Marília Lovatel é escritora, cursou letras na Uece e é mestre em literatura pela UFC. É professora de pós-graduação em escrita literária e redatora publicitária. Tem livros publicados por diversas editoras, entre elas, Scipione, Moderna, EDR, Armazém da Cultura e Aliás. Vários dos seus 12 títulos são adotados em escolas de todo o país, tendo integrado 2 vezes o Catálogo de Bolonha, 2 vezes o PNLD Literário e sido finalista do Prêmio Jabuti 2017.
A foto no perfil eu costumo atualizar, mas a frase no espaço “recado” era a mesma desde a minha adesão ao aplicativo. “Disponível”, “Ocupado”, “Na escola”, “No cinema”, “No trabalho”, “Bateria fraca”, “Não posso falar, somente WhatsApp”, “Em reunião”, “Na academia”, “Dormindo”, “Apenas ligações de emergência”, a essas opções sugeridas preferi digitar o verso “Cantando espalharei por toda parte, se a tanto me ajudar o engenho e arte”, pinçado de Os Lusíadas, com o desejo camoniano de me libertar da lei da morte, o esquecimento, por meio de uma escrita que fique, quando eu não mais estiver.
É o que realizamos ao escrever. Espalhamos nosso canto, nossas sementes-palavras por toda parte, com a ajuda do engenho e da arte. Esse foi um dos primeiros passos na descoberta que fez de mim escritora. A consciência de que o escrito não nos pertence encontra sentido na leitura alheia. Mais adiante na caminhada, deparei-me com os dilemas de produzir poesia para lançá-la a um mundo sem minutos a perder com imagens líricas, sem paciência para a falta de objetividade, na exigência de que se vá direto ao ponto, sem rodeios, digressões, o pensamento deve ser exato, informativo, limpo de floreios.
A questão é que assim não me reconheço no espelho tanto quanto não estou “Disponível” para uma existência só apoiada na concretude das pedras. Meu espírito vive “Ocupado” com matérias oníricas, próprias à nefelibata que sou, não importa se “Na escola”, “No cinema”, “No trabalho”. Não quero ouvir áudios. Muito menos acelerados. Eu posso falar fora do WhatsApp. Não estou sempre “Em reunião”, “Na academia” ou “Dormindo”. Recuso-me a atender “Apenas ligações de emergência”.
Quero um tempo poético, não prático. Quero jogar conversa fora, tomando vinho ou café, não ticar itens de tarefas cumpridas em uma lista. A vida pede rebeldia, coragem para sermos livres das formas de opressão, ainda que pareçam virtuais. Do contrário, entramos no modo “Bateria fraca” de uma maneira irreversível. “Entre pedras que me esmagavam levantei a pedra rude dos meus versos.” A poesia de Coralina é o meu novo recado.
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