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Empreendedorismo feminino: da solução para a pobreza ao endividamento feminino
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É doutora em Educação pela UFC. Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro

Kalina Gondim comportamento

Empreendedorismo feminino: da solução para a pobreza ao endividamento feminino

Os bancos, em sua feroz sede por lucros, lançam linhas de crédito voltadas para as mulheres empreendedoras que veem com isso uma grande oportunidade de angariar dinheiro.
Tipo Análise
Empreendedorismo feminino e marcas de empoderamento podem mascarar outra realidade da pobreza feminina baseada na ausência de políticas públicas (Foto: @FREEPIK)
Foto: @FREEPIK Empreendedorismo feminino e marcas de empoderamento podem mascarar outra realidade da pobreza feminina baseada na ausência de políticas públicas

 

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Em abril do ano passado, a revista Forbes trouxe, em sua capa, a manchete intitulada “Mulheres de sucesso”. Nessa edição, estava um elenco de personalidades femininas que se destacaram em suas áreas.

As imagens e os textos trazidos no periódico ressoavam sucesso econômico e realização pessoal, no entanto, a imagem feminina exposta na revista contrasta frontalmente com o diagnóstico formulado pela ONU que aponta para a existência de uma sobrerrepresentação feminina no contingente da pobreza. A profusão de imagens e, principalmente, a sobreposição destas à realidade é a principal característica descrita pelo francês Guy Debort em sua obra “A sociedade do espetáculo”. Nessa sociedade, o espetáculo passa a mediar as relações humanas, e a aparência sufoca e destrona a essência dos fenômenos. Com o empreendedorismo não é diferente.

O mundo fictício exalado na edição da Forbes joga, para debaixo do tapete, a realidade de que o empreendedorismo feminino, salvo rara exceções, é sinônimo de desemprego disfarçado, ausência de direitos trabalhistas, previdenciários e falta de previsibilidade de renda. Segundo a Conferência Nacional do Comércio (CNC), em fevereiro deste ano, quase 80% das mulheres brasileiras estavam endividadas, o mesmo estudo afirmou que mulheres têm mais dívidas que os homens.

É sabido também que 48% dos lares brasileiros são chefiados por mulheres que, por sua vez, são maioria entre os desempregados. A realidade feminina esquadrinhada em diferentes indicadores desnuda as causas do boom empreendedor entre as mulheres. Diante do cenário desanimador e da sobrecarga de responsabilidades, as mulheres são forçadamente lançadas a gerar renda na maioria das vezes de forma improvisada e sem conhecimento técnico algum.

O mito do empreendedorismo se enlaça perfeitamente ao discurso do empoderamento feminino de cariz neoliberal, alicerçado nos argumentos individualistas, competitivos e meritocráticos. Desde o início da crise econômica mundial, a tríade formada pela ONU, Banco Mundial e FMI defendem ardorosamente o empreendedorismo como medida de enfrentamento à pobreza feminina. Ao passo que desestimulam a formulação e implementação de políticas públicas por parte do Estado.

Os bancos, em sua feroz sede por lucros, lançam linhas de crédito voltadas para as mulheres empreendedoras que veem com isso uma grande oportunidade de angariar dinheiro. Estados, organismos internacionais e os bancos parecem crer, de forma inabalável, nos superpoderes da arte de empreender. Nesse jogo, as mulheres quase sempre acabam estranguladas pelo endividamento e os bancos, por sua vez, não conhecem tempo ruim e exibiram lucros de R$ 96,2 bilhões só no ano passado.

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