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E se Bolsonaro também for vítima na ação contra Ciro?
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Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).

E se Bolsonaro também for vítima na ação contra Ciro?

A explicação sobre o que aconteceu na quarta-feita talvez exija uma análise mais profunda do que fomos capazes de fazer até agora
Presidente Bolsonaro e ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro (Foto: Carolina Antunes/PR)
Foto: Carolina Antunes/PR Presidente Bolsonaro e ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro

A espetaculosa ação da Polícia Federal na quarta-feira, que envolveu visitas às residências dos irmãos Cid (senador da República) e Ciro (pré-candidato do PDT à presidência da República) Ferreira Gomes, continua na ordem do dia do debate político do País. Especialmente diante da inexistência de explicações oficiais sobre o que aconteceu a partir de uma decisão equivocada de suspender a entrevista coletiva na qual poderiam ser dissipadas as dúvidas relacionadas à necessidade real da coisa acontecer daquela forma, com tanto barulho.

É preciso reforçar que não se discute a necessidade de investigar a fundo a suspeita de desvios nas obras de reforma do Castelão. Inclusive, se preciso, desconsiderando os cenários políticos eventuais ou os interesses que podem ser contrariados. No entanto, também não se deve aceitar que o calendário eleitoral determine o que deve acontecer e como, na perspectiva de agradar um ou fragilizar outro.

Feita a ressalva, volte-se à questão do interesse que poderia ter o presidente Bolsonaro, a quem está ligado hoje o comando da Polícia Federal, numa ação que a essa altura atinja e prejudique Ciro Gomes no seu projeto político para 2022. Ao meu ver, quase nenhum, considerando que o eleitorado que o pedetista busca é aquele que já não votaria no atual governante, porque sempre lhe fez oposição ou em razão de ter-se decepcionado com ele. O ganho, tirando a satisfação pessoal de ver um crítico feroz em maus lençóis, seria praticamente nulo.

Direcionemos a conjectura para outro rumo, então, na perspectiva de encontrar alguém que de fato pode se beneficiar e que detenha algum poder de influência na estrutura da Polícia Federal. O nome que melhor se encaixa nesse quebra-cabeça político é o do ex-juiz e ministro da Justiça até abril de 2020, Sergio Moro, que recém entrou na briga presidencial e que, sim, pode tirar algum proveito da saída de Ciro do espaço da tal terceira via que alguns consideram necessário para o país fugir de uma polarização Bolsonaro x Lula.

E influência na Polícia Federal, ele tem? Sim, tem. Lembre-se que Moro, quando ministro da Justiça, caiu em desgraça com Bolsonaro por se recusar a mexer na estrutura da superintendência do Rio de Janeiro para colocá-la a serviço da família presidencial. Ganhou pontos com uma parte da instituição, além de já existir uma boa relação dele com aquela turma que atuou na Lava jato, em Curitiba e na região sul, mantendo um certo grupo que lhe é fiel. Até hoje.

Some-se a isso um contingente bom que demonstra grande desconforto com as interferências frequentes, e a cada dia mais atrevidas, do Palácio do Planalto, minando uma parte da autonomia que vinha sendo conquistada há anos. Aquela que, por exemplo, permitiu fazer-se uma escuta que atingiu à então presidente da República Dilma Roussef e explorá-la publicamente sem que ninguém tenha sido punido, sequer administrativamente. Ou seja, a liberdade era tal que mesmo diante de abusos a instituição parecia inatacável.

Com os passar das horas e já com menos nuvens políticas a nos encobrir, as reflexões acerca do que aconteceu naquela manhã de quarta-feira precisam ser aprofundadas. A ideia de que foi algo orquestrado pelo terceiro andar do Palácio do Planalto talvez deva ser submetida a uma análise que, como primeiro ponto, busque entender os ganhos que o presidente teria com toda aquela confusão policial e política. Eles (os tais ganhos) não aparecem com facilidade e, a menos que exista um cálculo desconhecido sobre o que pode acontecer mais adiante, num horizonte que ainda não se vislumbra, Bolsonaro teria mais razões para desaconselhar a operação do para incentivá-la.

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