Não se pode dizer que Edmund Burke, símbolo do pensamento conservador, fosse um antidemocrata. Afinal, ele apoiou a revolução norte-americana e defendia a representação parlamentar. Sua crítica à revolução francesa partia do princípio de que os revolucionários seguiram um atalho histórico na pressa de destruir e recriar as instituições, sem considerar os limites da natureza humana e da sociedade. Assim, ele defendia mudanças institucionais com precauções.
Por que estou trazendo Burke para este debate? Porque a "prudência" conservadora do autor ajuda a entender que a democracia moderna ocidental é um modelo sistêmico que obedece a um dispositivo funcional de autopreservação. Esta democracia se apoia na existência preliminar de um Estado-Nação que funciona como princípio transcendental normativo, e de uma constituição jurídica que funciona como princípio imanente operacional.
Neste modelo de democracia liberal o republicanismo aparece como forma cultural adequada para garantir o pluralismo de interesses, demandas e direitos individuais e coletivos. Os limites deste modelo ocidental de democracia são dados pelas reações conservadoras contra as tentativas de enfraquecimento do Estado-Nação, sejam aquelas vindas pela direita sejam aquelas pela esquerda. Aqui, o sistema reage. Quando as forças colonizadoras se apropriam das instituições estatais, o poder nacional regride e mesmo se corrompe, fortalecendo grupos corporativos e movimentos messiânicos.
Quando as forças progressistas pressionam para ampliar a participação política das minorias, o poder nacional se concentra e se enrijece. Ele reage sistemicamente em face da possibilidade de desintegração do dispositivo da nacionalidade que é símbolo da unidade territorial. O caso Assange ajuda a entender o peso da segurança nacional para os médios e grandes Estados, hoje.
A superação do conservadorismo liberal com vistas a uma democracia participativa e transnacional ampliada é um desejo justo e uma utopia viável. Mas ainda há caminhos a percorrer para uma nova engenharia institucional da política.