Advogado, pós-graduado em Processo Penal e mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É professor do Centro Universitário Estácio/Ceará e da Universidade Sete de Setembro (Uni7). Fundador do escritório Hélio Leitão e Pragmácio Advogados
O episódio envolve dois aguerridos militantes do campo da esquerda do espectro político - os advogados trabalhistas Benedito de Paula Bizerril e Tarcísio Leitão de Carvalho, ambos meus queridos amigos
Foto: Arquivo
Tarcisio Leitão
Já ouvi essa história em muitas e variadas versões. Vou contar aqui a que mais me diverte, ainda que possa não ser a mais fiel aos fatos. Cuida-se de episódio que se inscreveu definitivamente no anedotário cearense da resistência ao golpe civil-militar de 1964, e envolve dois aguerridos militantes do campo da esquerda do espectro político - os advogados trabalhistas Benedito de Paula Bizerril e Tarcísio Leitão de Carvalho, ambos meus queridos amigos.
A coisa aconteceu ali pelos começos dos anos 1970, quando Tarcísio e Benedito, em plena militância, estavam afixando nos muros da cidade cartazes em protesto contra o governo dos ditadores fardados. Lá pelas tantas a dupla vislumbra, atônita, uma viatura do exército despontar no horizonte - o medo se justificava pelas prisões e torturas de que se valia o regime contra os seus opositores políticos, a violência e a intimidação então tornadas armas políticas, coisa de que ambos já haviam sido vítimas. Eram tempos tenebrosos. E, já viram, gato escaldado tem medo de água, ainda quando fria, o que estava longe de ser o caso. Sobem lépidos ao jeep - carro muito comum à época, e fogem em marcha batida. Benedito ao volante, acelera rumo a qualquer lugar.
Aqui vale referir o perfil de cada um dos nossos personagens. Tarcísio, já falecido, sanguíneo, colérico, homem de gestos largos, orador inflamado. Benedito, hoje no vigor dos seu setenta e alguns anos, manso, cordato, sempre muito sereno, um dos homens mais dignos e corretos que já conheci. Em comum a ambos a generosidade e a vida de lutas por uma sociedade mais justa e fraterna.
Em plena fuga deu-se que, ao se aproximarem de um cruzamento, e como o semáforo apontava vermelho, Benedito, cumpridor dos seus deveres, obedece ao comando e para o carro, aguardando o sinal verde para prosseguir.
Aflito e zangado como ele só, Tarcísio se exalta com o companheiro de todas as horas, e ralha, sem esconder a frustração: "A revolução proletária jamais triunfará enquanto militantes comunistas como você não conseguirem transgredir sequer uma regra de trânsito". Se foi exatamente assim, não posso assegurar, acho até que não foi. Mas foi desse jeito mesmo que me contaram. Estou vendendo o peixe pelo preço que comprei. E não peço troco.
A despeito da inusitada parada diante do semáforo, o certo é que os nossos intrépidos personagens conseguiram se safar do aperto, não seria dessa vez que os esbirros da ditadura lhes deitariam as garras. Também é certo que a revolução proletária não se sagrou vitoriosa por aqui, mas as razões do insucesso foram bem outras, já conhecidas. Não culpem o Benedito, façam-me o favor.
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