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Índios Cariri trazem etnia no RG
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Redator do blog e coluna homônimos, diretor de Jornalismo da Rádio O POVO/CBN e CBN Cariri, âncora do programa O POVO no Rádio e editor-geral do Anuário do Ceará

Índios Cariri trazem etnia no RG

Os índios Cariri, comunidade do Sítio Poço Dantas, no Crato (CE), ainda não ingressaram com processo na Fundação Nacional do Índio (Funai) e os primeiros estudos acadêmicos foram a tese do professor Patrício Melo, segundo ele, ex-reitor da Universidade Regional do Cariri (Urca)
Dona Rosa Cariri, da Comunidade Sitio Poço Dantas (Foto: PATRÍCIO MELO)
Foto: PATRÍCIO MELO Dona Rosa Cariri, da Comunidade Sitio Poço Dantas

Crato (CE) - Os índios Cariri, comunidade do Sítio Poço Dantas, no Crato (CE), ainda não ingressaram com processo na Fundação Nacional do Índio (Funai) e os primeiros estudos acadêmicos foram a tese do professor Patrício Melo, ex-reitor da Universidade Regional do Cariri (Urca). Outros estudos estão sendo feitos, mas a comunidades está se organizando com mais cuidado agora. "O curioso é que os membros da comunidade têm o sobrenome Cariri no RG. "Isso é raro em outras etnias que buscam o reconhecimento do Estado", diz Patrício. Ele assina o paper a seguir:

ÍNDIOS CARIRI DO SÍTIO POÇO DANTAS, CRATO

Prof. Dr. José Patrício Pereira Melo

No Sitio Poço Dantas, distante 12 km da sede do Município do Crato, identificamos uma comunidade remanescente indígena da etnia Kariri que habitou o Cariri, especialmente o Crato, em 1741, na missão do Miranda, berço da criação da cidade. Estes dados estão expostos na tese de doutoramento realizada na PUC PR, nas origens da pesquisa estão os dados do Ministério da Saúde que, em 2010, registraram a presença de 118 índios “Kariri” no Ceará. Em 2013 a Secretaria Especial de Saúde Indígena mostrou que esse número aumentou para 123 indivíduos, e em 2014 os profissionais de saúde cadastraram 159 índios Kariri autodeclarados no Ceará.

Um lapso temporal de mais de 200 anos desde 1780, data da expulsão dos Kariri das terras da missão do Miranda, em Crato, marcam o retorno dessa população à luta pública pelo reconhecimento de suas identidades. Este renascer dos povos indígenas no Cariri despertados pela confirmação de que o povo Kariri ainda vive no Cariri, registrada nesta pesquisa em 2017, resultam no reconhecimento de sua identidade étnica a partir da autoafirmação (Convenção 169 da OIT), a memória coletiva dos povos, expresso em seus costumes, modo de vida, organização social e pelo Direito Socioambiental, a partir das normas de proteção à identidade indígena e direitos correlatos, Art. 231 e 232 da CF; de igual forma denota o longo período de esquecimento e abandono a que esta etnia esteve submetida, desde a colonização, perfil semelhante ocorre em outras regiões do Brasil e América Latina.

Em geral, os dados do censo brasileiro de 2010, como descrito no Quadro 01, a seguir, demonstram um percentual ainda baixo de indígenas. Se compararmos com outros países da América Latina, como a Bolívia, por exemplo, que tem mais de 55% de sua população indígena. Quanto ao percentual de índios Kariri é menor ainda se comparado aos números do Ceará e deste com relação aos dados do Brasil:

Tamanho da população Kariri ante a população do Ceará e do Brasil
Tamanho da população Kariri ante a população do Ceará e do Brasil (Foto: REPRODUÇÃO)


As populações indígenas no Ceará, em 2008, foram contabilizadas em 20 etnias conhecidas e divulgadas por ocasião da XIV Assembleia Estadual dos Povos Indígenas do Ceará, dentre as quais: Tremembé, já homologada a demarcação de terras no município de Acaraú; Pitaguary, em processo de demarcação nos municípios de Maracanaú e Pacatuba. E em estudos preliminares pela FUNAI, os Tremembé, nos municípios de Acaraú e Itapipoca; Potyguara, Tabajara, Gavião e Tubiba/Tapuia, nos municípios de Monsenhor Tabosa e Tamboril. Em situação de identificadas estão: Jenipapo Kanidé, no município de Aquiraz e Tremembé, no município de Itarema.

