Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é mediadora de leituras, jornalista e professora. Realiza ações no âmbito da leitura, desde 2016, em Fortaleza e na Região Metropolitana. É especialista em Literatura e Semiótica pela Uece. Autora dos livros Pitaya e das obras experimentais Vitamina D, Querida Anne e Retalhos. Aos domingos, quinzenalmente, é possível ler as crônicas da Bel no Vida&Arte, caderno do O POVO
Quatro canecas, quatro copos de plástico, três pratos, duas bacias, uma xícara térmica, duas garrafas de água, um faqueiro com 48 peças, uma faca do chef, duas espátulas e uma colher de arroz. Esse foi o enxoval que montei em dezembro último - quando, mais uma vez, fiz o movimento de deixar a casa dos meus pais e passar a morar em um lugar "só meu". Já fiz isso tantas vezes que não tenho dedos para contar. E sempre é uma nova aventura…
As aspas do "só meu" são para sinalizar que o apartamento de 110 m² não é minha propriedade. É alugado. E esse fato sempre transmite um peso quando penso na quantidade de eletrodomésticos, móveis e utensílios que vão habitar aquelas paredes brancas comigo. Não devo ter em demasia, preciso encontrar o ponto exato da posse.
Não que o proprietário reclame da quantidade de facas que eu tenho, claro que não. Mas quem já encarou uma sucessão de mudanças de casa em pouco tempo vai entender o meu temor. Limpa tudo, encaixota tudo, coloca no carro, descarrega, desencaixota, limpa novamente, perde alguma coisa, esquece onde estão os potes.
Escolhi o mínimo possível de objetos e, mesmo assim, ainda parece muito. É surreal como nós, seres humanos, precisamos de pouco para viver dignamente - mas insistimos em um domínio desenfreado de coisas, coisas, coisas e mais coisas… O que estamos tentando esconder, preencher ou esquecer com tantos utensílios e compras?
Faz tempo que eu tento mudar: doei livros, roupas e sapatos. Fiz a chamada "faxina geral". E, para a nova casa, tomei a decisão de manter um número baixo de objetos. O mínimo viável para sobreviver com dignidade e segurança, como gosto de dizer. Foi tudo escolhido milimetricamente. Tábua de corte? Não preciso. Jarra de suco? Eu nem gosto de suco. Escorredor de louças? Detesto e não quero.
Poucos meses depois da mudança, entretanto, a casa começou a ficar meio triste - e eu também. As paredes refletem a clareza da falta. Deitada na sala de estar - sem sofá, sem poltrona e sem tapete - olhei para o teto imaculado. E foi quando entendi que existem duas dimensões: número mínimo de utensílios e falta de cor na vida. A primeira é palpável, a segunda é detestável.
Consigo viver bem com apenas três pratos - que, inclusive, foram brindes de uma rede de massas -, mas não admito a possibilidade de não ter paredes coloridas, roupa de cama extravagante, imãs de geladeira, panos de prato com mensagens bíblicas. Existir com um filtro preto e branco estava me deixando cabisbaixa… Já basta o filtro monotemático do instagram.
Coloquei cor em tudo! O azul, o vermelho e o amarelo do exterior refletiram na minha tez. E, agora, quando deito no chão da sala - ainda sem sofá, sem poltrona e sem tapete - estou abraçada com uma almofada belíssima cheia de fuxicos coloridos…
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