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Apropriação por IA: como artistas e quadrinistas estão sendo ameaçados
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Jansen Lucas é coordenador de criação no O POVO, publicitário, designer e artista visual. Dedica-se a escrever sobre cultura com foco em produções de quadrinhos, cinema e literatura, explorando as conexões entre arte, narrativa e mídia em seus trabalhos

Jansen Lucas arte e cultura

Apropriação por IA: como artistas e quadrinistas estão sendo ameaçados

O uso da IA na substituição de profissionais não é exclusividade do universo artístico. Há tempos o debate atinge áreas como jornalismo, publicidade, literatura e até a medicina
Tipo Análise
Miniatura coluna Jansen - Inteligência artificial (Foto: Carol Ito/Divulgação)
Foto: Carol Ito/Divulgação Miniatura coluna Jansen - Inteligência artificial

Desde que foi lançado ao público em 2022, o Midjourney — ferramenta de inteligência artificial (IA) que cria imagens a partir de descrições em texto — tem gerado discussões intensas sobre ética e apropriação artística.

Seu funcionamento se baseia no uso massivo de obras de milhares de artistas, sem qualquer tipo de autorização, reconhecimento ou remuneração. Em outras palavras, a IA se apropria de estilos e técnicas desenvolvidos ao longo de anos por diversos artistas, como se fossem de domínio público, apagando totalmente.

O mais recente modismo nas redes sociais ilustra bem esse cenário: reimaginar fotos pessoais, cenas históricas ou trechos de filmes como se tivessem sido criados pelos Estúdios Ghibli — aclamada produtora japonesa de animação liderada pelo mestre Hayao Miyazaki, que, ironicamente, já se manifestou veementemente contra o uso de inteligência artificial em processos criativos. Considerando o uso da mesma uma ofensa à arte e à vida em si. Algo que ocorreu em um tempo em que a IA ainda não era uma grande ameaça para a classe artística. Mas essa ameaça deixou de ser hipotética.

O uso da IA na substituição de profissionais não é exclusividade do universo artístico. Há tempos o debate atinge áreas como jornalismo, publicidade, literatura e até a medicina. A precarização do trabalho não é um fenômeno novo. O que muda agora é a velocidade com que isso ocorre, e quem é atingido primeiro.

E o mundo dos quadrinhos, das tirinhas, da ilustração autoral — um campo historicamente marginalizado e financeiramente instável — está entre os primeiros a sofrer perdas concretas com o avanço dessas ferramentas. Na primeira oportunidade, até mesmo gigantes como a Disney recorreram a esse tipo de recurso. Um exemplo disso é a abertura da série “Invasão Secreta”, lançada no Disney+, que foi inteiramente gerada por inteligência artificial.

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Mas não são só as grandes empresas que adotaram esse “atalho”. No dia a dia das redes, vemos crescer o número de “tirinhas” e cartuns criados por IA — publicações feitas por psicólogos, nutricionistas, dentistas e outros profissionais, alguns com mais de cem mil seguidores, e que se apropriam da linguagem visual dos quadrinhos para ilustrar seus conteúdos de forma lúdica, barata e impessoal.

O quadrinista Paulo Moreira (@paulomoreirap) sintetizou bem essa frustração em uma de suas tirinhas recentes: “Se o Estúdio Ghibli ninguém respeita mais, imagine eu, que sou um ‘ninguém’". A frase é dura, mas realista. Afinal, se nem mestres como Miyazaki ou Mauricio de Sousa — criador da Turma da Mônica — escapam do roubo de estilo por parte das IAs, o que sobra para os demais?

A quadrinista Carol Ito (@carolito.hq) já alertava para esse problema antes mesmo do atual “boom” nas redes. Em artes publicadas há cerca de um ano no perfil do @mobiletimeoficial, ela abordava como anos de estudo e dedicação podem ser resumidos, distorcidos e reaproveitados em segundos, sem qualquer crédito ao criador original pelas IAs. Um apagamento cruel, disfarçado de tecnologia acessível.

Se essa apropriação não for encarada com seriedade e responsabilidade, o impacto será ainda mais profundo. O que hoje começa com ilustradores e quadrinistas pode amanhã atingir designers, fotógrafos, jornalistas e tantos outros trabalhadores criativos. Como eu. Como você, leitor. Profissionais tratados como peças descartáveis em um tabuleiro onde o lucro pesa mais que a ética. E a impessoalidade é mais valiosa do que a arte.

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