Na edição do último dia 11 de novembro, o jornal O POVO trazia como uma de suas matérias os resultados de uma pesquisa, realizada pelo instituto Datafolha, que versava sobre o perfil ideológico dos eleitores de Fortaleza.
Segundo a reportagem, “quando perguntado sobre qual posição ocupa no espectro político, considerando-se os polos antípodas de esquerda e direita, 38% responderam dentro do intervalo da centro-direita até a extrema-direita. Desse índice, 19% se identificaram como de extrema-direita. Do lado oposto, 28% se reconhecem como pertencendo ao campo que vai da centro-esquerda à extrema-esquerda, limite no qual se encontram 11% dos eleitores entrevistados. Os que se afirmaram de centro são 21%, não sabem somam 7% e outras respostas totalizam 6%”.
A publicação da matéria causou frisson em coletivos de direita que, mesmo vituperando institutos de pesquisa quando trazem números que não lhes são favoráveis, passaram a propagar a informação na certeza de que “Fortaleza era de direita”. Isso porque os números apontados como o de identificados com a extrema-direita era de 19%, ao passo que com a esquerda era de apenas 7% e de extrema-esquerda chegava a 11%. Mas, passados alguns dias da eleição, é momento de conferirmos os números das urnas e verificarmos se estes se coadunam com as informações levantadas pela pesquisa.
Realizei o seguinte exercício: lancei mão do número de votos recebidos por partidos políticos que seriam representativos dos espectros da extrema-esquerda (PSTU), da esquerda (Psol, PT, PSB e PDT) e da extrema-direita, entendendo por esta aqueles partidos pelos quais apoiadores do presidente Bolsonaro lançaram-se candidatos. Por óbvio, tanto naqueles que considero de esquerda como naqueles de extrema-direita existem exceções; mas, por ora, vamos considerar as nomenclaturas em termos ideais.
Comecemos pela “extrema-esquerda”: na pesquisa apareciam 11% de identificados com ela, ao passo que nas urnas, por meio do PSTU, apenas 0,03% dos votos válidos, enquanto que a UP apenas 0,05%. Não se chegou nem a 1%, bem longe dos 11% que a pesquisa apontou.
Quando consideramos os partidos de esquerda, o percentual de votos de cada um foi o seguinte: PT (4,5%), PSB (5,82%), PDT (10,56) e Psol (3,60%), perfazendo um total de quase 23%, quando a pesquisa apontava uma identificação de apenas 7%. Pela extrema-direita, os valores são: Podemos (2,33%), PSC (3,87%), Pros (8,94%), PSL (2,51%) e Republicanos (4,58%), perfazendo um total de quase 22%, próximo do que a pesquisa apontou, 19%.
Contudo, se pegarmos partidos isoladamente, podemos fazer observações interessantes, tais como: o PSL, autoidentificado como de extrema-direita, fica atrás do Psol e do PT, se comparado com a esquerda, e atrás do PSC, se compararmos pela direita.
Se considerarmos os dois partidos mais votados, PDT e Pros, que são os partidos cujos candidatos disputarão o segundo turno, podemos falar de um nível de ideologização mais presente no segundo do que no primeiro, uma vez que este tem tamanha dimensão por ser o partido que governa a cidade.
Interessante notar, também, que o desempenho do PT no espectro da esquerda só está à frente do Psol, o que pode se modificar nas próximas eleições, e que o Republicanos se mostra em ascensão dentro da direita.
Ao que tudo indica, a pesquisa, de fato, capturou uma tendência do eleitorado da cidade de identificar-se mais com a direita (lembremos que há dois representantes desse segmento entre os cinco mais votados, incluindo aí o mais votado), mas não registrou a permanência, ainda, da sólida presença de um eleitorado de esquerda. Ao menos, a julgar pelo pequeno recorte aqui realizado.
Emanuel Freitas da Silva, professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece)