
Professor de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Professor de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Os brasileiros encontraram uma forma criativa e de grande importância para a comemoração da independência do Brasil: o Grito dos Excluídos. Seu significado consiste, antes de tudo, em trazer à memória os valores éticos que motivam as lutas por justiça social e ambiental, em nosso país, para denunciar as diferentes formas de injustiça e violência que atacam a vida humana e a natureza.
Trata-se, nessas inúmeras formas de luta, da busca de articulação de um modelo alternativo de configuração da vida coletiva que possa distribuir renda, vida digna, democracia e cultura, fundado, portanto, na efetivação dos direitos sociais básicos e na defesa da natureza.
É a partir desse horizonte de sentido que emerge, como urgência inadiável, a exigência de luta e de compromisso com a construção coletiva de um modelo de desenvolvimento que seja capaz de superar a miséria e a extrema desigualdade que hoje afligem milhões de pobres e indigentes e a destruição sistemática da natureza e nos envergonham, pois isso significa que ainda não superamos a barbárie.
São fenômenos inegáveis de hoje as inúmeras situações de violência de todos os tipos, o massacre de crianças e adolescentes, o abandono de crianças nas ruas, a situação humilhante nos presídios, a discriminação de raças, as diferentes formas de opressão das mulheres, a intransigência cultural, a negação sistemática da diversidade, a rejeição da alteridade, a perseguição de minorias de raça, sexo, etnia, dissidentes aos regimes e a sistemática destruição da natureza, radicada na ilusão do caráter ilimitado de seus recursos.
Isso manifesta, com clareza, o eixo básico de nosso projeto de civilização: a subordinação da qualidade de vida dos seres humanos ao crescimento econômico. Os povos começam a compreender que o capitalismo globalizado e financeirizado não busca o crescimento do ser humano, mas do próprio capital. Os dois se mostram incompatíveis. Aqui, a acumulação é o fim de todo o processo e, como nos diz M. Arruda, "Dinheiro, prestígio e poder foram convertidos em fins e deformaram o próprio sentido da existência humana".
O aumento do PIB é, nesse contexto, considerado o sinal mais claro do progresso tão desejado pelas forças que dele usufruem. A sociedade do crescimento é, igualmente, a sociedade do consumo ilimitado e a ideia hoje difundida fortemente é de que nisso consiste a felicidade humana. Isso nos faz perceber que a problemática ecológica não pode ser compreendida fora do horizonte de compreensão da vida humana em sua totalidade e do projeto de sua configuração individual e social, ou seja, do processo civilizacional em curso.
Os países ricos e industrializados, os maiores poluidores, impõem aos outros o modo como se deve tratar a natureza. No Hemisfério Sul, milhões de famintos destroem a natureza em busca de uma sobrevivência que lhes é impossibilitada pela forma de configuração da vida coletiva e, com isso, pela forma de uso e apropriação dos bens da natureza. Por tudo isso, o lema do Grito desse ano é: "Cuidar da casa comum e da democracia é luta de todo dia".
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