Por que nem Cid pode salvar a aliança entre PT e PDT
Henrique Araújo é jornalista e mestre em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Articulista e cronista do O POVO, escreve às quartas e sextas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades e editor-adjunto de Política.
Por que nem Cid pode salvar a aliança entre PT e PDT
A aliança entrou nesta semana num processo de autofagia explícito que, sob nenhum ângulo que se queira observar, é interessante politicamente nem para quem quer romper nem para quem deseja preservar
Há uma tese, em voga entre governistas mais esperançosos, que talvez superdimensione as capacidades do senador Cid Gomes (PDT) de estabelecer consensos, sobretudo num cenário como o de agora, de quase rompimento entre o seu partido e o PT do ex-governador Camilo Santana.
Cid está ausente, não apenas na última semana, mas pelo menos desde maio, quando fez sua última aparição pública. Essa lacuna, portanto, não é casual, mas deliberada. Para compreendê-la plenamente é preciso levar em conta o fato de que, sem ele como mediador, a aliança pode se desfazer. O senador sabe disso.
Logo, se o quadro se deteriorou a este ponto, não foi à revelia ou apesar dos comandos de Cid, mas porque o parlamentar consentiu que isso ocorresse. Seu silêncio autoimposto é um dado importante desse contexto no qual petistas e pedetistas, e estes entre si, vêm se engalfinhando, expurgando publicamente o que já era matéria de especulação e queda de braço interna.
A aliança entrou nesta semana num processo de autofagia explícito que, sob nenhum ângulo que se queira observar, é interessante politicamente nem para quem quer rompê-la nem para quem deseja preservá-la.
O episódio mais recente desse entrevero é também o mais grave: as declarações de Ciro Gomes, que colocam sob suspeita a lealdade de Camilo – e, mais que isso, sugerem que o (ainda?) aliado teria batido em retirada do grupo em troca de um cargo –, se situam num outro patamar nessa crise.
Não se trata mais de mera divergência ou de debate político respeitoso dentro dos marcos de uma composição que governa o Ceará desde 2006. O nível de animosidade contido aí é inédito, não apenas no processo de escolha do candidato do PDT, mas nas relações entre Camilo e Ciro.
A própria resposta de Camilo, sustentando suas posições pró-Izolda e defendendo sua integridade, representa um elemento também inusual na relação: em sua fala pública, o petista está ali, assim como a governadora havia feito antes ao questionar Ciro sobre a insuficiência das pesquisas como método decisório, confrontando a principal liderança do pedetismo no Ceará.
Daí a pergunta que alguns aliados se têm feito: Cid poderia pacificar o que está conflagrado e remediar essa fratura?
Há cenários a se analisar, mas todos obrigatoriamente têm de levar em consideração que, entre os dois polos em disputa neste momento, abriu-se uma fenda e se operou um distanciamento que nenhum voluntarismo é capaz de sanar.
Mesmo Cid, habituado a essas tensões, terá muita dificuldade para dirimir essas diferenças e acomodar interesses conflitantes que já começaram a se expressar sob a forma de ataques pessoais.
Nem uma candidatura do ex-governador ao Abolição, como os aliados têm aventado como forma de harmonizar o cenário, surtiria o efeito desejado. Pelo contrário, uma entrada de Cid na eleição seria, de longe, o movimento mais arriscado para os irmãos Ferreira Gomes no Ceará.
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