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Pelé abdica hoje o trono do futebol
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A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO

Pelé abdica hoje o trono do futebol

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A despedida do Rei (Foto: DATADOC/O POVO)
Foto: DATADOC/O POVO A despedida do Rei

 

Nova lorque - "É o momento mais importante e ao mesmo tempo mais triste de minha vida ter que me retirar dos tempos de futebol", disse Pelé, ontem é tarde, durante uma entrevista coletiva à imprensa internacional promovida pelo Cosmos para que o jogador brasileiro anunciasse oficialmente sua decisão de abdicar ao trono do futebol mundial. Hoje à tarde no Giants Stadium de Nova Jersey, cidade vizinha a Nova lorque, cerca de 100 mil pessoas assistirão a última partida do rei do futebol, que atuará durante um tempo pelo Santos a outro pelo Cosmos. A partida será transmitida ao vivo para 40 países, inclusive o Brasil. Após as homenagens que serão prestadas a Pelé, o brasileiro Sérgio Mendes cantará o Hino Nacional brasileiro com seu conjunto Brasil 77.

Depois de admitir que poderá voltar a jogar, mas apenas "partidas de caridade ou de homenagem a algum jogador", Pelé afastou a possibilidade de entrar em campo pelo Brasil no Campeonato Mundial de 1978, na Argentina. "Posso cooperar com o Brasil como Edson Arantes, mas infelizmente nunca como Pelé".

O jogador, às vésperas de completar 37 anos, lamentou com um "a vida é assim mesmo" seu afastamento do futebol. Um sério problema que reconheceu foi o de ter que separar a partir de hoje o jogador e o cidadão. "É muito difícil separar o Pelé do Edson Arantes, mas tenho que me preparar para viver como Edson Arantes e não como Pelé" - destacou, ressaltando a necessidade de ter que "me preparar psicologicamente para deixar o futebol".

Sempre com uma voz pausada e deixando transparecer a emoção, Pelé respondeu a perguntas de jornalistas do Brasil, Argentina, México, Colômbia, Alemanha e Inglaterra, tendo como intérprete o professor de educação física Júlio Mazai, mas em alguns momentos abandonando o português por um inglês perfeito.

Quando lhe pediram para fazer um retrospecto de sua carreira, relacionou os momentos que considerou mais gratos:"tive momentos muito importantes em minha carreira, mas posso destacar a primeira Copa do Mundo na Suécia, quando tinha 18 anos. Foram também momentos importantes os outros campeonatos mundiais e a Copa Intercontinental dos Clubes".

INGRESSOS ESGOTADOS

Pelé admitiu que estará hoje numa posição bastante delicada ao ter que jogar um tempo pelo Cosmos e outro pelo Santos. Ressaltou, porém: "Foi uma atitude das mais bonitas o Cosmos trazer o clube onde me fiz como jogador de futebol".

Os 80 mil ingressos para a partida estão esgotados e os dirigentes do Cosmos esperam uma grande renda. Na entrevista, três deles - o presidente Nesuhi e os vice-presidentes Ahmet Erregun e Rafael Serra - cortejaram Pelé o tempo todo.

O jogador brasileiro anunciou que logo depois de sua despedida viajará ao Brasil, onde pretende repousar e viver com a família. Mais tarde, fará um giro por Portugal, Inglaterra, Alemanha e França, para cumprir um programa de promoção do futebol patrocinado pela Pepsi-Cola e promover o livro "Minha Vida e Meu Belo Esporte"; memória que ditou e foram publicadas em inglês.

Nos seus 20 anos de jogador de futebol, Pelé atuou em 1.300 partidas e marcou 1.280 gols, percorrendo 66 diferentes países.


Todos são unânimes: o maior que o mundo viu

Rio - No momento em que Pelé se dispõe a abandonar definitivamente os campos de futebol uma pergunta se impõe: o que ele significou para o futebol brasileiro? ou mesmo qual sua opinião para o futebol. A resposta parece simples: ele foi um divisor de épocas. O futebol brasileiro pode e deve ser analisado antes e depois de Pelé.

Jogadores, técnicos, jornalistas, dirigentes, todos são unânimes em afirmar: ele foi o mais importante personagem da ainda curta história deste esporte. E muitos acham que, de uma maneira ou de outra, Pelé deveria continuar no futebol, ainda que fosse como uma espécie de relações públicas.

