Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
Uma lista que faça constar só as ruas arborizadas da cidade (lacunar, infelizmente), outra com as fachadas de casas mais simpáticas
Comecei a escrever a sério sobre listas, e depois sobre listas de listas e assim sucessivamente. Mas, seja por que razão for, não fui além de trivialidades e mundanidades, essas pequenezas do dia a dia cujo exame não requer mais do que dois centavos de atenção.
Listas de melhores esquinas de Fortaleza, por exemplo, ou de cruzamentos mais agradáveis. Listas de itinerários de ônibus, de horas do dia, de dias de semana ou de meses do ano.
Listas de pratinhos e de pudins, de calçadas e de campos de futebol, de churrasquinhos e de venda de filmes piratas.
Uma lista que faça constar só as ruas arborizadas da cidade (lacunar, infelizmente), outra com as fachadas de casas mais simpáticas, uma lista com os personagens singularmente reconhecíveis da urbe.
Uma lista de bancos para namorar, de pastéis de vento, uma somente com os mercados que ofertam o preço mais palatável de verduras e outros alimentos da cesta básica.
Uma de bolos fofos, de carioquinhas e de pão de coco. Uma ainda de livrarias de rua (essa totalmente ficcional, inventada, projeção que embaralha o real e o virtual na elaboração de uma lista, deixando à mostra o tanto que há de arbitrário e necessariamente subjetivo em qualquer seleção do tipo).
Enfim, listas aos montes, sempre dessa natureza miúda, chã, comezinha. Listinhas de ninharias do cotidiano, listões de galardão esquecidos no guarda-roupa roído pelo bolor da solenidade e pela falta de rubor do intelecto empedernido.
Uma lista de paisagens sonoras tipicamente nativas, de fins de tarde, de placas de trânsito, de buracos espalhados pela metrópole e de semáforos danificados. Uma lista de avenidas (Perimetral, Godofredo, Carneiro de Mendonça), de terrenos baldios e de sombras mais generosas, ao lado das quais se abrigam fileiras de cearenses à espera de Godot.
Uma listagem de bares, de açaizeiros e de farmácias, de balanças de farmácia ainda funcionando, de farmácias cuja especialidade sejam os remédios e de quarteirões totalmente desassistidos de farmácias.
Uma lista de quiosques de cachorro-quente, de churros e de batatinha marinada no mesmo óleo que lubrificou blindados na 2ª Guerra Mundial.
Mais uma lista de nomes de lojas de roupa feminina e masculina e de "moda praia". Uma lista dos boxes campeoníssimos do Centro Fashion e das barracas "avant la lettre" das feiras de Messejana e Parangaba.
Uma lista de forrós das antigas cuja potência lírica ultrapasse as décadas, ombreando com o cânone ocidental (por que chora, Harold Bloom?). Uma lista de versões de músicas românticas internacionais cuja letra em português mandou às favas qualquer ideia de originalidade, fazendo Duchamp revirar-se na tumba.
Uma lista com as dez mais do Aviões e outra com o suprassumo dos DVDs gravados ao vivo, ainda que ninguém mais consuma música no formato DVD. Uma lista com as nomenclaturas das bandas: Painel de Controle, Brucelose...
Uma lista de esquetes do João Inácio Jr. e de casas de show que não existem mais, do Brisa do Lago ao Pau de Arara, do Jet Set ao Obá Obá. Uma lista dos terminais em ordem decrescente, das maiores festas do Gigantão da Zé Bastos entre os fins dos anos de 1980 e início dos 1990.
Listas, tão somente, confeccionadas com um tanto de defeitos e outro de predicados, resultando da combinação desequilibrada entre reconhecimento e expectativa narcísica, autoindulgência e mania de grandeza.
Política como cenário. Políticos como personagens. Jornalismo como palco. Na minha coluna tudo isso está em movimento. Acesse minha página
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