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Constituição, uma promessa reafirmada
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Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor

Constituição, uma promessa reafirmada

Como projeto de futuro, uma constituição é, por definição, um instrumento de idealização. Ela não descreve o que somos, ela estabelece o que gostaríamos de ser
Tipo Opinião

A constituição federal completou durante a semana os seus 35 anos de existência. Promulgada em 1988, depois de mais de 18 meses de debates constituintes, com participação ampla e disputas ferrenhas em torno de projetos e valores, é uma constituição íntegra, muito bem feita, boa o suficiente para sobreviver aos ciclos de crise que caracterizam a nossa sociedade. Neste mês de merecidas comemorações, uma reflexão vale: o que é uma constituição boa e qual a importância de uma constituição para a vida nossa de cada dia?

Como projeto de futuro, uma constituição é, por definição, um instrumento de idealização. Ela não descreve o que somos, ela estabelece o que gostaríamos de ser. É, por assim dizer, um instrumento de afirmação permanente de escolhas coletivas, um detalhamento de direitos fundamentais, a arquitetura de um aparato institucional, um conjunto de aspirações que necessitam de muito esforço para que se tornem realidade.

Mais do que um documento, a constituição é processo, é vir-a-ser. Há duas etapas que se sucedem na história constitucional: o momento constituinte, o episódio de promulgação do documento em 1988, e a prática constitucional diária, o exercício cotidiano de sua interpretação, as tensões e as crises que marcam seu tempo de vida.

Uma constituição nunca está dada e acabada, porque ela é um projeto em permanente atualização e interpretação. Todos nós, assim como as instituições, temos um compromisso: o de reafirmar a promessa de seu texto, o de trabalhar pelo seu aperfeiçoamento.

Uma constituição é boa quando ela estabelece as bases de um ambiente político e institucional estável o bastante para neutralizar iniciativas destrutivas e antidemocráticas, quando, diante de uma realidade brutalmente distinta daquela idealizada, assegura aos que têm os seus direitos violados os instrumentos para a busca de sua efetivação. Por isso a constituição é uma arma de justiça, é nela que encontramos os fundamentos e os instrumentos para denunciar as violações e buscar sua reparação.

Extensa, prolixa, nossa constituição cuidou de disciplinar os mais variados aspectos de nossa vida social. Estou entre os que veem nisso uma qualidade, não um defeito: numa sociedade tão perversamente desigual, em que a política oficial é colonizada permanentemente pelos interesses privados e econômicos, é indispensável que haja, no texto constituinte, a definição clara de nosso projeto quanto à educação, à economia, o meio ambiente, a saúde, só para citar alguns de seus temas.

O horizonte que vivemos é de conflagração social e polarização extremada entre visões de mundo radicalmente diferentes, que se refletem na batalha entre os poderes republicanos. Mais do que nunca, nossa carta magna será colocada à prova, disputada entre aqueles que se veem como legítimos intérpretes de seu conteúdo.

Como cidadãos, cabe a nós mais do que testemunhar essa disputa, porque podemos fazer parte dela, assumindo posição, tornando o projeto constitucional parte de nossa moralidade pública e privada. Só assim uma constituição resiste ao oportunismo de políticos mal intencionados: quando ela se cristaliza na alma e na prática de seu povo.

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