Os Kariri (Tapuya-Kariri), do município de São Benedito; os Kariri, do município de Crateús, estimados em 116 pessoas (34 famílias e 29 casas) estão sem reconhecimento pelo Estado. O Censo do IBGE, que trouxe a quantidade de índios autodeclarados em 2010, mostra para o Cariri uma quantidade expressiva de indivíduos indígenas quando comparada aos números de etnias mapeadas no Ceará. Nos municípios que compreendem a Região Metropolitana do Cariri e o Cariri, como região administrativa de planejamento do Ceará, 760 pessoas se declararam índios, conforme podemos observar no Quadro 02, a seguir.
Proporcionalmente 4 vezes menor 7 do que a porcentagem nacional que é de 0,4% o número de
indígenas autodeclarados, em relação à população brasileira.

Quantidade de índios autoidentificados no Cariri e Região Metropolitana
Quantidade de índios autoidentificados no Cariri e Região Metropolitana (Foto: REPRODUÇÃO)

Nesta pesquisa, os resultados, informações, dados e análises confirmam a identidade do grupo social Comunidade Sítio Poço Dantas, no Distrito de Monte Alverne em Crato, como índios da etnia Kariri/Cariri. O perfil socioeconômico e as condições de vida dessa população, aproximadamente 26 famílias, é bastante precário, em sua maioria, moram em casas próprias, mas em pequenos lotes, resultado de desapropriação para a construção do cinturão das águas, projeto que se integra ao projeto de interligação do Nordeste setentrional à bacia do Rio São Francisco.

Muito da cultura ancestral dos antigos Kariri se perdeu ao longo do tempo e os índios de agora são mestiços, mas guardam consigo a cultura ancestral de trabalhar a agricultura de subsistência, a caça, o artesanato, os hábitos alimentares, danças, usos e costumes. No território do entorno, podem-se ver pinturas rupestres, ao lado, de antigos moradores indígenas da região, no abrigo de Santa Fé, sítio arqueológico que está sendo preparado para visitação público e estudos da arqueologia social inclusiva em colaboração Hotel Iu-á (que adquiriu a propriedade do imóvel), Geopark Araripe Mundial da UNESCO, Fundação Casa Grande e URCA.

Foram observadas reivindicações da comunidade do sítio Poço Dantas durante a realização da pesquisa, são elas: a) apoiar a formação jurídica da associação dos Cariri – para lutar por seus direitos; b) instalar água para consumo humano e higiene; c) instalar uma escola indígena na comunidade e ajudar na identificação da comunidade pela FUNAI, como descendentes dos Kariri, da missão do Miranda.

Mas, para quem já esteve invisível tanto tempo, a paciência é um aliado, os Kariri do Sitio Poço Dantas, para que todos saibam, tem seu nome “Cariri”, registrado em cartório, uma prova a mais de sua ancestralidade.
A UNESCO incluiu, em sua recente avaliação com Selo Verde (2019) do Geopark Araripe, a recomendação para que as comunidades originárias, como essa, devem ser apoiadas e sua atuação reconhecida, obrigação que – aliás, é de todos os caririenses.

 

 

Cacique Cariri, da Comunidade Sitio Poço Dantas
Cacique Cariri, da Comunidade Sitio Poço Dantas (Foto: PATRÍCIO MELO)

Patrício Melo e Dona Ana Cariri: ela fala sobre o mito das Caboclinhas
Patrício Melo e Dona Ana Cariri: ela fala sobre o mito das Caboclinhas (Foto: DIVULGAÇÃO)

 

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