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Morre Drummond, aos 85 anos, o poeta maior
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A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO

Morre Drummond, aos 85 anos, o poeta maior

Segundo o último boletim de sua médica particular, Elizabete Viana de Freitas, o poeta tinha sido vítima de um infarto do miocárdio, sábado último, pela madrugada, acompanhado de complicações respiratórias, necessitando da ajuda de um respirador
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Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade. (Foto: O POVO DOC)
Foto: O POVO DOC Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.

 

18 de agosto de 1987

Aos 85 anos de idade, Carlos Drummond de Andrade, o nosso poeta maior, não resistiu a um infarto agudo do miocárdio, acompanhado de complicações respiratórias, e faleceu na noite passada, na clínica Pró-Cardiaco, do Rio de Janeiro.

Estava hospitalizado desde sábado passado e, segundo sua médica particular, Elizabete Viana, vinha respirando com a ajuda de aparelhos. Numa entrevista recente, ele dissera: "Estou preparado para morrer. O que não quero é na hora da morte ficar ai dando trabalho para os outros: Eu preferiria uma parada cardiaca, uma morte rápida". No último dia 5 desde mês, o poeta sofrera um duro golpe, com a morte da filha única, Maria Julieta. Nada comentou. Sofreu sua dor em silêncio.


Infarto agudo mata o poeta Carlos Drummond aos 85 anos

Rio - Internado desde sábado na clínica Pró-Cardíaco, devido a um infarto agudo do miocárdio, morreu ontem à noite, no Rio, o poeta Carlos Drummond de Andrade, aos 85 anos de idade.

Segundo o último boletim de sua médica particular, Elizabete Viana de Freitas, o poeta tinha sido vítima de um infarto do miocárdio, sábado último, pela madrugada, acompanhado de complicações respiratórias, necessitando da ajuda de um respirador.

Drummond de Andrade esteve internado no mesmo Pró-Cardíaco no final do ano passado. Na época, ele sentira os primeiros sintomas do infarto agudo, um dia depois das eleições. Ontem à noite o poeta faleceu.

Rio - "Sempre tive uma vida facil, não posso me queixar. Nunca cultivei pessoas poderosas e nunca tive necessidade de pedir emprego. Fui um homem qualquer. Mais nada"..

Nos últimos anos de sua vida, mais particularmente a partir de 1980. poeta Carlos Drummond de Andrade rompeu o silêncio que se impusera e começou a dar entrevistas. Em 1982. ao complétat 80 anos, chegou a ser entrevistado durante nove horas. Dessas conversas se delineou um novo Drummond, acessível, cordial, que confessava gostar de viver, namorar, apreciar as mulheres, embora advertisse que não vivia "andando por aí dando gargalhadas pela rua como um louco Reivindicava para si a medida justa, humana. Ao publicar seus livros, em grande quantidade nesta fase, passou a atender com delicadeza os repórteres, uma chateação gostosa". sentindo-se "objeto de interesse, de atenção" Gostava até de aparecer na televisão:

- Quando me param na rua para dizer que me viram na teve, me sinto meio Tarcisio Meira. É uma delicia.

 

Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.(Foto: O POVO DOC)
Foto: O POVO DOC Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.

 

Alma aberta

Por dentro, considerava-se um homem alegre, que adorava as crianças e brincava com a neta, fantasiando-se, enrolando-se em cobertores, fingindose de débil mental. Seu dia-a-dia era o de um homem comum. Fazia passeios matinís, ia ao banco e ao Correio, fregüentava as reuniões da ABI e da SBAT, comprava seus livros nas livrarias Leonardo da Vinci e Padrão. 0 tempo de sobra gastava lendo jornais. Era um leitor voraz de jornais: através deles, dizia, tomava consciência do mundo. Neles trabalhou, seja como redator, secretário ou cronista, durante 64 anos. Ficava triste quando um dono de jornal chamava o jornal de "empresa" ("empresa é fabrica de chouriço. de sapatos, que faz tudo em série"). Considerava que um jornal é feito não só de fatos, mas de vida, de amor, um produto diferente a cada dia..

