Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).
O cearense Eduardo Girão (Podemos) avisa que é sério seu projeto de candidatura à presidência do Senado. Mesmo que não apresente ainda um apoio de peso ou algum sinal mais evidente de ter chances reais de crescer em meio à briga polarizadora que hoje coloca de um lado o atual ocupante da cadeira, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), que tentará permanecer para o biênio 2023/2024 dispondo, dentre outras, da simpatia da bancada governista, e do outro o futuro senador Rogério Marinho (PL/RN), representante do bolsonarismo e que junta em torno de si a oposição ao novo grupo instalado no poder.
Girão, na verdade, adota discurso até realista quanto à intenção verdadeira da insistência em manter a candidatura, apesar de apelos para que some forças ao projeto do potiguar ex-ministro de Bolsonaro. À coluna, o representante cearense explicou que um dos objetivos seus, talvez o principal, é dificultar uma vitória do governista (imagino que esteja falando de Pacheco, embora não o cite) que seria possível ainda no primeiro turno, conforme pensa, caso existam apenas dois envolvidos na disputa. A matemática da Casa exige 41 votos para que isso aconteça.
O argumento é politicamente aceitável, porém, vai de encontro à ideia sempre presente ao discurso do senador de que sua postura no Congresso é a de um parlamentar "independente". Ou seja, não é bolsonarista, nem petista, muito menos governista, numa ou noutra circunstância, alguém que uma fala relaxada definiria como "isentão". A verdade é que um olhar mais acurado sobre os quatro primeiros anos do seu mandato, conforme a coluna já teve oportunidade de apontar antes, o coloca num alinhamento evidente com o governo que mandava no País até o final de 2022. Excluindo-se apenas um ponto: o forte incentivo do presidente de então ao armamentismo, único tema que, é fato, colocou Eduardo Girão em posição antagônica ao bolsonarismo. De resto, foi só convergência.
É pegar o exemplo do comportamento que ele teve em relação à política do governo de combate à pandemia. Na CPI que o Senado instalou para apurar o que aconteceu no período, Eduardo Girão foi destaque na tropa de choque governista e atuou sempre numa linha de minimizar os equívocos monumentais, as prioridades questionáveis, a atitude pouco solidária do presidente da época e, pior, as dúvidas concretas quanto à honestidade de alguns procedimentos adotados. O mais evidente deles envolvendo as operações de compra de vacina, pela ação de intermediários em contratos que estavam encaminhados com aparente interesse de obter benefícios próprios, enfim, uma postura escandalosa que o senador do Podemos ignorou, praticamente, optando por lançar um foco meio desproporcional em ações desenvolvidas pelos governadores e prefeitos do Nordeste. Como era de muito interesse naquele momento de Bolsonaro e do seu (dele) governo.
Girão diz que uma de suas prioridades caso chegue à presidência seria resgatar a independência do Senado, avaliando que o Judiciário tem nos últimos anos "esmagado" os demais poderes. Pergunto se ele entende que houve harmonia entre Legislativo e Executivo nos anos Bolsonaro e o senador cearense responde, de maneira atravessada, que "a marca dos governos do PT é a cooptação", razão pela qual a "Casa Revisora da República, mais do que nunca, precisa demonstrar independência". O mais próximo que se pode dizer que a resposta embute alguma crítica ao presidente do Brasil entre 2019 e 2022 é a observação de que "a classe política como um todo tem deixado a desejar".
Olhando o que foi até agora o mandato do candidato cearense a presidir o Senado no próximo biênio, o real é que se constata uma marca governista forte em contraponto a um discurso de independência que os fatos contrariam. E não há sinais de que uma mudança esteja a caminho, considerada a sua reação aos violentos acontecimentos do último dia 8, quando a sede do Senado foi invadida e vandalizada por um grupo de pessoas mobilizadas pela ideia de que Jair Bolsonaro não perdeu a eleição e a democracia pode ser relativizada para permitir sua volta ao poder, do nada.
