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Marina Silva, as mulheres e o futuro
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Juliana Diniz é doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC). É editora do site bemdito.jor

Marina Silva, as mulheres e o futuro

Respeitada, íntegra, coerente com suas pautas e com seu ofício, a ministra não baixou a cabeça e, em tom adequado, deixou muito claro que não há nenhum homem na República que tenha legitimidade para dizer a uma mulher qual é o seu lugar.
Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) recebeu a ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, para discutir com os senadores a possível criação de uma unidade de conservação marinha na Região Norte (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
Foto: Geraldo Magela/Agência Senado Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) recebeu a ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, para discutir com os senadores a possível criação de uma unidade de conservação marinha na Região Norte

Acredito que os leitores acompanharam o triste episódio de violência sofrido pela ministra do meio ambiente Marina Silva na última terça-feira. Convidada para participar de uma audiência pública na Comissão de Infraestrutura no Senado Federal, a ministra foi alvo de ataques desferidos pelos senadores Omar Aziz (PSD/AM), Marcos Rogério (PL/RO) e Plínio Valério (PSDB/AM). Entre outros abusos, Marcos Rogério disse para a ministra se "manter no seu lugar", enquanto Valério afirmou que ela não merecia respeito. Lembro que Valério já havia se tornado notícia há meses quando afirmou ter vontade de enforcar Marina Silva.

Qualquer observador da política que tenha um mínimo de boa fé percebe que as mulheres que desempenham atividades na arena da política partidária, ocupando cargos no Executivo ou no Parlamento, estão mais vulneráveis a se tornar alvo de violência. Ela se manifesta de várias formas, inclusive através da falta de moderação e decoro no uso das palavras em contextos de debate.

É mais fácil ofender uma mulher porque há uma permissividade social imensa com a prática - basta constatar o que aconteceu após o episódio. Salvo manifestações da imprensa, de intelectuais e ativistas e de manifestações de solidariedade de alguns políticos, não houve nenhum movimento do próprio governo de que a ministra faz parte ou mesmo do Senado Federal - o presidente da casa, um conhecido antagonista de Marina Silva, deu de ombros, um salvo conduto para o vale-tudo que se observa quando o alvo é uma mulher.

A ministra é uma política cuja autoridade moral e técnica está muito além da baixeza de quem a ofendeu. Respeitada, íntegra, coerente com suas pautas e com seu ofício, Marina Silva não baixou a cabeça e, em tom adequado, deixou muito claro que não há nenhum homem na República que tenha legitimidade para dizer a uma mulher qual é o seu lugar.

O episódio deve chamar nossa atenção não só para a questão de gênero, que é muito importante, mas para o que ele revela de disputa política sobre uma visão de desenvolvimento econômico. Não à toa, todos os parlamentares envolvidos representam estados do Norte do país. Há, no Brasil de hoje, uma franca oposição entre uma visão de desenvolvimentismo mais atrasada, alheia à questão ambiental, e uma visão preocupada com uma governança séria que garanta sustentabilidade para o futuro. O debate que Marina Silva chegou para travar foi esse: que tipo de futuro pretendemos? Qual é nossa prioridade?

A política oficial continua sendo um lugar muito hostil para as mulheres e as minorias. Não podemos tolerar, pois, enquanto permanecer assim, estaremos reféns de um debate político pobre, mal intencionado e sem compromisso com os reais interesses do país.

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