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Mas, afinal, o que é misoginia?
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É doutora em Educação pela UFC. Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro

Kalina Gondim comportamento

Mas, afinal, o que é misoginia?

No Brasil, o Projeto de Lei 890/23 prevê a punição de crimes resultantes de práticas misóginas. O advento dessa lei é importante, contudo, não podemos cair em um fetichismo jurídico, a sociedade precisa reagir na forma de informações, debates e profundos esclarecimentos.
Primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja sofreu ataque de ódio ao ter conta no X (ex-twitter) invadida por hacker (Foto: Claudio Kbene/PR)
Foto: Claudio Kbene/PR Primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja sofreu ataque de ódio ao ter conta no X (ex-twitter) invadida por hacker

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As últimas semanas foram movimentadas no território brasileiro, isso porque, a nível nacional, veio a notícia de que haters invadiram as mídias sociais da primeira-dama Janja. No plano local, a vice-governadora Jade Romero foi chamada de "menino de recado" por vereadores, após tecer críticas ao ex-prefeito Roberto Cláudio. Nos dois casos supracitados, a misoginia foi apontada de modo recorrente como a causalidade dos ataques que tiveram como alvo duas mulheres que ocupam um lugar de destaque na esfera pública.

O problema das palavras que são repetidas exaustivamente é que elas tendem a se distanciar de sua essência adquirindo muitos significados e, ao mesmo tempo, nenhum. Com a misoginia corre-se o risco de acontecer a mesma coisa. A essa altura, podemos nos perguntar: afinal, o que é misoginia? A palavra misoginia é oriunda da união dos termos gregos “mideo” e “gyne”, cujos significados são, respectivamente, ódio e mulheres.

A misoginia seria sinônimo de machismo? Quais as pontes que ligam esses dois conceitos? Antes de apresentar a definição, penso ser oportuno esclarecer algumas questões. Preliminarmente, devemos considerar que atitudes misóginas não são inerentes a perfis psicológicos de alguns homens, inclusive, quero ressaltar, que não é incomum mulheres com discursos e atitudes misóginas. A misoginia, assim como o racismo, não é um fato pontual e isolado, é antes, um problema estrutural, trata-se de um fenômeno presente em indivíduos de todas as classes sociais, raças e níveis de escolaridade.

A sociedade hodierna é resultado de um longo processo histórico fundado em desigualdade de classe, raça e gênero. O machismo prescreve como as mulheres devem se comportar, quais lugares podem ocupar e também o que não podem ser. Em suma, o machismo emoldura as relações travadas em sociedade, e as mulheres que rompem com essa moldura atravessando a rua que liga o espaço privado ao público sofrem, por consequência, retaliações, pois não estão agindo de acordo com os parâmetros designados para elas, logo, na visão machista, precisam ser hostilizadas de diferentes formas e intensidade.

A essas ações denominamos misoginia. Não é por acaso que a política institucional é o lugar onde as mulheres mais sofrem com atitudes misóginas, pois nessa esfera elas lidam diretamente com o poder, elemento considerado exclusivo do sexo masculino. Para os misóginos, as mulheres que têm voz e visibilidade rompem o cordão de isolamento machista e, portanto, devem ser punidas. Engana-se quem aposta na diminuição dos casos de misoginia à medida que mulheres ascendem. Quanto mais voz elas tiverem, maior será o uso do arsenal misógino.

No Brasil, o Projeto de Lei 890/23 prevê a punição de crimes resultantes de práticas misóginas. O advento dessa lei é importante, contudo, não podemos cair em um fetichismo jurídico, a sociedade precisa reagir na forma de informações, debates e profundos esclarecimentos.

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