Foi sugerido pela coluna a Eduardo Girão que opinasse sobre o episódio, na perspectiva de quem se propõe a comandar o poder atacado, física e politicamente, naquele dia trágico, e ele, claro, condenou. "Repudiei veementemente os tristes e reprováveis espetáculos de vandalismo e depredação contra instituições, violência nunca será o caminho", disse, encerrando a parte meio protocolocar da resposta e, a partir disso, começando a fase dos ataques ao governo Lula, a partir de uma série de dúvidas que diz ter em relação às providências adotadas. "Entrei até com representação na PGR por crime de prevaricação do Ministro da Justiça e segurança pública e o GSI", explica. Nada sobre Bolsonaro, sobre os bolsonaristas, os golpistas ou qualquer outra menção que fosse capaz de dar coerência ao esforço do senador de se apresentar como "sem lado" no Brasil atual dividido.
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Eduardo Girão, senador do Podemos pelo Ceará e candidato à presidência da mesa diretora
Eduardo Girão - O primeiro ponto é que, quanto mais candidatos na disputa para a Presidência do Senado, maiores as chances de o candidato do Governo ser derrotado. No processo de escolha específico só haverá o Presidente eleito quando este obtiver 41 votos, até que isso não ocorra serão feitos, ou seja, serão repetidas quantas votações sejam necessárias. E isso fortalece o debate na sociedade assim como forças convergentes pela renovação do Comando da Casa. Quanto à viabilidade, o que vai determinar isso é o resultado da votação em si. Meu mandato de senador é inclusive resultado de uma eleição, viavelmente falando, improvável. Por que então eu me absteria neste momento crucial do Pais?
Girão - Os três poderes existem exatamente para isso: para funcionar como um sistema de freios e contrapesos, evitando excessos de lado a lado. Assim sendo, não precisam ser exatamente harmônicos, e sim estarem direcionados para a função principal da política, que é servir as pessoas. Neste sentido, penso que a classe política como um todo - incluindo o Senado Federal - tem deixado a desejar para a população brasileira. Brasília se tornou uma ilha da fantasia, desconectada do mundo real, do cidadão que paga muitos impostos e que recebe pouco ou nada como contrapartida. Como a marca dos Governos do PT é a cooptação mais do que nunca, a Casa Revisora da República precisa ser independente para que haja equilíbrio entre os Poderes. Hoje, pela omissão do Senado, temos um Poder esmagando os demais!
Girão - Quem acompanha minha trajetória, antes mesmo de estar senador - ou quem dá uma breve conferida nas minhas redes - sabe do meu histórico e trabalho em favor da paz e repudiei veementemente os tristes e reprováveis espetáculos de vandalismos e depredação contra instituições no último dia 8/1. Violência nunca será o caminho. No entanto, é preciso que se investigue a fundo para saber o que realmente aconteceu, doa a quem doer. Inclusive para o atual Governo Federal (48 órgãos) que foi informado pela ABIN que os objetivos dos atos seriam a destruição físicas dos prédios públicos e nada fez. Entrei até com representação na PGR por crime de prevaricação do Ministro da Justiça e segurança pública e GSI do Governo Lula.
Girão - Quando um senador da República se abstém dessa atribuição, de apontar eventuais erros, falhas , abusos de autoridade e desrespeito a constituição vindos do Supremo Tribunal Federal, ele está ignorando uma prerrogativa do próprio Senado, presente no Artigo 52 da nossa Constituição Federal, bastante explícita inclusive: "... processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal…" Só para dar um único exemplo na área da economia; a partir do momento que o Senado é indiferente a supostos desmandos vindos de alguns Ministros e nada faz, se gera uma insegurança jurídica sem precedentes que vai repercutir na falta de investimentos internos e externos que impacta na geração de empregos e renda, impactando negativa e diretamente na vida dos cearense. Ou seja, a população - que é a verdadeira mantenedora do STF, para quem o STF deve trabalhar - é prejudicada. E é minha obrigação, conforme a Constituição, agir.
