Professor de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Professor de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Sabemos que vivemos, hoje, numa humanidade que se torna una pela expansão universal da civilização tecnocientífica. Nesse contexto, nossas ações têm repercussões universais, de tal modo que os particularismos éticos, aqui, perdem seu sentido, o que se revela, com clareza, nos perigos que ameaçam a humanidade como um todo. Por exemplo, a crise ecológica, que nos trouxe a consciência da ameaça universal que constitui o projeto moderno de intervenção tecnológica sobre a "bioecoesfera", provocando problemas de superpopulação, escassez de fontes energéticas, destruição do meio ambiente, fome e miséria de muitos países e povos, a possibilidade de destruição nuclear da humanidade etc.
Numa palavra, a civilização tecnocientífica universalizada confronta todos os povos da terra, independentemente de suas tradições culturais específicas, com uma problemática ética comum, ou seja, com a problemática da responsabilidade solidária em nível universal. No entanto, precisamente isso constitui o paradoxo de nossa epocalidade: no tempo em que, como nunca na história humana, se revelou, com tanta premência, a necessidade de uma macroética, nunca foi tão difícil legitimar o saber ético, que não encontra lugar nos saberes, hoje, reconhecidos: as ciências formais, lógico-matemáticas, e as ciências empíricas.
As normas éticas não se situam nesses campos, portanto, estão fora da esfera do saber "objetivo", intersubjetivamente válido. Assim, não lhe resta outra alternativa a não ser situar-se na esfera da "subjetividade", isto é, na esfera do arbítrio, do que, em princípio, não é universalizável. O campo hoje reconhecido como pertencente à ética é o campo das emoções, dos sentimentos, das "puras" decisões. É impossível legitimar normas éticas, portanto, o ético se situa fora da razão demonstrativa, excluída daquilo que o ocidente chamou de razão, já que nossa cultura limitou a esfera da racionalidade à esfera do que é atingido pela observação.
Assim, como diz K-O. Apel, instaura-se, no centro da cultura contemporânea, o dualismo insuperável entre o objetivismo neutro das ciências e o subjetivismo existencial dos atos de fé e das decisões éticas. Isso significa confinar a ética à esfera das decisões privadas da consciência e substituir a fundamentação argumentativa das ações pelo pragmatismo das regras técnicas. Nosso mundo convive, tranquilamente, com uma divisão de trabalho: a divisão entre a lógica objetiva da ciência e a lógica subjetiva da ética, que é a lógica das decisões ilegitimáveis. Chegamos ao extremo oposto da história da autonomia na modernidade; o que importa agora é, acima de tudo, perder o sentido do sentido, pois só assim o ser humano pode encontrar autonomia.
Assim, nossos dias transformaram a ética secularizada da modernidade em algo impossível para o homem: perdemos a fé na possibilidade de fundamentar objetivamente nossas escolhas morais. Nosso gosto vai na direção dos mais diversos particularismos, que negam a existência de verdades universais e, consequentemente, uma ética universal. A ética, para nós, nada tem a ver com a razão, mas com nossas emoções e conveniências sociais. Aliás, não nos parece, hoje, uma arrogância de intelectuais a pretensão da ética da Ilustração de fazer surgir um sujeito autônomo capaz de julgar criticamente seu mundo?
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