Até a bola chora com a despedida de Pelé

Rio -(Sport Press)- O mais importante capítulo da história do futebol mundial termina hoje, quando o árbitro determinar o final do jogo entre o Santos e o Cosmos, em Nova Iorque. Neste momento, Pelé, o maior jogador de futebol de todos os tempos, estará deixando definitivamente os campos e com ele muito do que este esporte teve nos últimos 21 anos. Edson Arantes do Nascimento, mineiro de Três Corações, nascido há 37 anos, cidadão do mundo, vai parar de vez. Daí em diante, filmes, histórias, lendas, além da memória dos torcedores, restarão para auxiliar a própria história do futebol e.principalmente, deste jogador que foi seu personagem principal.

"Uma parte de minha vida, a mais importante, vai morrer. Parece mentira, mas vou deixar os campos de futebol".

As declarações não chegam a causar tanto impacto, uma vez que Pelé, em verdade se despedira do futebol no dia em que deixara o Santos. De qualquer forma, desta vez, é o adeus definitivo, a separação de sua maior amiga: a bola. Para muitos, principalmente os norte-americanos que nos últimos dois anos viram despertar o gosto pelo futebol vai morrer. "Parece mentira, mas Pelé vai deixar os campos"*

"Pelé é uma coisa do outro mundo" (Garrincha)

O ingênuo Garrincha, o único jogador que (certo ou errado) foi para alguns precipitado, comparado a Pelé, parece definir o que todos sentiram durante estes 21 anos enquanto fazia gols. Em nenhum momento, em nenhum lugar até hoje, nenhum jogador conseguiu fazer gols de todas as maneiras possíveis. Só ele. Desde já, a saudade parece atingir os torcedores. Afinal foram apenas 21 anos, muito pouco para um mundo de milhões de anos.

COMEÇO

Ainda menino, Edson Arantes do Nascimento ganharia o apelido que usaria durante toda a vida e que, como ele, ficaria famoso em todo o mundo. Tudo começou em Bauru, onde os Nascimento moravam, quando o menino Edson mostrava dificuldade para dizer o nome do goleiro do Bauru Atlético Clube: Bilé. Nas brincadeiras de rua, ele ficava no gol e a cada defesa que fazia, gritava "Pelé", uma vez que não conseguia se lembrar de "Bilé". Rapidamente começou a ser chamado de Pelé, por este erro de pronúncia e, para o resto da vida, nunca mais se separou do apelido. Em casa, até então, era chamado de Dico.

O menino que carregava o apelido de Pelé foi entusiasmando a todos por suas excelentes atuações no Baquinho - juvenil do BAC - e logo cobiçado por muita gente que via, naquele crioulinho franzino, uma esperança de gols. Mas foi Waldemar Brito, transferido para Bauru pela sua firma, que viria a descobrir aquele menino e que o levaria para o Santos, com pouco mais de 15 anos

Foi com esta idade que Pelé atuou pela primeira vez no time do Santos, no dia sete de setembro de 56, num amistoso contra o Corintians de Santo André. O jogo foi muito fácil e Pelé fez um dos gols na vitória de 7 a 1. O goleiro Zaluar, do Corintians, só não poderia imaginar que aquele amistoso entre um time poderoso (Santos) e o seu modesto clube, poderia levá-lo para a história do futebol. Isto aconteceu: Zaluar foi o primeiro goleiro a levar um gol daquele que viria a ser o maior artilheiro de todos os tempos.

DESCOBERTA

O Brasil viria a descobrir Pelé, poucos meses depois, quando ele participou de um Torneio Internacional, no Maracanã. Jogavam Belenenses (Portugal), Flamengo, Dinamo (lugoslávia) e um combinado Vasco e Santos (com a camisa do Vasco) e aquele "'crioulinho" de 16 anos, já então a maior promessa de São Paulo, estava no time. Na estréia, frente ao Belenenses, três gols e nos dois outros jogos, um gol em cada. A data: 19 de junho de 57, Pelé fazia três gols e infernava a defesa do Belenenses.