O dia 5 de fevereiro está chegando para colocar à prova, pela primeira vez, a articulação política do recém instalado governo Elmano de Freitas. Aquela estrutura, como já dito, que envolve três pessoas - Waldemir Catanho, Nelson Martins e Artur Bruno - e que tem a missão de se antecipar aos problemas, evitando-os, e, quando impossível, tentar resolvê-los sem deixar danos à gestão. Na data acontece a eleição suplementar em Pacujá com candidaturas ligadas a alas governistas, uma do grupo comandado pelo secretário de Cidades (e deputado estadual licenciado) Zezinho Albuquerque e outra ligada à suplente de senadora (que estará no mandato a partir de fevereiro) Augusta Brito, que é da terra. PP, num caso, PT, no outro.
E a turma já pode se considerar no lucro tendo apenas essa preocupação a incomodar o governo. Uma providencial decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, cancelou eleição extra marcada para a mesma data de 5 de fevereiro em Iguatu, onde a confusão tende a ser maior. O PT, neste caso, já decidiu que terá candidatura própria, o MDB tem nome forte, o PDT trabalha para correr numa terceira faixa e o PSD, que perdeu a prefeitura com o afastamento de Edinaldo Lavor, também se prepara para entrar na briga. Com apenas Pacujá preocupando em relação aos efeitos futuros de uma eventual briga fraticida na base fica mais fácil para a trinca de articuladores atuar.
O deputado federal eleito André Fernandes (que tem mandato de deputado estadual até fevereiro próximo, experimentou uma semana de boas vitórias. Teve o ministro Alexandre de Moraes (olha quem!?!) garantindo sua posse na Câmara dia 1º de fevereiro ao negar pedido do grupo Prerrogativas, formado por advogados ligados ao PT, para que ela fosse sustada enquanto sua participação nos atos violentos do dia 8 é investigada; e, depois, a manifestação firme em sua defesa do atual presidente da Câmara, Artur Lira (PP-AL), que não deixa de ser um apoio político de peso que ganha para as batalhas que ainda estão por vir.
Dito isso, registre-se o quanto é interessante ver alguém tão vinculado ao discurso de questionamento às urnas eletrônicas, às dúvidas sobre legitimidade do resultado na disputa presidencial, reagir a uma decisão judicial em seu favor argumentando que "o voto de 229 mil cearenses foi respeitado". Referindo-se, claro, à especial votação que obteve como candidato à Câmara Federal. É o caso de lhe perguntar, então, se não acha que também os votos de 60 milhões 343 mil e 247 brasileiros deveriam ser respeitados na opção que fizeram por Lula na disputa presidencial? Isso teria evitado muito problema para o País a partir de 31 de outubro de 2022 e até, pelo menos, 8 de janeiro de 2023.
É comovente a alegria dos petistas no encontro que aconteceu na semana da futura bancada federal cearense com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Em especial do líder do governo Lula, José Guimarães, que se diz fiador da reunião, realizada na residência oficial e que atraiu todo mundo, inclusive a turma bolsonarista igualmente animada com o que acontecia. O detalhe a considerar é que o Lira em questão, demonizado até outro dia pelos que agora assumem o lado situacionista, segue sendo exatamente o mesmo de antes, nos defeitos e virtudes que apresenta. Quem mudou, diria aquela voz mais experiente da política, foi o governo. Melhor dizendo, os (neo)governistas.
Presidente da República mais uma vez, Lula precisa ser aconselhado a fazer um ajuste no seu discurso, especialmente quando fala em solenidades oficiais. Não fica bem para ele, considerada a simbologia do cargo, tratar o antecessor Jair Bolsonaro, por maiores que desejam as diferenças entre eles, como "genocida" ou "o coisa", expressões que ele utilizou em algumas falas da semana passada dentro do Palácio do Planalto. É um tratamento talvez aceitável, certamente capaz de fazer alguém rir em dadas situações, quando parte de um militante, talvez de um parlamentar, nunca de alguém que esteja sentado na cadeira mais poderosa e representativa do País.
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