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BBB 23: Não há câmera que impeça um assédio
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Luana Sampaio é pesquisadora e diretora de criação audiovisual do O POVO. É doutoranda em Comunicação pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com pós-graduação em Artes Criativas na Deakin University, na Austrália. Escreve sobre memória, testemunho, imagem, cinema e história

Luana Sampaio arte e cultura

BBB 23: Não há câmera que impeça um assédio

O Big Brother Brasil é um programa conhecido por se aproveitar de vulnerabilidades e conduzir situações sensíveis de maneira equivocada. Com o último caso de assédio ocorrido na 23ª edição, não foi diferente. No entanto, pelo menos dessa vez, o repúdio não ficou só no discurso
Tipo Opinião
MC Guimê e Cara de Sapato foram expulsos do BBB23 (Foto: Paulo Belote/  Globo)
Foto: Paulo Belote/ Globo MC Guimê e Cara de Sapato foram expulsos do BBB23

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Até aqui, muito já se falou sobre o caso de assédio ocorrido dentro da casa da BBB 23. Dois integrantes, dois homens, foram expulsos por assediarem uma participante mexicana que tinha acabado de entrar na casa. Cara de Sapato, lutador, tentou beijar a moça à força.

Ele a agarrou, colocou seu corpo sobre o dela, e prendeu suas pernas e braços. Ele colocou o cobertor em cima dos dois. A participante, a todo instante, dizia não. Já MC Guimê, cantor, resolveu passar a mão no bumbum da participante, que ao notar a atitude tentou retirar a mão, mas ele continuou insistindo.

Que triste é aquela imagem. Que crime horroroso. Nojento. A cena dói, rasga a alma de quem sabe o que é ser tocada contra sua vontade. Ver aquela mulher ser assediada é uma imagem que corta o peito e sussurra a dor dilacerante de saber que quem está ali, sendo imobilizada e tocada sem sua permissão, também somos nós. Qualquer uma de nós. Pois sempre somos nós.

Infelizmente, não há novidades a trazer. Abra um jornal. Leia notícias. Olhe pro seu lado.

 

BBB23: Na primeira imagem, Cara de Sapato abraça e tenta beijar Dânia, enquanto ela tenta se esquivar. Na segunda imagem, Mc Guimê passa a mão no bumbum de Dânia e quando ela percebe, retira a mão dele.(Foto: Reprodução Redes Sociais)
Foto: Reprodução Redes Sociais BBB23: Na primeira imagem, Cara de Sapato abraça e tenta beijar Dânia, enquanto ela tenta se esquivar. Na segunda imagem, Mc Guimê passa a mão no bumbum de Dânia e quando ela percebe, retira a mão dele.

Mulheres são assediadas e abusadas enquanto dormem, enquanto estão anestesiadas, enquanto caminham, trabalham, estudam. Somos assediadas quando vamos ao banheiro. Quando estamos sentadas no ônibus, quando estamos nos divertindo, quando estamos sendo simplesmente simpáticas com um homem. Somos assediadas ao parir. Somos assediadas quando ainda sequer nos tornamos mulheres.

Ver Dânia ser agarrada e alisada, o típico crime odiosamente revestido pelo sorriso do macho que acha que está brincando, é me ver, criança, recebendo “elogios” de adultos sobre a forma das minhas pernas. É lembrar de que quando estava na cantina da escola, inclinada para frente para entregar a ficha do lanche, me senti sendo empurrada e olhei pra trás, vendo um paredão de meninos que jogavam um outro na minha direção para “pinar” em mim. É “receber massagem” do professor de química enquanto fazia a tarefa. É adentrar uma multidão pra chamar por minha irmã e um velho me pegar no meio, puxar minha mão e beijá-la.

E isso não é nem um por cento das agressões inimagináveis que mulheres sofrem. Sem falar que quando consideramos recortes de cor, classe e gênero nessa discussão, a violência e objetificação do corpo se mostra exponencial. Assim, não surpreende que sejam tantas as mulheres que nem conseguiram ver o vídeo do assédio no BBB23, ou de mulheres que se sentiram mal só em ouvirem falar sobre esse assunto.

Mas aconteceu, a cena está lá, gravada e transmitida para todo um país mostrando que não há câmera no mundo que impeça um homem de tocar outra pessoa sem que ela deseje. E já que há uma imagem, que ela sirva pra algo além de fazer machucar, gerar especulação e lucro. Em seu lugar, que ela gere debate e urgência na investigação e responsabilização de toda e qualquer parte, pois se ética, educação e bom senso não foram capazes de evitar o que aconteceu, que ao menos a justiça seja.

Foto do Luana Sampaio

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