Joelma Leal assume como ombudsman do O POVO no mandato 2023/2024. É jornalista e especialista em Marketing. Atuou como editora-executiva de sete edições do Anuário do Ceará, esteve à frente da coluna Layout por 12 anos e foi responsável pela assessoria de comunicação do Grupo, durante 11 anos.
Gabriela Biló é a mesma fotógrafa que não há muito tempo era classificada como "um dos mais importantes nomes no fotojornalismo de política em Brasília" e elogiada por famosas imagens, que ganharam páginas e compartilhamentos
Foto: Reprodução
capa do jornal Folha de S. Paulo desta quinta-feira, 19
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O presidente Lula sorrindo, ajustando a gravata e um vidro estilhaçado próximo ao lado esquerdo do peito. À primeira vista, parece ser, sim, o instante decisivo (defendido pelo fotojornalista Cartier-Bresson e tão lembrado em aulas de fotojornalismo), porém o material publicado é resultado de uma técnica de múltipla exposição.
Resistência, resiliência, força, presidente blindado, reconstrução ou violência e incitação ao crime. A foto publicada na capa da edição da última quinta-feira, 19, da Folha de S. Paulo suscitou diferentes interpretações e uma série de manifestações negativas para a Folha e para a autora da imagem, a fotojornalista Gabriela Biló.
No mesmo dia, diante da repercussão, a Folha publicou matéria e vídeos da profissional, explicando a técnica escolhida. "A técnica de múltipla exposição é vastamente usada no fotojornalismo e existe desde o analógico. Ela consiste em um, dois ou mais cliques que sobrepõem imagens em um mesmo fotograma, sem edições no pós: tudo feito no olho, na câmera. Apontei a câmera para os trincos do Palácio e depois para o presidente que estava no andar de baixo. Esperei. Esperei por uma expressão que simbolizasse aquilo que eu estava lendo: o Palácio resiste. O presidente ajeitou a gravata e fiz o segundo clique. Duas realidades, separadas por cerca de 30 metros, mas que já existiam no simbolismo que o fotojornalismo permite, se juntaram na minha câmera", traz um trecho da matéria.
Nas redes sociais, os retornos e ataques também não foram poucos. Aliás, o tribunal das redes sociais é impiedoso. De fato, o uso da técnica não é inovador, mas questionável, quando se trata de hard news. O uso é mais comum em coberturas esportivas, até. A decisão de usá-la é editorial e coletiva.
Um pré-requisito para usar o recurso é informar que o procedimento foi utilizado e isso foi feito. A legenda informa: "Foto feita com técnica de múltipla exposição mostra o presidente Lula e vidro avariado após ataques do dia 8 de janeiro". O leitor foi informado.
De heroína à golpista
Pois é, Biló é a mesma fotógrafa que não há muito tempo era classificada como "um dos mais importantes nomes no fotojornalismo de política em Brasília" e elogiada por famosas imagens, que ganharam páginas e compartilhamentos. Basta uma rápida pesquisa na internet e é fácil localizar. Exemplos: Eduardo Pazuello com a máscara mal colocada, durante depoimento na CPI da Covid-19; Jair Bolsonaro simulando uma arma com as mãos em direção a Sergio Moro; Bolsonaro tossindo com o olho revirado, mais lembrando um exorcismo; e por aí vai. Agora, ela é a vilã.
A Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República se manifestou: "É lamentável que o jornal Folha de S.Paulo tenha produzido e veiculado uma imagem não jornalística sugerindo violência contra o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no contexto dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro. Trata-se de uma montagem, por não retratar nenhum momento que tenha acontecido."
Decisão editorial
Sobre a polêmica, conversei com profissionais do O POVO. "A fotografia sempre foi reflexo de quem a fez, nela o fotógrafo coloca seu conhecimento, sua visão de mundo, seu enquadramento, sua opinião. No fotojornalismo não é diferente, porém, o que deve nortear o profissional é, acima de tudo, a ética. E essa ética, é o que acho que tenha faltado à fotógrafa que fez a montagem na foto do Lula. Se a vidraça trincada estivesse lá no mesmo fotograma em que é enquadrado o presidente, perfeito, seria foto de prêmio, mas como foi feita tira a credibilidade no trabalho e na fotógrafa. Errou ela, errou o veículo e erra quem normaliza o fato ocorrido, mas o fotojornalismo vai sobreviver e continuar tendo sua importância na informação e no registro histórico, independentemente da falta de ética de alguns", afirma o premiado fotojornalista Fabio Lima.
O editor-adjunto do núcleo Audiovisual, Demitri Túlio, atesta: "A foto montada - ou o nome bonito que se usa para se denominar uma montagem fotográfica - cabe como instalação, arte em algum espaço ou afins. Não é fotojornalismo. Além disso, não cabe a discussão besta ideologizada. A foto clássica da espada na ex-presidente Dilma já se repetiu 300 vezes e virou clichê dos fotógrafos do dia a dia, mas não há montagem. É um ângulo escolhido, está no fotojornalismo. O Bolsonaro e o Trump tiveram fotomontagens, em vários jornais, com o bigode do Hitler e estampadas nas primeiras páginas de vários jornais, mas isso não é fotojornalismo. E, lógico, o jornalismo, o fotojornalismo, a fotomontagem e arte estão cheios de intenções".
Penso que há alguns pontos em questão: supondo que a imagem trouxesse Bolsonaro em vez de Lula como protagonista da fotomontagem, o caso teria gerado tamanha comoção? Acredito que não. Isso justifica o ataque e as ameaças à profissional e sua família? Não! O fato é que a escolha da imagem é consequência de uma decisão editorial, repito. Não há certo e errado, apenas. A interpretação é livre.
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