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O melhor do Carnaval é o sobejo
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Jáder Santana é jornalista e mestre em Estudos da Tradução pela Universidade Federal do Ceará

O melhor do Carnaval é o sobejo

Para os não carnavalescos, o ponto alto da festa são os memes que abundam nas folias e se multiplicam pelas redes sociais
Tipo Análise
Último dia de Carnaval na praça da Gentilândia, no Bairro Bemfica (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Último dia de Carnaval na praça da Gentilândia, no Bairro Bemfica

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Se há no Brasil uma indústria que, de tão intensa, chega a subverter a intensidade da lógica capitalista, é a dos memes. E não há época do ano mais propícia para o impulsionamento dessa produção que o Carnaval. Passam-se os dias de pré, de festa e de pós, vão-se as intermináveis horas de ressaca, as gastrites, os enjoos, dissipa-se o aborrecimento pelo retorno ao trabalho, pelo saldo negativo na conta bancária, pelas pequenas infidelidades conjugais, mas os memes, eles permanecem.

E é por meio deles que os pouco afeitos à folia ficam conhecendo os pontos altos da farra carnavalesca. Foram os memes, esse sobejo da anarquia festiva, que me impediram de ficar totalmente alheio ao Carnaval de 2024. Do macete que se firmou, durante cinco dias, como razão de ser de toda uma nação às previsões alucinadas de uma ex-alucinada da tropicália sobre o fim do mundo, são os memes que melhor traduzem a realidade desvairada dos dias de festa.

Materializou-se em meme, com rapidez de feitiço na era digital, a Hilux levada pelo mar em Jericoacoara: "Garantindo um ano incrível com uma oferenda para Iemanjá. Axé!" Em Aracati, uma foliã-empreendedora (ou empreendedora-foliã) saiu pelas ruas com um carregamento de desodorantes, cobrando módicos R$1,99 para reestabelecer o equilíbrio dos odores axilares. Até a chuva do sábado, hiperbolicamente carnavalesca, rendeu meme: "A atração mais esperada do Carnaval de Fortaleza chegou: a chuva!"

Mas nem só de novos hits vive um Carnaval. Os memes de velhas folias são resgatados — sob a forma de fantasia ou simples menção — e acabam engrossando esse caldo caótico de desordem festiva. De repente, retorna ao Olimpo de onde nunca devia ter saído o vídeo dos dois rapazes entrevistados na rodoviária de Fortaleza, retornando do Carnaval de Aracati, um deles com marcas arroxeadas por toda a lateral do pescoço. Exibindo ao repórter sorrisinhos desconcertados, comentam: "Foi bom. Inesquecível. Foi ótimo. Vai ficar marcado na nossa história".

Para os que preferiram escapar da folia e se refugiar em livros, filmes, plantas ou preces, dar de cara com essa profusão de memes é como experimentar, pelo sobejo da festa, um pouco dessa alegria que, por alguns dias, parece infinita. Para os que se incorporaram à folia, o meme vem atado a recordações de glitter e suor. O Carnaval nos abastece, nos revigora e nos garante, a cada ano, um novo acervo de piadas e histórias, nossas e alheias, que nos ajudam a atravessar a modorra dos outros dias.

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