No dia sete de setembro, do mesmo ano, exatamente um ano após sua primeira participação num jogo com os profissionais, ainda com 17 anos incompletos, Pelé faria seu primeiro gol na seleção brasileira. Entrou no segundo tempo e venceu o lendário goleiro argentino Amadeu Carrizo, embora o Brasil tenha perdido por 2 x 0. Mas, três dias depois, o Brasil derrotava a Argentina por 2 a 0, com novo gol de Pelé e conquistava a Taça Roca. Este o primeiro título da vida dele

CAMPEÃO DO MUNDO

Mas, seria no ano seguinte, que Pelé conseguiria conquistar o mundo e despertar em todos a curiosidade por seu futebol. Convocado para a seleção brasileira que iria a Suécia. Pelé estava, em princípio, na reserva de Dida, na época um dos mais brilhantes atacantes brasileiros. Nas vésperas de embarque para a Europa, um amistoso contra o Corintians, quase o afasta da Copa: recebeu uma dura entrada no joelho e teve de seguir viagem sem saber ao certo se participaria dos jogos no Mundial. Não jogou os amistosos na Itália, contra a Fiorentina e o Internazionale e, em Florença, a Comissão Técnica da seleção resolveu se reunir para decidir se o inscreveria ou não na Copa do Mundo. Alguns chegaram a pensar em sua dispensa e na convocação de Almir.

Hilton Golsling, médico da delegação, e homem de grande visão, acabou por evitar o corte ao prometer que na segunda partida da Copa, Pelé estaria em condições de jogo. O argumento convenceu a todos, embora Pelé só tenha podido jogar na última partida das oitavas de final, contra a União Soviética. Nervoso, aquele menino de 17 anos, ausente do time a um mês, não teve uma boa atuação mas foi mantido para o jogo seguinte, contra o País de Gales.

O Brasil jogava melhor, mas não conseguia marcar e entrar na dura defesa de Gales:estava difícil. Quando faltavam sete minutos para terminar o jogo, com um teimoso e incômodo zero a zero, Pelé recebeu de Didi e, dentro da área adversária, cobriu um zagueiro e com um leve toque colocou a bola 'a direita do goleiro. O seu primeiro gol importante.

Nos jogos finais, contra a França e a Suécia, voltaria a mostrar todo o seu talento em duas grandes vitórias brasileiras pelo mesmo placar: 5 a 2. Contra a França, três gols e contra os suecos. donos da casa, dois e muitas lágrimas, ao ser campeão do mundo com 18 anos incompletos. No dia seguinte a conquista da Copa, o jornal francês "L'Equipe"

destacava: *'Está sendo coroado o novo Rei do Futebol. É um jogador brasileiro que todos chamam de Pelé. Nos próximos anos. muito se falará dele".

O REI

Após a Copa, começava o reinado de Pelé, com sua impressionante coleção de títulos e gols. Até chegar aos 1279 gols, foi conseguindo vencer todas as defesas obstáculos que se apresentaram. Ora com a camisa do Santos, que viria a imortalizar o número 10 às costas, ora com a camisa da seleção brasileira, que vestiu 111 vezes, tendo com ela feito 97 gols. Foi artilheiro do Campeonato Paulista durante nove anos consecutivos, tendo disputado 248 jogos e marcado 361 gols. Em partidas internacionais pelo Santos, fez 367 gols. Sua importância para o clube pode ser vista pelo fato de que de 1917 (quando foi fundado) a 1956 (quando surgiu Pelé). o Santos havia disputado 41 partidas internacionais. De 56 a 74, ano em que se despediu do clube, o Santos participou de 415 partidas internacionais, 359 com a presença de seu mais famoso jogador.

O gol de placa aconteceria no dia 3 de março de 1960, no Maracanã, quando o time do Fluminense assistiu seus dribles perfeitos de uma área a outra, enquanto todo Santos vencia por 2 a 1, faltando pouco para terminar o jogo, quando Dalmo deu a Pelé, próximo da área do Santos. Ele saiu driblando e vencendo na corrida todos os adversários até chegar a área do Fluminense. Driblou Jair Marinho, que ficou no chão, Pinheiro, e frente a Castilho atirou sem chance para o goleiro. Era o gol que viria a ter uma placa de bronze no Maracanã, para lembrá-lo.

