Jornalista e colunista de futebol feminino do Esportes do O POVO. Graduada em Jornalismo no Centro Universitário Sete de Setembro (Uni7). Já passou por assessorias de imprensa e foi repórter colaborativa da plataforma de notícias VAVEL Brasil
Jornalista e colunista de futebol feminino do Esportes do O POVO. Graduada em Jornalismo no Centro Universitário Sete de Setembro (Uni7). Já passou por assessorias de imprensa e foi repórter colaborativa da plataforma de notícias VAVEL Brasil
O final de semana de retorno do Brasileirão e de fases finais dos torneios estaduais foi marcado por uma agressão física. Então treinador da Desportiva Ferroviária-ES, Rafael Soriano acertou uma cabeçada no nariz da árbitra auxiliar Marcielly Netto após questionar algo aos gritos durante o intervalo do jogo diante do Nova Venécia, pelo Campeonato Capixaba.
Após a imagem da transmissão ao vivo viralizar, o treinador foi desligado da equipe, pegou gancho preventivo de 30 dias pelo Tribunal de Justiça Desportiva do Espírito Santo (TJD-ES) e fez até com que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos cobrasse à CBF por punição pelo ato.
A imagem choca e eu poderia dizer que, em parte, é pela audácia do agressor, que sabe que está sendo filmado e não se inibe. Entretanto, há muito mais por trás do ato. O que me abateu de tudo aquilo que li e ouvi sobre o momento foi a coragem com a qual ele "cresceu" ao dirigir a palavra à auxiliar. Claramente exaltado, sua linguagem corporal se exalta ainda mais ao se dirigir à Marcielly, pouco antes da cabeçada. Depois, mesmo quando foi punido pelo árbitro com expulsão, ele segue dirigindo maior ódio para a auxiliar.
Dentro do jornalismo esportivo, vivo muito disso. Quando entrei nesse barco, eu já sabia que jornalistas dessa área tinham tendência aos erros (já critiquei aos montes quando era apenas torcedora) e, por lidarmos com paixão, tinha conhecimento do quanto éramos expostos ao ódio. Mas ao vivenciar vi que há uma clara diferença no ódio que eu recebo, seja por e-mail ou por rede social, e que meus colegas recebem.
Não vou expô-los aqui, pois sinto que seria como deixar minhas cicatrizes falarem por mim — e sei que sou muito maior que elas. Mas deixo claro que já cheguei a temer pela minha segurança e das pessoas ao meu redor. Não pelo teor das mensagens, já que ódio direcionado pode render processo e O POVO assegura suporte aos seus empregados, mas pela insistência do ódio de alguns exclusivamente a minha pessoa beirar ao doentio.
Assim como Marcielly, eu vejo muito sangue e desprezo em alguns olhos e sei que não sou a única. E embora eu erre bastante, sei que muito desse sentimento é mais baseado no que eu sou e não no que eu produzo de bom e/ou de ruim. Sei também que muitos vão achar, assim como Rafael Soriano achou e falou após ser expulso, que nós falamos isso por "sermos mulheres", mas a verdade é que eu e muitas outras que conheço nos sentimos da mesma forma. Não falamos porque isso nos fragiliza e a última coisa que queremos é esse estigma, mas é muito diferente ser mulher nesse meio e não há caracteres que me faça conseguir expor isso de forma clara para homens, simplesmente pelo fato de que vocês não são nós.
Desde 2015 que produzo conteúdo sobre futebol na internet. Já trabalhei pagando do meu próprio bolso no início desta jornada e hoje eu já consigo fazer disso a minha vida e meu ganha-pão, mas, de lá para cá, ainda não passou 100% da sensação de que eu não sou bem-vinda nesse meio em alguns momentos. Essa cabeçada de Marcielly me fez relembrar exatamente isso. Embora ela não tenha sido em mim, doeu porque me fez perceber que nós, mulheres apaixonadas por futebol, ainda levamos cabeçadas todos os dias.
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