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Edifício São Pedro e o sonho de ser Copacabana Palace
Foto de Ítalo Coriolano
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É editor digital de Política do O POVO e apresentador do programa Jogo Político, interessado no mundo do poder, seus bastidores e reflexos sobre a sociedade. Entende a política como algo que precisa ser incorporado e discutido por todos. Já foi repórter de Política e também editor da rádio O POVO CBN.

Edifício São Pedro e o sonho de ser Copacabana Palace

Daqui até junho, andar por andar, tijolo por tijolo, testemunharemos com angústia indescritível a destruição não apenas de um prédio, mas de valores intangíveis, imensuráveis e, por consequência, insubstituíveis
Antigo Iracema Plaza Hotel, localizada na Praia de Iracema. Prédio foi inaugurado em 1951 e será demolido até junho deste ano (Foto: Biblioteca do IBGE)
Foto: Biblioteca do IBGE Antigo Iracema Plaza Hotel, localizada na Praia de Iracema. Prédio foi inaugurado em 1951 e será demolido até junho deste ano

Prédio à beira-mar com inspirações mediterrâneas, grandes janelas, balcões amplos, terraços com jardins: daqui a poucos meses, o que restou do Edifício São Pedro após décadas de abandono se transformará apenas em escombros e lembranças. A decisão do prefeito José Sarto (PDT) de demolir a estrutura gravemente comprometida coloca fim a uma queda de braço que se arrasta há anos. De um lado, os defensores da preservação de um importante patrimônio histórico da cidade, primeiro empreendimento na orla de Fortaleza com mais de um pavimento. Do outro, os proprietários que desejam dar outro destino ao terreno que ocupa lugar privilegiado na Praia de Iracema.

Ao mesmo tempo em que é preciso reconhecer que não há outra saída que não seja a demolição das ruínas - há riscos evidentes de desmoronamento -, é impossível fechar os olhos para a falta de apreço à nossa memória e para a ausência de um pensamento estratégico em relação à potencialidade que o São Pedro, onde já funcionou o badalado Iracema Plaza Hotel, possuía. Nossa elite econômica, que se deleita diante de construções antigas na Europa - fundamentais para a movimentação turística e fortalecimento da identidade de qualquer sociedade -, parece ter ojeriza quando elas se situam em sua terra natal. A sensação é de que por aqui, mais do que em qualquer lugar do mundo, "tudo que é sólido se desmancha no ar".

Preferem colocar no lugar um espigão espelhado de gosto duvidoso - para não chamar de brega -, que será apenas "o mais do mesmo", sem nenhum diferencial em relação aos muitos prédios e superprédios que formam o paredão grotesco do nosso litoral. Visão tacanha de que o novo e o moderno são sempre melhores, enterrando outras possibilidades, jogando fora um capital cultural que poderia, sim, gerar lucro e ser sustentável.

Afinal, quem não estaria disposto a pagar um preço mais salgado para conseguir acesso a uma estrutura sem paralelos na região? Ter uma experiência única. E aí não há como não traçar um paralelo com o Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, hotel mais antigo do que o São Pedro - completou 100 anos em 2023 - e que continua belo e suntuoso. Quem de lá cometeria a loucura de deixar aquela estrutura se deteriorar a ponto de não haver outra saída que não fosse a demolição de tudo?

É lamentável observar que optamos por um caminho diametralmente oposto. São Pedro e outras muitas estruturas que ajudaram a formar a Fortaleza de hoje não foram abraçadas da maneira devida e quando ainda era possível construir outros rumos. Daqui até junho, andar por andar, tijolo por tijolo, testemunharemos com angústia indescritível a destruição não apenas de um edifício, mas de valores intangíveis, imensuráveis e, por consequência, insubstituíveis. Resultado da complacência do poder público e da ignorância do poder privado. Venceu quem venera a pobreza estética e o "vil metal".

A marretadas, será solapado o prédio que um dia sonhou ser Copacabana Palace. Morre, assim, o pedaço de uma cidade que aprendemos a amar. Essa, aliás, parece ser a sina do alencarino: viver do saudosismo. "Adeus, adeus, só o nome ficou".

Foto do Ítalo Coriolano

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