Hugo de Brito Machado Segundo é mestre e doutor em Direito. Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET) e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor da Faculdade de Direito da UFC e do Centro Universitário Christus. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.
Essa automaticidade reduzirá enormemente a sonegação. Se partirmos da premissa de que todos os contribuintes são sonegadores, e que a Fazenda nunca erra e está sempre imbuída dos melhores propósitos, a solução é perfeita
Foto: André Lima/Lide Ceará
MAURO Filho é o relator-geral do projeto que vai disciplinar a partilha dos recursos com a reforma tributária
Temos ouvido, nos debates em torno da reforma tributária, que uma de suas grandes vantagens será a simplicidade, decorrente da automaticidade. Não tanto porque leis serão mais claras e enxutas, ou fáceis de entender, mas porque “o sistema” fará todo o cálculo do tributo automaticamente. O contribuinte não precisará se preocupar.
Por meio do chamado split payment, quando uma venda for feita, no pix ou no cartão, o vendedor da mercadoria receberá, em sua conta, apenas o valor líquido da venda. Todo o valor dos tributos (IBS e CBS) será automaticamente descontado pelo sistema, e transferido ao Poder Público, sem interferência humana. Ótimo, não?
Essa automaticidade reduzirá enormemente a sonegação, isso é fato. Se partirmos da premissa de que todos os contribuintes são sonegadores, e que a Fazenda nunca erra e está sempre imbuída dos melhores propósitos, a solução é perfeita. Essa premissa está na cabeça de muita gente por trás da reforma, mas talvez não seja verdadeira.
Você sabia, leitora, que muitos contribuintes do IPVA pagam seu imposto pela cota única, com desconto, e depois, por esquecimento ou desorganização, como os vencimentos são diferentes, terminam pagando o mesmo IPVA em parcelas? E sabia que isso aparece no sistema da SEFAZ, que sabe dos recolhimentos em duplicidade, mas que a restituição só é feita, quando é feita, a quem a pede? Quem não percebe o erro não recebe a restituição, mas a Fazenda sabe que o recolhimento a maior ocorreu. Aparece “no sistema”. Isso é tão (ou mais) errado quanto receber um troco a maior, em uma compra com dinheiro em espécie, e não devolver a diferença, embolsando-a.
E o que isso tem a ver com a automaticidade de que se falava, que será no IBS e na CBS, não no IPVA? Tudo. Revela o modo como os direitos do contribuinte são tratados, muitas vezes, pelo Fisco Brasileiro, sempre que levam a uma menor arrecadação. E quem programará o “sistema” que fará tudo automaticamente, no recolhimento do IBS e da CBS? Esse mesmo Fisco que não devolve o troco dado a mais pelo contribuinte.
Deve-se dar mais atenção ao chamado “devido processo legal tecnológico”. Se máquinas vão, automaticamente, calcular e reter o imposto devido na operação, e posteriormente creditar para o contribuinte, já que o imposto é não cumulativo, os valores correspondentes ao imposto devido em operações anteriores, é indispensável que a sociedade civil, notadamente representantes de setores da economia afetados, participe ativamente da programação e da testagem do sistema, que deve ser transparente e compreensível.
Do contrário, de nada adiantará eleger deputados e senadores para aprovarem emendas constitucionais e leis para ditar como os tributos deverão ser calculados e cobrados: o sistema simplesmente não as seguirá. E depois nada poderá ser feito, pois “a culpa será do sistema”.
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