![Foto de Guálter George](https://mais.opovo.com.br/_midias/jpg/2022/01/27/100x100/1_gualter_george-17974872.jpg)
Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
A semana foi dura para o Nordeste, e sua população, como resposta ao resultado eleitoral de domingo passado, que apontou, na disputa de primeiro turno pela presidência da República, uma maioria expressiva de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre Jair Bolsonaro (PL), superior a 12 milhões de votos apenas na região. Explodiram manifestações e ações de cunho xenófobo, agressivos, de embrulhar o estômago algumas delas, mas focaremos naquela que parece ser a mais inaceitável de todas: a do presidente da República.
Alguém que comanda um País e que na própria marca de gestão anuncia um "Brasil acima de tudo" não pode, agindo com o fígado, interpretar uma situação qualquer que lhe desfavoreça como resultado de uma decisão de "analfabetos" e "sem cultura". Jair Bolsonaro já tem idade e tempo de política suficiente para entender que nem tudo na vida se consegue explicar a partir dessa dicotomia entre esquerda e direita, falsa em vários aspectos e ainda mais num ambiente de ideologias tão frágeis.
Sua tese de que perdeu para Lula devido à ignorância que grassa no Nordeste, verbalizada numa das lives que mandou às redes sociais na semana na qual tentou fazer uma análise dos números eleitorais, não resiste à pesquisa mais rasa. A começar pelo fato de não ser uma região onde a tal esquerda controla desde sempre e que por isso deve responder pelos problemas seculares reais que apresenta em termos de pobreza e desigualdade social.
Ao contrário, mergulhando-se mais fundo o registro histórico predominante é de um comando político de caráter conservador, calcado num coronelismo que nada tinha, ou tem, de progressista. De um tipo de método político muito mais alinhado à direita, querendo-se posicioná-lo num dos campos limitadores tão úteis à forma escolhida para justificar uma performance ruim.
Sim, é verdade que ainda temos muitos analfabetos entre nós. Sim, a ignorância segue sendo um entrave ao desenvolvimento regional porque impõe limites intransponíveis para alcançarmos o ritmo que seria adequado diante dos atrasos acumulados que exigem do Nordeste, hoje, um crescimento mais acelerado do que aquele que experimentam outros pontos territoriais do País e do mundo. Errado, de fato, é desconsiderar que há fundamentos estruturais no problema e tentar justificá-lo como resultado isolado do que aconteceu nos últimos 20 anos, vinculando-o a uma realidade recente da chegada ao poder de governos de linhas mais diferenciadas (ou de esquerda, dê-se o nome que quiser).
O quadro é muito mais complexo e Jair Bolsonaro, seja o presidente ou o candidato, está obrigado a entendê-lo nessa perspectiva. Do contrário, consolida-se como alguém inadequado para liderar um projeto político que tenha entre suas prioridades necessárias agir no sentido de transformar um cenário econômico e social que, todos concordamos, precisa mesmo ser melhorado.
Caso deseje o voto do nordestino no dia 30 próximo, o presidente Bolsonaro, que tenta reeleição, precisa entender que não reverterá o acachapante apoio a Lula que as urnas confirmaram tratando-nos como "cabeçudos", "cabeções", "paraíbas", "cabras da peste", nas vezes em que tenta ser simpático, ou como "analfabetos" e "incultos", nos momentos de aparente irritação como a demonstrada ao manifestar-se acerca do que aconteceu no primeiro turno. É só ver pelo debate da semana que o comportamento não o favorece, não dá para ficar o tempo brigando contra a realidade. Uma hora ela prevalece.