Acima de tudo, considerava-se um homem comum. Com modéstia, dizia que sua vida transcorrera sem maiores dificuldades e também sem maiores glórias.

- Burocrata e jornalista foi mesmo o que poderia acontecer de melhor na minha vida

Talvez não tenha sido bem assim. Durante sua longa vida aconteceu de tudo. Era criança quando houve a Grande Guerra, homem feito durante a II Guerra Mundial, no fim da vida ouvia falar da III Guerra, a definitiva. Não viveu num século fácil. Mas nasceu num ano de bons augurios, 1902. quando foram publicados "Os Sertões", de Euclides da Cunha, "A Réplica", de Rui Barbosa, e "Canaã". de Graça Aranha. O casarão onde ele foi criado, em Itabira, Minas Gerais, ainda existe. Mas a casa em que nasceu foi destruída, como tantas outras nas cidades da região metalúrgica, varrida do mapa com a instalação das siderurgicas. Ao sair de Itabira, ainda jovem, não mais retornou, como que cumprindo uma sina, a não ser em 1954, e assim mesmo, rapidamente: foi com o irmão José transportar os restos mortais da mãe para Belo Horizonte. O pai morreu depois e dele, Drummond guardou uma curiosa recordação:

- Com 70 e poucos anos ele foi visitar-me e verificou que o jardim da minha casa estava mal-tratado. Curvou-se e limpou tudo.

Destino Diferente

Não quis seguir o exemplo do pai, fazendeiro. Estudou em Belo Horizonte e em Friburgo, de onde foi expulso por divergência com um professor de Português. Mais tarde lembrou como seus estudos secundários foram tumultuados ("não esquentei lugar em nenhum dos colégios") e se queixou do tratamento desumano dos jesuítas em matéria de educação, naquela época.

Em compensação, teve sorte com sua formação literária. Em Belo Horizonte entrou em contato com um grupo que lhe marcou a vida: Abgar Renault, Milton Campos, Emilio Moura, Pedro Nava, João Alphonsus, Cyro dos Anjos, Gustavo Capanema, Guilhermino César. Aníbal Machado, Afonso Arinos e João Pinheiro Filho. Todas as tardes eles se reuniam no Café Estrela ou na Livraria Alves.

Publicou o primeiro artigo em jornal aos 16 anos, com o titulo de "Vida Nova". Poucos anos depois, em 1925, já imbuido por aquele espirito de coisa nova, revolucionária, publicou em "A Revista" um artigo, de que depois se penitenciou, mas sob influência das idéias modernistas, considerando a falsa ficção de Machado de Assis em "Brás Cubas": "Que cada um de nós faça o intimo e ignorado sacrificio de suas predileções e queime silenciosamente os seus idolos, quando perceber que esses idolos e essas predileções são um entrave à obra de renovação da cultura geral..."

Drummond sempre assumiu suas idéias de esquerda, mas nunca pertenceu ao PC. Foi um dos diretores do jornal comunista "Tribuna Popular". Confessou depois que o que escrevia não saía e o que saía ele não entendia. Na página literária, que ele editava, riscaram o nome de Eneida (que naquele momento não gozava de boa fama no partido).

Considerou um dos grandes momentos de sua vida quando foi entrevistar Prestes na prisão. "Não era para publicar, mas para transmitir aos companheiros". Transmitiu, mas com um certo sofrimento, porque Prestes não disse o que ele queria ouvir. Ao invés de "vamos fazer a revolução e acabar com a tirania" - Prestes mandou "apoiar Getúlio". Drummond ouviu a frase com respeito, mas com espírito crítico.

 

Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.(Foto: O POVO DOC)
Foto: O POVO DOC Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.

 

Um Cronista

Fui durante a vida toda, um croInista. Um homem que registrava o cotidiano e o comentava com o possivel bom-humor, para não aumentar a tristeza e a inquietação das pessoas.

Foi cronista de dois importantes jornais da imprensa brasileira, o "Correio da Manhã e o "Jornal do Brasil", até o dia 29 de setembro de 1984, quando se aposentou dessa atividade e comentou, também com bom-humor:

- Estou me despedindo da vida de cronista. Mas acho que já estou sentindo saudades...

