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A Morte do Poeta
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A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO

A Morte do Poeta

* desde 1928: As notícias reproduzidas

nesta seção obedecem à grafia da

época em que foram publicadas.

Morreu no início da madrugada de ontem, à 1h15min, o cantor Renato Russo, líder da banda Legião Urbana. Em fax enviado à redação pela gravadora EMI-Odeon, o motivo da morte teria sido "problemas infecciosos pulmonares". Renato estava em seu apartamento no Rio de Janeiro. O corpo foi cremado e não houve qualquer cerimônia de velório, atendendo a pedidos do próprio Renato. O fax é assinado pelos outros companheiros de Legião, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, e pelo empresário Rafael Borges. Em entrevista à reportagem da Agência Estado, Fernanda Villa-Lobos, esposa do guitarrista Dado, Renato Russo estava com forte crise de depressão. "Ele estava anoréxico e anêmico, com forte sobrecarga emocional", disse. Diplomática, Fernanda não quis se pronunciar sobre o boato de que Renato Russo fosse portador do vírus da Aids: "Está todo mundo falando isso, mas é uma coisa que ele não falava, não cabe a mim comentar". Nos últimos dias, circulava forte boato sobre o suicídio de Renato no Rio. Segundo ela, Dado foi até o apartamento do cantor e o encontrou em depressão profunda, chorando muito e sem querer comer. Com seu desaparecimento, Renato Russo se junta a Cazuza como símbolo de uma geração de artistas que uniram rock, poesia e contestação. Mais ainda que o exagerado ex-líder do Barão Vermelho, Renato era um verdadeiro guru para seus fãs. Era uma espécie de porta-voz de toda uma geração. É comum ouvir de seus fãs a declaração: 'ele fala coisas que eu gostaria de falar'. Renato conseguiu através de sua poesia, seus rocks furiosos e canções líricas, dar voz a angústias de adolescentes em meio às cobranças impostas pela sociedade, a família etc. Os discos da Legião eram esperados nas lojas de forma quase religiosa. Renato execrava a imagem de Messias que os fãs impunham a ele. Isso o deixava angustiado e foi motivo de várias crises de depressão do artista aliado a problemas particulares.

12 de outubro de 1996

A trajetória do grupo que surgiu em Brasília e fez de Renato Russo o melhor amigo dos adolescentes

Com a morte de Renato Russo, a Legião Urbana perde a razão de ser. Não é que Dado Villa-Lobos (guitarra) e Marcelo Bonfá (bateria) não possuam o seu valor e muitas bandas dariam tudo por eles. Mas, convenhamos, é impossível pensar na Legião sem a figura carismática de seu líder, a mesma coisa de querer ressuscitar o The Doors sem Jim Morrison. Renato era a própria tradução do grupo, cujas mudanças de trajetória sempre foram norteadas pelo seu temperamento instável. Do início em Brasília, nos anos 80, quando apresentava um rock mais cru, visceral, com influências do punk, até os trabalhos mais recentes, já marcados por um romantismo que às vezes beirava o piegas, a Legião sempre refletiu em forma de acordes e letras, o que se passava com Renato ou, pelo menos, o que ele pensava sobre uma série de coisas. Era como se o estúdio e os palcos fossem em menor proporção, afinal, os shows do grupo eram coisa rara, como uma espécie de confessionário, em que o vocalista expurgava seus pecados e contava seus segredos.

12 de outubro de 1996

Parece que foi ontem….

O Paulo Sarasate lotado de adolescentes que tinham muito tempo a perder, assim como eu. No palco, o Legião fazia mais um show em Fortaleza, quem não sabia a letra de "Faroeste Caboclo" decorada? Era a saga que todo mundo queria viver, eram os sonhos de uma geração que não sabiam como aproveitar a liberdade depois de 20 anos de ditadura. No palco, Renato Russo se debatia em uma coreografia frenética, acompanhada com êxtase pela multidão. Eduardos e Mônicas aprendendo a crescer, com "ferrugens nos sorrisos", embriagados pelos acordes de músicas urbanas do Legião Urbana.

12 de outubro de 1996

Lojas esperam "febre"

Lojas de discos em Fortaleza já estão se preparando para uma possível febre de consumo dos discos da Legião Urbana e de Renato Russo. Gerentes de três redes de lojas da cidade anunciaram que ontem mesmo deveriam pedir mais cópias à gravadora EMI. Tanto os CDs da banda quanto os trabalhos solos do artista não eram nenhum estouro, como no início da carreira do grupo, porém mantém um público fiel. O gerente de distribuição da Aky Disco, Josué Freitas, informou que nas 10 filiais da empresa o CD Equilibrio Distante foi o mais vendido, com uma média de 3 mil unidades em dois meses. "Vendeu bem melhor que o primeiro CD solo", afirmou referindo-se ao disco Stonewall Celebration Concert. Segundo Freitas, as vendas dos dois solos de Renato Russo não chegaram perto do desempenho mercadológico da banda. Freitas disse que o último CD do grupo A Tempestade teve duas mil cópias distribuídas em quatro dias.

12 de outubro de 1996

O epitáfio Russo

Renato Russo fazia parte de um grupo que se dizia burguês sem religião e futuro da nação. Um grupo que conseguiu largo sucesso sem o rosto bonitinho de um vocalista e sem o rigor de percorrer o Brasil a cada disco lançado. Desse grupo, Renato Manfredini Jr. era o líder, letrista e vocalista. E suas opiniões eram como as dos típicos líderes: polêmicas. Além disso, passou pelas quatro estações da vida bandida, do alcoolismo às drogas, do homossexualismo ao estereótipo de roqueiro. Ele tinha muitas histórias urbanas para contar. Primeiro, não se sentia atraído pelas meninas e gostava muito mais dos meninos. Sua situação social aos 15 anos, logo nos 15 anos, quando uma enfermidade na perna esquerda fez com que aquele desengonçado corpão de 1,75 de altura desabasse, após várias cirurgias e tratamentos médicos, numa horrível cadeira de rodas. Foi demais para a sua auto-estima. Recuperado, enfim, restou-lhe duas alternativas. Arranjar uma maneira de se sobressair para compensar a considerada sofrível atuação esportista, sexual e social, ou resignar-se a uma vidinha bem besta. Letras, sons e palavras foram o caminho escolhido. E são as palavras de Renato Russo que acompanhamos abaixo, extraídas de várias entrevistas do cantor. Ele não fala aqui só de vida bandida, mas também dos fãs que o acolheram, do romantismo que buscava e dos discos que tão bem fazia.

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