Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros
Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros
O continente africano passa por novos enfrentamentos em sua história de independência. Depois de vitorioso com o Pan-africanismo no século XX, quando a união de povos contra o colonialismo alterou o olhar sobre escravidão, racismo e beleza e conquistou a independência dos países colonizados, a África avança no século XXI com o Neoafrikanismo, que é a busca de rompimento com o neocolonialismo, instalado após as independências, visando autodeterminação e soberania.
O que era adequação comportamental de dominado agora quer ser cidadania africana, no continente com a população mais jovem do planeta. Com 1,4 bilhão de pessoas, quase 20% da população mundial, a África tem mais de 60% dos seus habitantes com menos de 25 anos. Nesse cenário, é comum surgirem líderes jovens incomodados com a dependência crônica que mantém os países africanos controlados pelo neocolonialismo.
Focos de inquietações espalham-se por todo o continente. O mais destacado no momento é a Aliança dos Estados do Sahel (AES), formada por Mali, Niger e Burkina Faso, países da África Ocidental dirigidos por juntas militares. Nesse trio, está o mais jovem presidente africano, Ibrahim Traoré, de 37 anos, comandante interino do Burkina Faso. Eles alegam que a democracia liberal imposta pelos colonizadores só serve para construir pactos de elites que seguem explorando as riquezas africanas.
A emancipação viria da construção de organizações políticas inspiradas nas constituições orais, como a Carta do Manden, definida pelo Grande Estado do Mali, no início do século XIII, contemplando questões como direitos humanos, justiça social, acesso ao conhecimento, segurança alimentar e preservação ambiental. O continente retomaria a sua própria dinâmica, interrompida pelas invasões, extermínios e atrocidades coloniais europeias no século XVI, e seu aperfeiçoamento em 1884 com a partilha dos territórios explorados.
O recurso de métodos militares em governos que contraditoriamente se apresentam como revolucionários progressistas tem uma fundamentação histórica associada a ex-combatentes africanos que integraram os exércitos franceses e britânicos na Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945). No livro "Ébano" (1998), o historiador polonês Ryszard Kapuscinski diz que, ao verem brancos matando brancos, brancos pedindo esmola, a França sendo derrotada e a Inglaterra bombardeada, ao retornarem à África esses soldados negros engajaram-se em movimentos e partidos que lutavam pela independência de seus países.
Criou-se uma cultura da força que persiste em choque com o senso de coletividade do continente. O economista guineense Carlos Lopes argumenta que a saída é deixar de lado o ímpeto de democratizar a África e passar a africanizar a democracia. No livro-manifesto "Neoafrikanismo: África em Traoréficação - Um chamado à juventude africana e à diáspora" (2025), o ator e político guineense Vensam Ialá utiliza a letra "K" no lugar de "C" como signo de ruptura não mais territorial, mas com o modelo mental de colonizado.
O autor vê o Neoafrikanismo como a evolução do Pan-africanismo a um patamar propício ao despertar político e espiritual do continente-mãe, de modo que a África pense com a própria cabeça. Na expectativa de que isso aconteça, criei a expressão Sankofacracia Afrikana para designar o sistema democrático que possa decorrer desse processo. A Sankofa é um signo ganense, representado por um pássaro que voa sempre em frente, com a cabeça virada para trás, atento à sabedoria ancestral. Governo de Sankofa.
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