Logo O POVO+
"Toma um café com elas, Lula!"
Foto de Kalina Gondim
clique para exibir bio do colunista

É doutora em Educação pela UFC. Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro

Kalina Gondim comportamento

"Toma um café com elas, Lula!"

Uma reflexão sobre a polêmica em torno de uma mulher negra para a vaga de Rosa Wber no STF
Tipo Opinião
Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF) (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF)

.

A notícia da aposentadoria da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber que completará 75 anos no início de outubro desencadeou uma corrida pela busca sucessores que podem ser indicados pelo presidente Lula à vaga da ministra. Na profusão de nomes, destaca-se o movimento em torno da defesa de uma mulher negra. A campanha foi contemplada com um anúncio na Times Square, em Nova Iorque; além de estar envolvida na celeuma entre Gregório Duvivier e parte da esquerda, isso porque o humorista escreveu, em sua rede social, um convite ao presidente Lula em que soltou a provocação: “toma um café com elas, Lula!”.

Um indicador da qualidade da democracia de um país é a distribuição equânime dos cargos de poder. Nesse quesito, o Brasil demonstra muita fragilidade. O jurista Daniel Sarmento esclarece que, na composição da assembleia constituinte responsável pela promulgação da Constituição de 1988, a lei mais importante do país, as mulheres eram 4,6% do total dos congressistas, negros ou mulatos contavam com 2% e não havia nenhum indígena.

Em contrapartida, os homens somavam 95,4% e as pessoas brancas 98%, o que significa dizer que, a despeito da diversidade da população brasileira, um grupo homogêneo se encarregou de colocar na Constituição as normas, os princípios e tudo mais que rege a sociedade brasileira. Os avanços na luta contra o racismo consubstanciados na Lei de Cotas nas universidades e na abertura de delegacias contra crimes raciais mostram-se pífios quando recordamos que, no Brasil, a escravidão vigorou por mais de 300 anos e que o país foi o último a abolir o regime escravocrata.

A defesa em torno de uma mulher negra para o Supremo logo recebe o estigma de identitarismo. Contudo, a questão da mulher negra em nosso país é uma demanda estrutural sendo resultado da nossa formação sócio-histórica. O fato é que, dos 132 anos de existência do STF, nunca uma mulher negra foi ministra. O último censo étnico-racial do poder judiciário aponta que apenas 1,7% dos juízes e juízas são pretos. A essa altura, alguém vai tirar da cartola a cantinela da meritocracia. Pois bem, existem inúmeras brasileiras negras com notório saber jurídico, idade entre 35 e 65 anos e reputação ilibada, pré-requisitos para preencher a vaga do STF. Nomes como Adriana Cruz, Lívia Vaz e Soraia Mendes despontaram na mídia, mas sabemos que seguramente existem outras mulheres negras grandiloquentes. Nesse momento histórico, faz-se oportuno ecoar a frase da filósofa Ângela Davis: “quando uma mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”.

Foto do Kalina Gondim

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?