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Olho bento
Foto de Izabel Gurgel
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Jornalista, leitora, professora. Criou e faz curadoria das séries A Cozinha do Tempo e Cidade Portátil, dentre outras atividades.

Olho bento

Tipo Crônica

Na saída, demos de cara com a coluna vermelha do Sérvulo Esmeraldo na calçada do prédio em frente. Antiga Rua do Pocinho, cinco e pouco, a luz da Cidade sendo o espanto que nos causa, o Centro se esvaziando, esvaindo-se feito o dia.

Subimos rumo à Praça do Ferreira. Viramos antes, à esquerda, em direção à Praça dos Voluntários. Para ver o portão branco, cercadura preta, do edifício inaugurado em 1980, esquina com a rua do Rosário. Aberto, o portão fica rente à parede em frente ao balcão da recepção. Obra do Sérvulo, do jardim por ele desejado e desenhado para a cidade. Olhamos devagar, para ver melhor a geometria do artista, feito onda, variando, como varia tudo que a gente bota o olho e morto não esteja.

Tem mais obra dele no Centro, você sabe. A escultura branca à frente do que foi a entrada da primeira sede do CCBNB. Imagine-a sem a grade que veio depois. E com o espelho d'água sendo o que o nome diz. Na mesma Floriano Peixoto, esquina com Pedro I, outro Sérvulo na praça. É dele a fonte na subida da Dr. João Moreira, a caminho do Passeio Público. Sumiu da paisagem outra obra com água, junto à sede do Dnocs, na Duque de Caxias. Invisível a do Parque das Esculturas, entre a Dom Manuel e a rua do restaurante Anna Purna, a Itapipoca. Ali tem um pé de castanhola tão bonito que dá vontade de morar na Vila Romero.

Na Major Facundo, um relevo do artista do Crato no Sobrado Dr. José Lourenço. Ao lado da parede revestida com foto do Jarbas Oliveira: do chão ao teto, uma imagem da Casa dos Milagres, Juazeiro do Norte. Na lista Sérvulo, incluo as fitas vermelhas, fixas e a girar, à entrada da ex-Bolsa de Valores, na Dom Manuel. Passei para rever ano passado e ela havia saído para restauro. Tem Sérvulo na sede d'O POVO, no antigo mangueiral das Doroteias, como me disse um morador da Barão de Aratanha, varrendo o ar com as mãos em direção à Aguanambi.

Fomos içados pela coluna de cubos do Sérvulo depois de descer do décimo primeiro andar do Palácio Progresso: o frescor das árvores da Praça dos Leões vista de cima, a risca do mar inscrita nos olhos. A gente no ateliê do Sérgio Gurgel. Mirador. A nos lembrar que somos ficções, no sentido de feitura, forja, fabulação, fabrico do tempo, nas dobras do tempo. Jorge Luis Borges disse que bastam dois espelhos, um frente ao outro, e já temos um labirinto. Sérgio tem vários no ateliê. Pinta sobre a superfície dos espelhos, torna-os em parte vazados, se o tempo já não o fez antes. Chega a atravessá-los, com projeção de imagens. Clarice dizia que era preciso treino, todo um aprendizado, para olhar um espelho e não ver só o que ele refletia. Vou voltar mais vezes, Sérgio. Os territórios não cabem nos mapas.

Foto do Izabel Gurgel

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