Logo O POVO+
O Estado sentou-se à mesa para conversar, enfim
Foto de Guálter George
clique para exibir bio do colunista

Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).

O Estado sentou-se à mesa para conversar, enfim

Reunião virtual de Bolsonaro, Alcolumbre e Rodrigo Maia com governadores (Foto: REPRODUÇÃO/TV BRASIL)
Foto: REPRODUÇÃO/TV BRASIL Reunião virtual de Bolsonaro, Alcolumbre e Rodrigo Maia com governadores

Parece surreal que somente depois de passados 2 meses, 23 dias e algumas horas da oficialização do primeiro caso de infectado por novo coronavírus no Brasil é que os principais atores políticos do País tenham conseguido se sentar à mesa (virtualmente falando, claro) para o começo de uma conversa civilizada que abra a possibilidade de discutir o cenário, responsabilidades e ações de cada um e as perspectivas que apontam para o futuro.

Até hoje, acumulavam-se apenas brigas, trapalhadas, disputas, tensões, desencontros, divergências, crises, enfim, adjetivos que certamente ajudam, juntos ou separados, a explicar que o novo coronavírus tenha encontrado um campo tão fértil para avançar aqui desde quando chegou.

A pandemia, infelizmente, alcançou a política brasileira num momento de absoluta ausência de líderes com capacidade para entender a gravidade do que acontecia e o papel reservado a cada um para enfrentá-la com as armas e com a força completa de institucionalidade disponível. Num esforço de soma, claro, que até hoje não havia sido percebido.

Um problema que se espalha por vários setores da vida pública, não é apenas do presidente e do seu desastrado governo, embora sendo justo que a ele se apresente a fatura mais alta de responsabilidade, já que lhe cabia o passo inicial de chamamento a um concerto nacional.

Infelizmente, sequer há garantia de que a videoconferência de hoje de fato represente uma mudança real e sustentada de comportamento de Bolsonaro. Pode ter sido uma ação episódica, um gesto isolado, até pelo fato de antes de entrar na sala para o encontro virtual de expressivo conteúdo político, ladeando-se pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, lá estava ele no tal cercadinho de apoiadores no portão do Palácio do Alvorada queixando-se de governadores, sugerindo que eles (os apoiadores) imaginassem o que seria "uma pessoa dessas na presidência etc".

É difícil pensar pela cabeça dos que ficam todo dia ali à espera do presidente da República passar para adorá-lo, mas, pensando a hipótese em perspectiva, e considerando o que a média dos governadores tem feito no combate à Covid-19, o País poderia estar numa situação melhor do que a que apresenta hoje.

Especialmente no aspecto em que Bolsonaro mais tem falhado, que é na incapacidade demonstrada de criar consensos possíveis, a partir de um diálogo que não exigiria de ninguém que abrisse mão de suas convicções. Ao contrário do que ele próprio alimenta desde o começo da crise, o problema não é de direita nem de esquerda, não é ideológico, simplesmente.

Espera-se, enfim, que a manifestação de pouco antes da reunião desta quinta tenha sido a última daquele presidente que apostava na divisão quando o momento exigia, e exige ainda mais hoje, união. E, por outro lado, que aquele presidente sereno e tranquilo, capaz de trocar palavras civilizadas com um politico que lhe é abertamente hostil, como João Doria, de São Paulo, simbolize um tom novo e uma nova linha na condução da crise que exige do Estado brasileiro, muito presente àquele ambiente virtual, uma resposta limpa de política, de vaidades, de ideologias e de mesquinharias.

O próximo lance de Bolsonaro indicará para onde estamos indo, de verdade.

 

Foto do Guálter George

A política do Ceará e do Brasil como ela é. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?