Escreveu livros de literatura fantástica e de contos, como
Escreveu livros de literatura fantástica e de contos, como
Um ano se passou desde que tivemos que dar essa terrível pausa no cotidiano, pelo menos nos moldes que se desenhava antes em nossas vidas, pois essa pandemia quebrou o ritmo de todos, nunca mais fomos (seremos?) os mesmos: somos cotidianamente inundados por toda sorte (ou azar) de coisas - passamos a viver esse pesadelo ambulante, e não nos adianta tentar fugir, que os esconderijos são temporários... e tão frágeis!
Dias desses, arrumando gavetas, encontro essa minicrônica entre inutilidades de cartões de créditos vencidos, endereços antigos arrancados de envelopes, extratos bancários já apagados e mil trecos esquecidos (pasmo, lembro-me de que essa arrumação de inutilidades geralmente é feita pelos sobreviventes de quem as guarda... fujo assustado do pensamento trágico).
Melhor passar à pequena crônica e suas premonições...
"...o arco-íris já mudou de cor,
e uma rosa nunca mais desabrochou..."
O que seria de nós nesse imenso carrossel de ilusões que é o mundo se não fossem essas paradas também ilusórias — e arbitrárias — que nos concede o calendário. Bendito fim de semana que nos ajuda a suportar o mês, bendito fim de mês que nos ajuda a aguentar o ano, bendito fim de ano que nos ajuda a sobreviver à vida.
Todos eles nos trazem a ilusão do recomeço (talvez por isso a construção da muralha da China foi feita em blocos). A imensidão do infinito nos causa pânico; necessitamos dividir tudo, não só o tempo, o amor, o sofrimento, até mesmo a esperança; nenhum de nós suportaria um segundo sequer de falta de limites, da ausência de medidas. A um preso nunca deveria ser dada, como castigo, a visão do cubículo, mas a do infinito, a do deserto sem fim de dia, a da incomensurável escuridão da noite (daí "Uma Viagem ao Fim da Noite", de Céline).
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É nesses fins de anos que fazemos nossos balanços, intuímos nossos planos; enfim, damos uma pequena pausa nesse carrossel de sonhos e pesadelos. Prometemos não repetir os erros (muitos), corrigir os desvios de rotas (frequentes), refazer os sonhos (infinitos). Tempo ideal pra mudar o guarda-roupa, pintar a casa, trocar de carro, arrumar o cabelo, principalmente para tentar reorganizar o caos nosso de cada dia.
E essa parada nem sempre é bem resolvida (ou bem vinda), daí o grande número de desistências em plena pseudo-pausa do ano (quantos suicídios se dão nessa época). Mas pensando bem, se não fosse o filho ficando rapaz, a filhinha em plena flor da infância, o amigo que prometeu gravar aquelas velhas canções, a primeira namorada que prometeu enfim voltar, o time de coração que busca uma eterna reabilitação, o fim daquele filme no qual já se dormiu várias vezes... eu bem seria capaz de aproveitar essa pausa e descer de vez, desse imenso carrossel de ilusões.
"...ou é o começo do fim,
ou é o fim do começo."
(Vital Farias)
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