Juiz federal, foi vice-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe/2010-2012). É professor em cursos de pós-graduação e professor convidado da Escola da Magistratura Feral da 5ª Região (Esmaf), da Escola da Magistratura do Estado do Ceará (Esmec) e da Escola de Administração Fazendária (Esaf). É autor dos livros
Sempre vou a Brasília a trabalho. Nunca tenho tempo de procurar o escondido, de namorar a cidade. O Congresso Nacional é portentoso. A Catedral, deslumbrante. O Parque da Cidade, imenso. O Itamaraty sozinho vale uma visita
Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil
Brasília 60 Anos - Esplanada dos Ministérios
Brasília é, ela mesma, uma obra de arte. Nesse aspecto é linda, deslumbrante. Não gosto muito como cidade. Não há esquinas. Tudo é milimetricamente planejado: o setor dos hotéis, o setor comercial, o setor industrial. Há muitos prédios retangulares sem graça e todos os prédios importantes foram projetados pelo mesmo genial arquiteto.
Sinto falta de outros arquitetos, de estilos diferentes, de um pouco de energia caótica. Às vezes, penso que é tudo tão ordenado fora, tão monotemático, que o caos fica para dentro. Por fora, tudo lindo e ordenado; por dentro, tudo meio enviesado. Brasília esconde alguma coisa, como todos nós.
Sempre vou a Brasília a trabalho. Nunca tenho tempo de procurar o escondido, de namorar a cidade. O Congresso Nacional é portentoso. A Catedral, deslumbrante. O Parque da Cidade, imenso. O Itamaraty sozinho vale uma visita.
Foi lá que encontrei uma mulher em êxtase, os seios turgidos, muitos cabelos e braços abraçados, tudo transformado numa dança caótica. O Canto da Noite é da genial Maria Martins, uma artista brasileira que continua desconhecida para a maioria.
Eu passaria horas olhando para aquela escultura. Para senti-la, é preciso andar ao redor, dançar com a mulher que canta. A mulher está pousada no meio de um jardim de Burle Marx. Na sala ao lado, outra mulher é seguida por sua sombra, duas serpentes a ponto de abocanhá-la, as mãos sedentas, os braços enrolados tentando conter o que não deixamos sair.
As esculturas parecem grotescas, mas são sublimes, poderosas, arrebatadoras. Maria Martins parece dizer que é preciso colocar para fora o que está escondido. Integrar as sombras, permitir que a ordem e o caos dancem juntos.
Acho que é isso que me enerva em Brasília. Tudo parece muito ordenado. Aqueles prédios ficam mais bonitos quando me dou conta que são imperfeitos, como somos imperfeitos. Quando me dou conta de que a própria democracia é imperfeita, que o poder corrompe e, no fundo, é ele mesmo fake. O que me consola é saber que a Arte e a Democracia talvez sejam as duas melhores maneiras de integrar as sombras e transformá-las em luz.
Análises. Opiniões. Fatos. Acesse minha página
e clique no sino para receber notificações.
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.