Na última crônica, "Ciao", explicou que se despedia por admitir a "noção de velho 'consciente e alegremente". Em conversas, em entrevistas, achava melancólico o fato de que quase todos os amigos e os irmãos já tinham morrido. Sentia-se "uma espécie de sobrevivente" e achava desconfortável esse sentimento. Com 80 anos já dizia:

- Estou preparado para morrer. O que eu não quero é, na hora da morte, ficar por aí dando trabalho para os outros: eu preferiria uma parada cardíaca, uma morte rápida.

Comentou com um reporter que, ao se ver no espelho, podia ver a morte, mas reagiu:

Como não tenho religião, não vou pedir a Deus para prolongar a minha vida, para me dar uma morte serena. Aceito a minha sorte. Não adiantaria ficar choramingando "quero viver. quero viver". Só quero morrer tranqüilo comigo mesmo. Eu me desejo uma boa morte.

No último dia 5 deste mês, o poeta sofrera um duro golpe com a morte da única filha, Maria Julieta Drummond de Andrade. Mas, mesmo resignado, não teve forças sequer para subir as escadarias do Cemitério São João Batista. Ele nada comentou. Sofreu a dor muda de quem perdeu seu ente mais querido.

 

Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.(Foto: O POVO DOC)
Foto: O POVO DOC Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.

 

19 de agosto de 1987

Carlos Drummond em prosa e verso

Com os olhos cerrados, como quem, após ler com atenção, fecha a última página do livro do mundo, Carlos Drummond de Andrade se vai, deixando inúmeras observações em prosa e verso. Que novas crônicas e poemas terá ido buscar? Ele que sempre viu além da realidade fria do cotidiano e que com a magia literária tentou amenizar um pouco o aspecto trágico e sinistro do mundo atual. Compreendendo que até mesmo as anormalidades são normais, o poeta de Itabira e do infinito agora assume seu ponto entre as estrelas naturais do cosmo memorial dos homens. A obra de Drummond extrapolou as páginas de seus livros, ganhando telas e palcos.

 

E agora, você?

Com os olhos cerrados, como quem, após ler com atenção, fecha a última página do livro do mundo, Drummond se vai, deixando inúmeras observações em prosa e verso. Que novas crônicas e poemas terá ido buscar? Ele que sempre viu, em imagens calidoscópicas, além da realidade fria do cotidiano e que com a magia literária tentou amenizar um pouco o aspecto trágico e sinistro do mundo atual. Compreendendo que até mesmo as anormalidades são normais, o poeta de Itabira e do infinito agora assume seu ponto entre as estrelas naturais do cosmo memorial dos homens.

Drummond nunca quis ser imortal. se para sê-lo teria que se sujeitar a assumir uma cadeira na Academia Brasileira de Letras. A ele interessava ser eterno como tudo aquilo que vive uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma força o resgata. Apesar de sempre estar atento para as novas categorias que a cada instante se criam com o nome de eternidade. "Eterno é tudo que passou. porque passou é tudo que não passa. pois não houve". No poema "Infância", onde narra passagens de sua vida interiorana, ele descobre o valor dos momentos e das coisas simples. concluíndo: "Eu não sabia que minha história era mais bonita que a do Robinson Crusoé". Era. E…..

Munido de duas mãos e o sentimento do mundo, CDA escreveu um novo Hino Nacional. "Precisamos descobrir o Brasil!/Escondido atrás das florestas (...) O Brasil está dormindo, coitado (...) Tão majestoso, tão sem limites, tão despropositado./ele quer repousar de nossos terriveis carinhos. O Brasil não nos quer! Está farto de nós!/Nosso Brasil é no outro mundo. Este não é o Brasil. /Nenhum Brasil existe. E acaso existirão os brasileiros?". Seu profundo sentido de poeta detectou que nas mesas de bares se aprende que o nacionalismo é uma virtude, mas este mesmo radar do espírito determinou que há uma hora em que os bares se fecham e todas as virtudes se negam.

 

Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.(Foto: O POVO DOC)
Foto: O POVO DOC Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.

