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O que fazia o genro de Trump naquela reunião?
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Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).

O que fazia o genro de Trump naquela reunião?

Jared Kushner é casado com Ivana Trump e dado como um dos conselheiros do atual inquilino da Casa Branca. No entanto, não tem cargo formal no governo e o seu papel nas conversas com Israel acerca da crise em Gaza precisa ser esclarecido
Jared Kushner e Ivanka Trump, respectivamente genro e filha de Donald Trump, ambos com cargos de conselheiros no governo (Foto: Mandel NGAN / AFP)
Foto: Mandel NGAN / AFP Jared Kushner e Ivanka Trump, respectivamente genro e filha de Donald Trump, ambos com cargos de conselheiros no governo

Até hoje busco respostas para uma dúvida que me domina desde quando circularam mundo afora as imagens de uma reunião do gabinete do governo de Israel, chefiado pelo contestado Benjamin Netanyahu, na qual se discutia o plano de cessar-fogo em Gaza apresentado pelos Estados Unidos, de Donald Trump. Aprovado, por sinal, para surpresa de ninguém. O que segue a me incomodar naquele registro histórico, para além do que se deve comemorar no que representa de suspensão de um carnificina em curso na região?

É que ao lado de Netanyahu, à esquerda dele, encontrava-se sentado um cidadão norte-americano chamado Jared Kushner, cuja inadequada presença ali, e naquela posição estratégica, justificava-se pelo singelo motivo de ser o genro do atual presidente do Estados Unidos. O fato de ser judeu, e o é, anda longe de explicar o protagonismo que se dava naquela circunstância a um cidadão comum, sem cargo formal na administração Trump.

Jared, casado com Ivana Trump, é dado como um dos conselheiros do atual inquilino da Casa Branca. É possível que nos encontros familiares seja uma das vozes que Donald Trump escuta para suas grandes decisões, todo líder deve dispor de seu grupo de confiança pessoal para dividir impressões, trocar ideias etc.

O difícil, por um lado, é constatar que o governo israelense aceite essa influência ao ponto de colocá-lo dentro de uma reunião do gabinete, posicionando-o de maneira quase intimidatória diante dos ministros numa discussão que dizia respeito ao interesse do país que lhes cabe representar de maneira independente. Deveriam, pelo menos.

De outro lado, a atividade comercial e particular de Jared Kushner talvez fosse motivo para ele ser mantido à distância daqueles acontecimentos. Lá atrás, Trump sugeriu como solução para o conflito uma saída esdrúxula, que seria transformar Gaza numa "Riviera do Oriente Médio", sob administração dos Estados Unidos. Para isso, sem mover um músculo da face, sugeriu o deslocamento dos 2 milhões de palestinos que residem ali para terras vizinhas.

A ideia, que carece de qualquer fundamento lógico, parece ter ficado pra trás, ninguém mais falou nela, nem mesmo Trump. Só que o autor dela era Jared, investidor da área imobiliária, ou seja, potencial interessado em explorar o mundo novo que se pretendia abrir com a ocupação de Gaza para projetos turísticos, finalmente fazendo valer suas belezas naturais. Hoje,infelizmente, ofuscadas por um cenário de destruição e guerra.

A comunidade internacional opta por naturalizar tudo isso, uma evidente confusão entre interesses privados e públicos, quando deveria reagir para demonstrar ao comandante de um governo poderoso que há limites por serem observados. O episódio, ao meu ver, fortalece na cabeça de Donald Trump a compreensão de que a ele está dado o direito de fazer o que quiser, incluindo permitir a gente que lhe é tão próxima, no plano pessoal, aproveitar grandes crises internacionais para buscar ganhos pessoais.

Por essas e outras é que se demonstra urgente um esforço global para recuperar os espaços multilaterais como instâncias adequadas para levar à superação das grandes crises considerando os vários interesses em jogo. Interesses de países e comunidades, não de famílias ou investidores.

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