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A "lei as fake News" e a democracia
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É mestre em Direito pela UFC e doutorado em Direito pela Johann Wolfgang Goethe-Universität Frankfurt am Main. Atualmente é professor da Universidade de Fortaleza e Procurador do Município de Fortaleza

A "lei as fake News" e a democracia

O PL 2630/22 aparece precisamente para impor limites à liberdade de manifestação de pensamento criminosa e mentirosa. Surge na esteira do que a democracia moderna tem de mais precioso: a imposição de limites econômicos, políticos e sociais
Tipo Opinião

Não parece restar dúvida de que um dos temas centrais dos próximos dias será a discussão a respeito do Projeto de Lei nº 2630/2022 – ou PL 2630/22 – que busca instituir a lei brasileira de liberdade, responsabilidade e transparência na internet. O PL 2630/22 já foi aprovado no Senado Federal e caminha para a aprovação da Câmara dos Deputados, agora sob a relatoria do Dep. Orlando Silva (PCdoB-SP).

O que chama a atenção é a reação que se assiste à regulação. De um lado, empresas de alta tecnologia e entidades que se beneficiam da completa ausência de regulação disfarçam seu interesse monetário em defesa da “liberdade de manifestação de pensamento”. Por outro lado, recorrendo ao mesmo disfarce, atores políticos das bancadas evangélicas e conservadoras trombeteiam a ameaça de sua liberdade de continuar divulgando inverdades, alegando que o PL 2630/22 limitará sua atuação. No que estão corretos!

O PL 2630/22 aparece precisamente para impor limites à liberdade de manifestação de pensamento criminosa e mentirosa. Surge na esteira do que a democracia moderna tem de mais precioso: a imposição de limites econômicos, políticos e sociais, como nos advertiu Noberto Bobbio, quando afirmou que a democracia é um sistema de limites.

Os limites econômicos não deveriam surpreender a ninguém. Qualquer investidor saber disso, já que se supõe que seja conhecedor da Constituição e das leis que temos. Estes textos legais não deixam dúvidas de que temos um Estado dirigente e intervencionistas. Seria risível desejar que o Estado, autorizado pelo poder constituinte e igualmente limitado, não lançasse mão das atribuições que a Constituição lhe manda exercer.

No mundo inteiro, há vozes – sinceras e insinceras – que reconhecem o estrago das notícias falsas para a democracia, além da disseminação do criminoso discurso de ódio. No Brasil, os casos recentes de proliferação deste discurso trouxeram tragédias que outros países já vivem, como as mortes em escolas. A necessidade de órgão do Estado democrático que disponha da civilizada legalidade para identificar, combater e punir autores ou cúmplices facilitadores de tais crimes nada tem de inconstitucional, tampouco de ameaçador das liberdades individuais. É o contrário que se opera. O Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, conforme disposto no art. 25 do PL 2630/22 conta com integrantes do Estado e da Sociedade, além de ser organismo vinculado ao Poder Legislativo e que atuará como entidade de avaliação das ações em defesa da democracia. Onde estariam ameaçadas a criatividade, a liberdade de expressar críticas contundentes ou a tomada de posições divergente?

O que não se pode aceitar na convivência democrática é a sua própria destruição. Chegamos até aqui sabedores do que a falta de limites foi capaz de convencer populações inteiras, por exemplo, de que era necessário o extermínio de certas categorias de pessoas; tudo às custas do discurso falsificado da história, do pensamento político. Uma vez que no Brasil celebramos um pacto civilizatório em 1988, não há como deixar de reconhecer que o PL 2630/22 é mais um elemento que dialoga e fortalece este pacto. Que seja, então, aprovado e convertido em Lei.

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