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O pior date do mundo
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Inquieta, porém calma. Isabel Costa, a Bel, é mediadora de leituras, jornalista e professora. Realiza ações no âmbito da leitura, desde 2016, em Fortaleza e na Região Metropolitana. É especialista em Literatura e Semiótica pela Uece. Autora dos livros Pitaya e das obras experimentais Vitamina D, Querida Anne e Retalhos. Aos domingos, quinzenalmente, é possível ler as crônicas da Bel no Vida&Arte, caderno do O POVO

O pior date do mundo

Tipo Crônica

Para quem não sabe: date é uma palavra de origem estrangeira que, em português, significa encontro. Aquele momento fortuito quando duas pessoas sentam para conversar, saborear uma refeição e olhar uma para a outra com cara de "e se…".

Tenho um péssimo histórico de dates. Da arma no porta-luvas do carro ao pneu furado; Da ida ao posto de saúde para vacinar bebê ao cara que queria visitar o túmulo da mãe. Sempre é uma aventura. Ou um desastre - depende do ponto de vista e do humor do leitor, óbvio.

Quando eu morava em Cascavel, Região Metropolitana de Fortaleza, os dates eram insuportavelmente horríveis. Todo interior cearense obedece um clichê maldito: o policial com a professora. Eu, docente que sou, tentava fugir dessa regra. Mas, com a superpopulação de agentes de segurança, nem sempre era possível. Policial penal, policial da guarda, policial militar, agente de trânsito…

O pior date de todos começa com um rapaz muito penteado indo me buscar na porta de casa. Eu tenho certa aversão aos clichês, mas, tudo bem, um date é uma oportunidade para tentar. E nós dois estávamos tentando.

Ele olhou para mim com uma risada quase infantil disfarçando o nervosismo: "Você conhece o Bar do Mano Brown? É um lugar ótimo, popular, regional. Faz a tua vibe, acho que você vai amar".

"Puta que pariu", pensei. "Esse idiota vai me levar lá no Bar do Maninho…", esbravejei internamente. No fim, o problema é que ele tinha razão demais. A tal "vibe" do estabelecimento combina muito comigo, pois é um dos lugares mais frequentados por mim e pela minha família. Meu irmão tem uma caderneta com conta aberta lá; meu pai entra na cozinha para beber café na garrafa da gerente. Ou seja, o date seria em uma sucursal da minha casa.

Chegando ao local, eu fiquei me escondendo dos garçons como se fosse possível não me reconhecerem. Logo chega um mestrim: "Ei, teu pai tá lá dentro".

Claro que eu não sou uma adolescente escondendo os namoradinhos do pai. Por ter 35 anos, essa fase foi vencida. Mas alguma bandeira vermelha estava sendo hasteada: isso não vai acabar bem!

O rapaz continuava penteado demais, banhado demais, queria agradar demais, bonzinho demais: "Quer um suco?"

O garçom, rabugento que só, apenas soltou um: "Ela não toma suco. Ela bebe água com gás". Você sabe que o bar é seu quando o garçom reconhece a tua bebida favorita.

De repente, vejo minha cunhada saindo desesperada da mesa. Logo depois, vem meu irmão apertando a chave do carro e meu pai alvoroçado. Levantei da mesa antes de tomar o primeiro gole: "O que foi? O que foi?"

A babá havia ligado e meu sobrinho caçula, após sofrer uma queda, estava banhado de sangue. O dono do bar gritando: "Vai logo, cuida". Saímos correndo. Entrei no carro e bati a porta. Minha cunhada chorando e meu irmão queimando todos os sinais de trânsito. Depois, soube que levou uma pancada de multas. Mas quem pode julgar o desespero de um pai?

Chegando lá, meu sobrinho estava lindo, saltitando, empolgado e ostentando um galo na cabeça com uma bolsa de gelo. Foi apenas uma pancada no lugar errado, um susto.

Toda vez que conto essa história para as amigas - na mesa do bar ou no horário do almoço - vem a mesma pergunta: "E o rapaz?".

Não sei, ué. Deve estar me esperando até agora com um copo de suco de maracujá na mão. Eu não disse para quem que o date foi ruim…

Foto do Isabel Costa

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