza, um bairro com 38.377 habitantes (2022), área de 3,74km², cobertura vegetal de 11,31%, cinco praças, um único equipamento cultural público (Cuca Pici) e onde a renda média mensal é de 1,5 salário-mínimo (2010), segundo o portal "Fortaleza em 121 bairros", da prefeitura municipal.
Essas práticas cidadãs e artísticas funcionam como resposta da sociedade ao que deve ser revelado e reconhecido com a participação da comunidade, de modo que a riqueza imaterial do território preponderem sobre os obstáculos de insuficiências, contribuindo para tornar aquele lugar sempre melhor de se viver. Para fortalecer ainda mais esse conjunto de iniciativas, foi lançado sábado passado, 22, no espaço Escuta, o Fórum de Cultura Popular do Pici.
A influência que a poesia, a arte e a literatura têm como definidoras de percepções na formação, no senso de proteção comum e no desenvolvimento de um sentido de destino voltado para a coletividade é um ponto que me atrai nas lutas por justiça socioespacial. Naquele final de tarde senti essa pulsão ardente no rock da banda Caixeiros Viajantes, na dança de xote do grupo Flor do Amanhã e na coroação da rainha do Maracatu Nação Pici.
Membros do Fórum apresentaram os campos artísticos e culturais das comunidades que integram o bairro do Pici, suas "potencialidades, desafios e demandas para o diálogo público e político" com as esferas públicas. A articulação contempla as partes e suas transversalidades como meio de pensar, elaborar e pôr em ação maneiras mais humanizadas de observar e de fazer a vida na periferia da cidade.
É importante que o bairro do Pici, formado basicamente por imigrantes do interior e por deslocados de outras regiões urbanas, usufrua estruturalmente de suas próprias manifestações. As famílias e os grupos sociais que se mudaram para ali chegaram apenas com a cultura, em um processo de habitação labiríntica e de construções espontâneas. A ideia de conjunto habitacional veio depois, embora desacompanhado de planejamento.
Muitas histórias engrandecem o nome bairro, mas nenhuma delas parece afeita a engrandecer a vida de quem mora lá. O nome Pici vem do "Sítio Pecy", uma junção de Peri e Ceci, protagonistas do romance "O Guarani", de José de Alencar (1829 - 1877), dado que a região era constituída por propriedades campestres de famílias ricas e letradas, como a de Rachel de Queiroz (1910 - 2003), que morou lá. Não à toa o lugar tinha uma trincheira de defesa em um eventual contra-ataque à ordem do governador Franco Rabelo (1861 - 1928), que mandara invadir Juazeiro e matar o Padre Cícero.
O grande impacto ocorrido na área foi o desmatamento para a instalação de uma base militar estadunidense durante a Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945). Depois de desativada na década de 1950, parte da área abrigou o maior campus da UFC, e o restante passou a receber desabrigados e sem-terra, em um vaivém de ocupações, desocupações, mutirões e conjuntos habitacionais. Em 2018, o bairro passou a ser contemplado como Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), instrumento facilitador da regularização fundiária e de direitos fundamentais.
Iniciativas como o Fórum de Cultura Popular do Pici unem pessoas pela satisfação de fazer coisas que elevam a autoestima e o apego ao lugar, independentemente da distância social em que se encontram na escala de desigualdades.
A soma da Literatura, das histórias cotidianas e a paixão pela escrita. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.