 

 

Carlos Drummond de Andrade estava com 85 anos. No meio do seu caminho muitas pedras ficaram para trás "Tive ouro" tive fazendas/Hoje sou funcionário público/Itabira é apenas uma fotografia na parede/mas como dói! - como o inconformismo de que a alma de ferro de sua cidade natal tenha sido vendida para as explorações da Companhia Vale do Rio Doce. Mesmo achando que lutar com palavras é a luta mais và, o poeta estreou com "Onda, um poema em prosa, ainda em Itabira, contra os "arrochos" sociais. Depois de passar por Belo Horizonte, já no Rio, por mais de uma década escreveu três vezes por semana no Jornal do Brasil. Aposentado, não parou de cultivar a sua verve responsável por quatro dezenas de livros. Aqui-acolá cedia um poema inédito ou dava um alô para "O Cometa Itabirano". jornal alternativo mineiro com o qual mantinha certo "chamego".

O humorista Millor Fernandes disse em um de seus textos que de Itabira Drummond herdou apenas o brilho das pepitas. E foi montado na luminosidade do ser de sensibilidade impar que era, que ele, sem busca de fama nem nada, recebeu a consideração de "poeta maior" e o aval popular nas cores verde-rosa da Estação Primeira de Mangueira, no último carnaval. Sempre desfilando talento, humildade e certezas. "Minha vida, nossas vidas/formam um só diamante./Aprendi novas palavras/e tornei outras mais belas./Eu preparo uma canção/que faça acordar os homens/e adormecer as crianças

E foi com canções amigas que CDA chegou a este mundo, mundo, vasto mundo. Entre rimas, sem soluções, mas com a vontade de existir e, assim, ser parte de tudo que viu, sentiu, influiu……. Do mito da fulana, do Rio São Francisco da alegria colorida da primavera e da resistência de uma juventude permanente. "O senhor saiu. Hora que volta? Nunca. Nunca de corvo, nunca de São-Nunca Saiu para não voltar". Infelizmente, como certa vez escreveu Francisco Carvalho, os mais belos poemas ainda são espantosamente desnecessários. E agora, você???


20 de agosto de 1987

A poesia de bicho-do-mato - Paulo Francis

Conheci Drummond mal. Nunca fui à casa dele em Copacabana-Ipanema. Era raro para gente do meu tipo nos meus tempos. Drummond tinha fama de bicho-do-mato, exceto com mulheres, que adorava, e a quem dava um papo imenso. Lembro de com amigos intelectuais ver Drummond na avenida Rio Branco, no Rio, na década dos 50 e talvez 60, andando em linha reta atrás de um belo corpo de mulher. Riamos muito. Não sei se abordava as mulheres. Talvez poetasse.

Fui editor dele no segundo caderno do Correio da Manhã. Drummond mandava o de sempre, uma crônica. A conversa no telefone era amável mas sem intimidade. Menos um dia. Em 1967 ou 1968? Tanto faz. Sei que ele disse que queria um conselho. Muita honra para este pobre marqués. Drummond tinha sido convidado para escrever sua crônica no "Jornal do Brasil". Ofereceram-lhe mil por cento a mais do que ganhava no Correio. Pelo mesmo trabalho. O que deveria fazer? Respondi: "vai". Silêncio. Aí um borbotão de palavras. É que era muito amigo de Niomar Bittencourt (proprietário do Correio) e não queria fazer uma desfeita. Fiquei comovido. Disse eu que também era muito amigo da Niomar mas que antes de tudo era jornalista profissional, vivendo disso, e já que ir para o 'JB' não implicava qualquer imposição editorial, quem paga mais, leva. Isto é 'show business'. Isto é jornalismo.

 

Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.(Foto: O POVO DOC)
Foto: O POVO DOC Há 38 anos, no dia 17 de agosto de 1987, falecia o poeta Carlos Drummond de Andrade.

 

A melhor história de bicho-do-mato me foi contada por Fernando Sabino. Sabino ia fazer uma dessas visitas de surpresa tão brasileiras a Drummond, na rua Rainha Elizabeth (ou era Joaquuuiiiiiiiiim Nabuco?). Drummont tinha uma pequena casa nesta rua. Viu Drummond no andar de cima. Drummond viu Sabino. Se recolheu. Fernando tocou a campanhia. Foi atendido. Perguntou por Drummont. "Dr. Drummond não está". Foi a resposta.