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Izolda Cela, governadora do Ceará, em suas redes sociais, ontem, saudando a região pelo 8 de outubro, data que anualmente homenageia a cultura nordestina e sua diversidade folclórica típica
A coluna questionou outro dia o uso pelo então candidato Carmelo Neto (PL), que chega à Assembleia do Ceará em 2023 como o mais votado, do apoio que fez circular em sua redes sociais de um político nacional identificado como "Nicolas Ferreira". Ainda teve a petulância de duvidar do peso que ele teria para ajudar o vereador fortalezense na sua caminhada. Pura desinformação deste escriba, está claro, considerando que Nikolas Ferreira, com "k", hoje vereador em Belo Horizonte, transformou-se no deputado federal eleito campeão de votos em todo o País, coisa acima de 1,4 milhão. Ou seja, para o grupo ao qual a mensagem se destinava certamente teve efeito positivo.
O eleitor cearense talvez nem precise esperar a mudança de composição na Assembleia para começar a sentir a falta de um deputado com a qualidade de Heitor Férrer, hoje no União Brasil e derrotado em sua tentativa de renovar o mandato pela sexta vez consecutiva. As sessões voltaram a acontecer após o fim do primeiro turno e ei-lo lá, da tribuna, cobrando o governo e exigindo a contratação do pessoal concursado na Funsaúde. Segundo diz, foram chamados apenas 322 de uma lista com seis mil nomes aptos. Deveria ser assim, mas, na política real, é comum que os derrotados simplesmente transfiram a culpa do fracasso nas urnas para os eleitores e larguem seus compromissos de quatro anos. É um bom exemplo que os maus exemplos, infelizmente, abafam.
As paredes (simbólicas) da Assembleia começam a captar conversas que miram, a partir de 2023, a cadeira do presidente do Legislativo cearense. O atual ocupante, Evandro Leitão, sai forte da campanha, pela performance na reeleição e pelo fato de ter sido um dos pedetistas que esteve desde sempre ao lado de Camilo Santana, Izolda Cela e, mais sutilmente, do vitorioso candidato ao governo, Elmano Freitas, do PT. Sua primeira batalha, caso queira permanecer no estratégico posto, será vencer as dúvidas legais já levantadas, no boca-a-boca, considerando a existência de regra que impede reeleições na Casa. A perguntinha lançada à mesa é: mesmo de uma legislatura para outra?
O que pega na sucessão do parlamento estadual é o fato de existirem possíveis interessados na presidência bastante fortes. Um deles, Fernando Santana, candidato mais votado do PT, quase parente de Camilo (são concunhados) e com boa articulação interna. Claro que contra ele pesa o fato de ser correligionário do governador eleito, o que significaria muito poder concentrado em um mesmo partido, que sequer elegeu a maior bancada para Assembleia. Outro deputado reeleito que, se quiser, entorna o caldo da briga pelo comando do legislativo é Zezinho Albuquerque, do PP, que já ocupou o cargo, também foi fundamental na vitória do novo grupo governista que se forma e que, se decidir cobrar a fatura na forma de um apoio ao seu nome. deve gerar tensões internas.
Dos três senadores cearenses atuais, apenas Eduardo Girão (Podemos) apoia a instalação de uma CPI para investigar os institutos de pesquisa com base no que aconteceu no primeiro turno das eleições presdenciais de 2022. No resumo em palavras do que entende que houve ele fala em "palhaçada" para prejudicar Jair Bolsonaro na sua tentativa de reeleição, na avaliação do parlamentar, numa atitude que tinha lado. Para ele, o que aconteceu foi um esforço deliberado para ajudar o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, na perspectiva de influenciar o voto dos eleitores e garantir sua vitória ainda em primeiro turno.
Ok, anotado. Duas indagações a fazer, considerando que Girão é autor de um projeto, que tenta incluir na pauta de votações do Senado, que proíbe a publicação de pesquisas a partir de 30 dias antes da data prevista para acontecer a eleição: primeiro, como fica aquela defesa enfática de antes pela garantia à liberdade de expressão plena, protegendo-se o direito até de cidadãos que usam redes sociais para agredir a honra alheia, fazer ameaças por discordância política e propagar fakes news? Segundo, o afã de investigar pesquisas que erraram também mira a motivação eventual daquelas que apontavam o candidato Bolsonaro até 15 pontos à frente do adversário Lula? Aguardo cartas.
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