TRISTEZA

A Copa de 62, não seria muito feliz para este extraordinário jogador, embora o Brasil voltasse do Chile Campeão do Mundo e Pelé fosse, antes do embarque para Santiago, a maior estrela da Copa. Na estréia, contra os mexicanos, um gol sensacional e todos começaram a esperar novas genialidades Por isso, os tchecos, adversários do Brasil no segundo jogo, trataram de se precaver. Mas não foi preciso: aos 27 minutos do primeiro tempo, após fintar um adversário, Pelé chutou com violencia. A bola passou pelo goleiro Schroiff, e foi bater na trave. Todos pararam: num canto, Pelé passava a mão na coxa. Era o fim, para ele, naquela Copa do Mundo. Até o final, ficou torcendo, embora concordasse em "simular" testes de vestiário, antes de cada partida" para assustar os adversários. E o Brasil, com Ele, foi campeão.

Em 66, nova tristeza: o Brasil, mais preparado, se perdia nos próprios erros e ficava fora do Mundial, desclassificado nas oitavas de final As derrotas para a Hungria e Portugal, ambas por 3 a 1, não podem ser contestadas, embora contra os Portugueses Pelé tenha sido "cacado" e terminado contundido após uma violenta sequencia de "pontapés" de Morais, lateral direito de Portugal. Mas Pelé, continuaria a ser o maior jogador do mundo.

O MILÉSIMO GOL

Em 19 de novembro aconteceria sua maior glória: a conquista do milésimo gol. O jogo Vasco x Santos pouco significava para o Torneio Roberto Gomes Pedrosa, mas para o mundo inteiro, para a história do futebol, era muito importante porque, em campo, Pelé estaria tentando algo de inédito.

Apenas um homem, o goleiro Andrada estava disposto a impedir o feito de qualquer maneira. E foi ele que, com uma defesa incrível no primeiro tempo, salvou-o. Depois a trave e mais tarde o zagueiro Renê que, apavorado com a presença, de Pelé em suas costas, tocou contra suas próprias redes

Mas aos 32 minutos do segundo tempo, Fernando derrubou Pelé na área e o juiz Manuel Amaro apontou a marca da cal: penalty, muito contestado pelos jogadores

do Vasco.O estádio inteiro, com o público de pé, começou a gritar em coro: "Pelé, Pelé, Pelé". E foi ele que, nervoso, como em poucos momentos de sua carreira, cobrou o penalti, de pé direito, a direita de Andrada que ainda tocou na bola. Enquanto o desesperado goleiro (o Arqueiro do Rei, como ficou conhecido) socava o chão, Pelé corria para apanhar a bola e beijá-la, num justo reconhecimento por tudo que ela lhe dera.

Restava se despedir, com todas as honras que um jogador de sua categoria (a primeira e única, no mundo merecia. No dia 11 de julho de 71, despediu-se do público paulista com a camisa da seleção brasileira e marcou seu 97o.. gol pelo Brasil, frente a Austria. No dia 18, uma semana depois, era a vez do Maracanã vê-lo, pela última vez com a camisa verde e amarela. E, ao final do primeiro tempo, cercado de crianças,sob os aplausos de todo o público que lotava o estádio, Pelé deu a volta Olímpica. Nas arquibancadas, cadeiras, gerais, em todos os cantos do estádio, um coro uníssono: "Fica, Fica, Fica". Com lágrimas nos olhos e apesar dos inúmeros apelos, nunca mais voltou.

Três anos depois, e dois de outubro de 74, na Vila Belmiro, onde passou bom tempo de sua vida, Pelé fazia seu último jogo oficial, no Brasil. Aos 22 minutos do primeiro tempo, após uma boa cabeçada contra o gol da Ponte Preta, ajoelhou-se e de braços abertos, agradeceu ao público. Era o adeus ao Santos, que naquele momento parecia ser o adeus definitivo.

Como artistas notáveis, (Frank Sinatra é um exemplo). Pelé tornou a voltar, mesmo, após ter se despedido e aceitou o desafio de divulgar o futebol nos Estados Unidos. Hoje, após duas temporadas, tendo conseguido o título de campeão americano pelo New York Cosmos, o futebol norte-americano deve antes dele muito a ele. Um exemplo: a média de público por temporada era de 400 mil pagantes, este ano chegou a 3,5 milhões de espectadores. Agora, no sábado, este incrível talento, o maior jogador de futebol que o mundo já viu, vai dar adeus. Este, sim, definitivo. Em campo, a bola deverá - se a comparação é possível - ficar triste. Seu maior amigo, aquele que a tratou melhor, vai embora. Perde o futebol, ganha a história.

 

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