Drummond nunca quis saber de Academia Brasileira de Letras. Considerando-se que o general Lyra Tavares e o presidente Sarney são membros, conclui-se que Drummond foi um sábio.

Ouvi hitória dele no PC. Foi membro. Praticou 'realismo socialista' na década de 1930. Arruda Câmara, que parecia fisicamente com Stalian, o secretário-geral do PC, queria reescrever Drummond, que, por mais que tentasse, não conseguia produzir a chorumela típica stalinista. Drummond se encrespou. Arruda amabilíssimo com não-membros do PC, uma fera com membros, chegou-se a dar uma "gravata' em Drummond, que deixou o partido e dedicou-se exclusivamente à poesia. Foi chefe de gabinete do Ministro da Educação, Gustavo Capanema, no Estado Novo. Isso não é desdouro.

Todo mundo de esquerda, que não fosse muito militante, trabalhou para a ditadura, nos meios intelectuais (principalmente na Agência Nacional, no DIP, Departamento de Imprensa e Propaganda, que censurava tudo). É o que a esquerda chama 'meter uma cunha'... Outras pessoas chamam outra coisa. Talvez a vocação do brasileiro seja ser funcionário público.

Sempre me perguntei, mas nunca perguntei a ele, o que achou da porca 'reforma educacional' que Capanema implantou no Estado Novo. O currículo básico foi baixado a nível de quase pamonha. Depois Passarinho, em 1966, baixou-o a nível de retardo. O mau de nossos ditadores é que são todos populistas. E também me contaram que a idéia de 'fechar" as repartições públicas ao povo foi de Drummond. Achava que tudo aberto havia muita corrupção. Tudo fechado há muito mais corrupção.

Acho que Drummond nunca se recuperou da morte de Pedro Nava, e a morte de sua filha, Julieta Drummond, deve ter sido a pá de cal para que ele também se fosse.

Nunca fui admirador das crônicas. Os assuntos não me interessavam. E Drummond promoveu alguns dos piores escritores (principalmente escritoras) que este país já teve. Não era, em absoluto, chegado à vida literária, mas era da escola de para os amigos tudo, para os inimigos, nada.

Se Drummond fosse chegado à vida literária, se viajasse ao exterior (o que odiava) e fizesse relações públicas, certamente teria ganho o prémio Nobel de Literatura. Não me lembro de um escritor por-William Faulkner que fosse premiado e não fosse muito inferior a ele. É verdade que português não é uma lingua muito conhecida no mundo. Mas Drummond foi traduzido (e bem) em todas as linguas civilizadas. As traduções para o Inglês de Elizabeth Bishop, poeta que morou no Brasil quase 40 anos, são exemplares. Drummond foi muito divulgado (todo o ano 'new yorker' publicava poema dele, sem falar de revistas acadêmicas). Mas não é se mantendo digno e distante que se ganha prêmios.

Ninguém nunca remotamente escreveu poesia igual à Dummond no Brasil. Transcendia classes. O intelectual e o chamado povo entendiam o que ele escrevia. Foi um poeta popular, neste sentido grande do termo. Mesmo em livros como "Claro enigma' a linguagem é acessível, idiomática e coloquial. Drummond respeitava os leitores. Não os tratava como tolos, botando banca de hermetismo ou baixando ao nível deles. Filho do Modernismo foi fiel a ele até a morte. Não "abriu' para modas ou ou recuou. Sou do tempo em que Drummond era tido como 'maluco" porque nem sempre rimava ou metrificava.

É possível que ele não fosse 'mestre', como Mário Faustino escreveu num artigo célebre, quer dizer que maneira de Pound ou Eliot não pregava uma estética que mudasse (como Pound e Eliot mudaram) um ambiente cultural. Poetastros e valores ridículos continuam permeando a cultura brasileira. E é também óbvio que Drummond não tem herdeiros. Mas a obra dele fica, sempre esteve de pé, e é uma visão sóbria, altiva, sensível e criadora para quem quiser absorvê-la. Uma poesia de primeira classe para um país de segunda classe.


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