Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros
Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros
A plataforma Mubi está exibindo um filme muito educativo para estes tempos de derrocada da experiência humana e de práticas de resistências muitas vezes limitadas à insatisfação em si. Leve, consistente e com provocativa abordagem realística, "Os Educadores" ("The Edukators", 2004), do diretor alemão Hans Weingartner, trata de uma contemporaneidade em que até a rebeldia virou produto.
A obra faz o encontro de dois tipos de personagens comuns em seus motivos de militância política e diferentes em suas perspectivas geracionais. De um lado, o ex-líder estudantil de 1968, que se tornou um oportunista de mercado, e, do outro lado, três jovens ativistas da reeducação de capitalistas, mas que não se dão conta de que apenas resistir é uma forma de assumir a agenda dominante.
Ela e eles são ativistas táticos, e não idealistas. Indignados contra a ganância desmedida, Jan (Daniel Brühl), Peter (Stipe Erceg) e Jule (Julia Jentsch) têm escrito na parede do apartamento em que moram uma frase de sustentação de suas atitudes: "Todo coração é uma célula revolucionária".
A própria Jule padece de uma situação decorrente dos pensamentos e das ações do ricaço Hardnberg (Burghart Klaubner). Por conta de um acidente de trânsito, em que bateu no carro dele, ela foi condenada a pagar uma dívida que consume mensalmente tudo o que ganha trabalhando de garçom em um restaurante. Para ele, aquele era simplesmente um dos seus automóveis de luxo; para ela, uma condenação de vida inteira.
Jan e Peter eram cúmplices em uma atividade clandestina dirigida a pessoas muito ricas, com o intuito pedagógico de influenciar mudanças de mentalidades e tomada de consciência dessas pessoas sobre o que elas representam para o assolamento do mundo. Invadiam mansões, unicamente para alterar a disposição da mobília, pendurar esculturas pelo pescoço, entre outras intervenções desnorteadoras. Não roubavam nada e, ao saírem, deixavam mensagens de alerta: "Você tem dinheiro demais" ou "Os dias de fartura estão contados" (Die fetten Jahre sind vorbei), que é o título original do filme em alemão.
Em uma dessas vandalizações pacíficas, juntamente com Jule eles entram na residência suntuosa do dono da Mercedes Benz envolvida no fatídico acidente. O caso desdobra-se em momentos de diálogos entre os quatro. Hardnberg tenta igualar-se aos demais, falando de sua antiga militância, mas sempre ressaltando que o tempo das ideologias passou e que ser ativista na atualidade é inútil. O trio contra-ataca dizendo que o inconformismo vai vencer essa insensibilidade porque os antidepressivos não são eternos, e que, mais dia menos dia. as pessoas vão se cansar da lavagem cerebral do consumismo.
O empresário deixa claro que não concorda com aquela ação dos jovens, porém sinaliza com ar generoso que os entende, até porque um dia também já pensou em realizar algo parecido. Sem saber o que fazer com o sequestrado, os três resolvem devolvê-lo à mansão onde morava. Hardnberg escreve e assina em um papel o seu perdão à dívida de Jule e tudo parece consumado. Depois de refletir um pouco sentado no sofá de casa, denuncia o sequestro.
Quando a polícia chega ao esconderijo de Jan, Peter e Jule para prendê-los, eles haviam fugido e deixado a seguinte mensagem: "Há pessoas que nunca mudam". E aqui, talvez, se encontre o ponto mais relevante dessa obra no que diz respeito ao posicionamento da sociedade diante desses indivíduos que concentram o poder econômico e financeiro e que, se sabe, nunca mudarão.
A soma da Literatura, das histórias cotidianas e a paixão pela escrita. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.